A proposta que retira 3.706 hectares da Flona de Brasília foi aprovada pela Comissão de Meio Ambiente e também amplia e transforma a Reserva Biológica da Contagem em Parque Nacional
Três projetos de lei com o mesmo objetivo – desafetar áreas da Floresta Nacional de Brasília, na capital do país – foram unificados e tramitam de forma conjunta na Câmara dos Deputados. O texto substitutivo da proposta foi elaborado pelo relator, o deputado Jose Mario Schreiner (DEM-GO) e aprovado na última semana na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMAD). A proposta prevê a retirada de 3.706 hectares da área total da Floresta Nacional (Flona), o equivalente a cerca de um terço da unidade de conservação, com a justificativa de por fim aos conflitos existentes com os assentamentos que existem no local. Entretanto, cerca de 2.300 hectares incluídos na desafetação não correspondem a assentamentos estabelecidos.
A proposta substitutiva também prevê, como compensação, o acréscimo de 2.116,26 hectares à Reserva Biológica da Contagem, que seria recategorizada e transformada em Parque Nacional. A reserva, também localizada em Brasília, possui atualmente um território de 3.426 hectares.
Por se tratarem do mesmo tema, a desafetação da Flona, os PLs nº 2.808/2020, de autoria da Deputada Celina Leão (PP-DF) e o de nº 160/2021, de autoria da Deputada Paula Belmonte (Cidadania-DF), foram apensados ao Projeto de Lei nº 2.776/2020, de autoria da deputada Flávia Arruda (PL-DF) e tramitam de forma conjunta com o texto substitutivo aprovado, que segue para avaliação na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços. O PL também precisa ser avaliado ainda pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
A Floresta Nacional (Flona) de Brasília possui uma extensão atual de 9.346 hectares divididos em quatro áreas. A principal delas é a Área 1, que além de ser a maior, com 3.353 hectares (36% do total da Flona) e mais preservada, é onde está a sede administrativa da unidade e os atrativos e trilhas que recebem fluxo diário de visitantes. Parcialmente contígua a ela, está a Área 2, um dos pivôs do projeto de desafetação, com 996 hectares e densamente ocupada e antropizada, uma vez que está totalmente sobreposta ao Assentamento 26 de Setembro.
As áreas 3 e 4, com 3.071 e 1.926 hectares respectivamente, estão a cerca de 30 quilômetros ao norte deste núcleo da Flona. A área 3 está apenas parcialmente sobreposta com o assentamento Maranata, que ocupa 771 hectares de sua porção inferior, enquanto a 4 ainda apresenta vegetação em bom estado de conservação.
O projeto prevê que as áreas 2 e 3, que juntas somam 4.067 hectares, sejam completamente desafetadas da unidade de conservação e que a área 4 perca adicionais 39 hectares. O perímetro da Área 1 também seria alterado para corrigir “a impropriedade de computar as áreas até o limite da rodovia” e ajustar “o deslocamento existente no limite atual” e, com isso, passaria a ter sua extensão ligeiramente ampliada em 400 hectares.
“Os projetos em análise visam à desafetação de áreas da Floresta Nacional de Brasília. O PL 2.776/2020 busca a desafetação das áreas 2 e 3; o PL 2.808/20 busca a desafetação da área 2, bem como a compensação dessa desafetação através da ampliação da área 1; e o PL 160/21 busca a desafetação da área 3 e de lotes da área 4. Afirmação recorrente entre as autoras dos projetos em análise é o fato de diversas áreas da Flona, mesmo antes da edição do decreto presidencial, serem intensamente habitadas em virtude de ações promovidas pelo governo local à época. É de se destacar que, passados mais de 20 anos da criação da Unidade de Conservação [a Flona foi criada em 1999], essa população jamais foi remanejada, o que, a esta altura, seria inviável, além de configurar grave erro de política pública”, analisa o relator no substitutivo.
Em seu relatório, o deputado acrescenta que o Ministério do Meio Ambiente/ICMBio, responsável pela gestão da Flona, e o Incra, responsável pelos assentamentos, foram consultados sobre a proposta e aponta que “a desafetação almejada dispõe de validação dos órgãos citados”.
Entretanto, a completa desafetação da Área 3, que está apenas parcialmente ocupada por assentados, contraria diversas manifestações técnicas do próprio ICMBio. Dos 3.071 hectares totais da área, apenas 771, o equivalente a 25,1% do total, estariam sobrepostos ao assentamento Maranata.
De acordo com um dos documentos, uma Nota Técnica elaborada pelo ICMBio em fevereiro de 2020, a proposição do órgão ambiental é para que a Área 2 seja completamente desafetada, enquanto na Área 3, apenas a área do Assentamento Maranata seja retirada, ao contrário do proposto no PL nº 2.776/2020, que prevê a exclusão de todo o setor. A proposta do ICMBio inclui ainda, na Área 4, desafetar uma pequena área ocupada pela Polícia Militar e usada para estante de tiro.
Em contrapartida, a Área 1 seria ampliada até a margem direita do córrego Currais, até sua confluência com o córrego das Pedras e, rumo ao norte até o limite atual da Flona, em área ainda desocupada. “Outra proposta é incorporar toda a bacia do córrego Currais até uma faixa de 100m de distância da Rodovia BR-070 (constam cerca 26 chácaras de posseiros em terras da Terracap)”, indica a nota do ICMBio. O texto aponta ainda que a Área 4 também poderia ser ampliada “por algumas áreas das bacias dos córregos Barrocão, Buriti e Vendinha que contém ainda Cerrado bem conservado”.
A sugestão do próprio ICMBio é que os 2.300 hectares remanescentes da Área 3, que ainda apresentam características naturais relevantes, sejam convertidos em Área de Proteção Ambiental (APA) e anexados ao território de duas APAs já existentes na região: da Bacia do Rio Descoberto e do Planalto Central.
“A desafetação de parte dessa área atenderá o resultado dos estudos que indicam destacar parte dessa área para uso rural”, reconhece a nota técnica do ICMBio, que destaca ainda que o terreno pertence integralmente à Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap) e que “o remanescente desta Área 3 (2.300 ha), deverá continuar a ser unidade de conservação de uso sustentável, na forma de uma Floresta Distrital, conforme compromisso do Governo do Distrito Federal”.
Rebio da Contagem ampliada e transformada em parque
Para além da Floresta Nacional de Brasília, o substitutivo do PL também altera os limites e a categoria da Reserva Biológica da Contagem, criada em 2002 e situada no limite leste do Parque Nacional de Brasília. A reserva biológica, classe mais restritiva de unidade de conservação, se tornaria também um parque nacional, categoria que apesar de também ser de proteção integral, permite usos indiretos mais amplos, como a visitação pública.
O substitutivo autoriza a cessão de 2.116 hectares em área de alta susceptibilidade ambiental nas escarpas da Chapada da Contagem, em parte adjacente ao Parque Nacional de Brasília, “transferindo sua propriedade da Companhia Imobiliária de Brasília – Terracap para o patrimônio da União, incorporando-a à Reserva Biológica da Contagem, que passa para a categoria de Parque Nacional”, define o relator. Com a ampliação, a unidade de conservação passaria a ter uma extensão de 5.542 hectares.
Fonte: O Eco
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