Enquanto líderes mundiais definem metas e estratégias climáticas durante a Cúpula do Clima, novo estudo do Projeto Cidades Florestais, do Idesam, aponta oportunidades de reduzir emissões de carbono
Texto: Lennon Costa
Diante dos compromissos assumidos pelo Brasil durante a Cúpula de Líderes sobre o Clima, nesta semana — abertura à cooperação internacional e a meta de atingir a neutralidade climática (redução a zero do balanço das emissões de carbono) até 2050 —, tornam-se imprescindíveis recursos financeiros que viabilizem projetos e iniciativas que contribuam com a preservação das florestas. O uso de mecanismos que estabeleçam um vínculo entre empresas, governos (em suas diferentes jurisdições) e comunidades tradicionais é uma das maneiras de viabilizar a execução – ou continuidade – de projetos dessa natureza.
O mecanismo de pagamento por serviços ambientais (PSA) é uma das formas de direcionar recursos para as comunidades e populações que preservam o meio ambiente. Essa foi justamente uma das dificuldades apontadas durante a Cúpula de Líderes pelo Clima, pela liderança indígena Sineia do Vale, que destacou a importância de as políticas públicas e os recursos “realmente chegarem nas pontas”.
Financiado pelo Fundo Amazônia, via BNDES, o projeto Cidades Florestais, desenvolvido pelo Idesam desde 2018, chega ao final de sua primeira fase e busca alternativas para sua continuidade. Em um novo estudo, Oportunidades dos Serviços Ambientais para as Cadeias Produtivas Florestais do Amazonas, o Idesam mostra alternativas a partir dessa lógica de pagamento, que podem contribuir para que as comunidades atendidas pelo projeto continuem recebendo recursos para investir em novas formas de produzir, mais alinhadas às metas climáticas estabelecidas no encontro mundial.
Assinada pelos pesquisadores Pedro Soares, Victoria Bastos, Elen Blanco e Thiago Marinho, com revisão de André Vianna, coordenador do projeto, a publicação parte de uma iniciativa do Idesam: um modelo de monitoramento que possibilita estimar o potencial da geração de serviços ambientais através da redução de emissões de Gases de Efeito Estufa (GEEs) geradas pelas atividades do projeto.
Foram utilizadas duas bases de dados: do MapBiomas, com o objetivo de permitir uma análise mais refinada do uso da terra nas regiões do projeto; e do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Brasileira por Satélite, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Prodes/Inpe), para calcular os impactos do projeto em termos de redução do desmatamento a partir de dados históricos oficiais publicados pelo governo brasileiro.
As oportunidades de financiamento, nesse cenário, residem em compromissos assumidos pela iniciativa privada em prol da compensação de emissões — as chamadas campanhas carbono neutro corporativas. Entre os principais exemplos mencionados pelo estudo, estão: a L’Oréal, dona de um fundo de investimento com impacto de 50 milhões de euros, destinado a apoiar projetos de restauração ecológica de florestas e ecossistemas marinhos; a Apple, que anunciou um plano para neutralizar a emissão de carbono de toda a sua operação, cadeia de produção e ciclo de vida dos produtos até 2030; a Microsoft, que, no ano passado, anunciou a criação de seu Fundo de Inovação Climática, para acelerar o desenvolvimento global de tecnologias de redução, captura e remoção de carbono; a Iniciativa Compromisso com o Clima, composta por Natura, Itaú-Unibanco, B3, Lojas Renner, MRV Engenharia, Raia Drogasil e Mattos Filho, que recém-lançou um edital priorizando apoio de projetos de Agricultura, Floresta e Uso do Solo, incluindo REDD+ — mecanismo projetado para utilizar incentivos de mercado e financeiros com foco na redução das emissões de GEEs oriundos da degradação de florestas e desmatamento —, especialmente localizados na Amazônia; entre outras.
“As oportunidades citadas na publicação podem representar um novo ciclo de financiamento para dar continuidade às atividades de assessoria e de estruturação das cadeias produtivas sustentáveis ao final do apoio financeiro do BNDES. Como muitas das cadeias foram estruturadas pelo projeto, isto é, não existiam antes, ainda é necessário apoio para que atinjam maturidade e estabilidade financeira”, afirma André Vianna, coordenador-geral do PCF e gerente do Programa de Manejo e Tecnologias Florestais do Idesam.
Para o pesquisador Pedro Soares, as oportunidades apresentadas estão dentro dos serviços ambientais e dos mercados voluntários de carbono. “Nós mapeamos e indicamos no relatório potenciais empresas e editais que buscam investir em projetos que geram redução de emissões, que querem comprar créditos de carbono. Basicamente, acreditamos que o financiamento dos serviços ambientais é uma importante alternativa ou estratégia para fomentar cadeias produtivas sustentáveis na Amazônia, como os óleos vegetais, por exemplo”, complementa.
Possibilidades em vista
Como exemplo, o estudo indica que um possível projeto de REDD+ junto à Associação dos Produtores Familiares Ouro Verde (APFOV) poderia aliar a valoração dos serviços ambientais ao fomento a atividades produtivas sustentáveis, como por meio de Sistemas Agroflorestais. Já para as Unidades de Conservação, a maior oportunidade para valoração dos serviços ambientais está nos sistemas de pagamentos por resultados, como por meio do Programa REM, que se encontra em negociação pelo Governo do Amazonas junto ao KfW, banco de desenvolvimento estatal alemão.
Presidente da APFOV, Ronaldo Carlos de Moraes afirma que a influência do projeto no trabalho da associação foi um divisor de águas. “É um projeto muito bom, não só para a associação como para toda a comunidade, pois gera renda. Foi por meio dessa parceria que adquirimos uma miniusina de óleo de essência, café, manteiga de cacau, manteiga de buriti. O resultado é uma cadeia produtiva muito boa, uma parceria com alto peso para a associação”, avalia.
Fundada em 2007, a Ouro Verde participa do PCF há três anos, e essa relação tem ajudado a modificar não apenas a visão prática, mas a forma de pensar dos comunitários.
“Antes, nós trabalhávamos só com a produção de café e entregávamos na cidade (Apuí), não tinha parceiro. A nossa visão era só no hoje, só para comer e tudo bem. Atualmente, a nossa visão é ampla, também voltada para produtos não madeireiros. Hoje, nós tiramos da floresta, sem agredir o meio ambiente. E isso é um aprendizado que também fica para a juventude, pois nós, mais velhos, aprendemos a trabalhar de outro jeito. Não é um processo rápido, mas estamos mudando a mentalidade”
— Ronaldo Carlos de Moraes, presidente da APFOV.
Retorno positivo
Atuando junto a 13 organizações sociais, associações e cooperativas de nove municípios do Amazonas, o Projeto Cidades Florestais tem gerado frutos, como argumenta André Vianna, ao destacar o impacto em Lábrea, Apuí e na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Uatumã.
“Em Lábrea, a usina local é a de maior produção de óleos e o plano de manejo florestal na Resex (Reserva Extrativista) Ituxi está em operação. Em Apuí, também se destaca a produção de óleos. Um estudo realizado em 2020 verificou uma importante redução de desmatamento nas áreas geridas pelos produtores da Ouro Verde, em comparação ao município como um todo . Já na RDS do Uatumã, o plano de manejo está em operação e estabeleceu contrato de comercialização de madeira com comprador de São Paulo, além da produção de óleo essencial de breu ter gerado retornos consideráveis à associação de moradores da reserva”, afirma o coordenador-geral do projeto.
Ele também destaca o início do estabelecimento de cadeias produtivas sustentáveis, “que ainda demandam apoio para continuarem seu ciclo de desenvolvimento”, tais como: a produção madeireira e o óleo essencial de breu na RDS do Uatumã; o óleo de café verde, o buriti e a copaíba em Apuí; madeira, murumuru, andiroba, tucumã e copaíba em Lábrea. “A cadeia produtiva de copaíba também tem se destacado e temos conseguido aumento tanto no volume comercializado como no valor unitário com as empresas compradoras”, acrescenta.
Fonte: IDESAM
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