Um artigo publicado na edição de dezembro de 2020 da revista Estudos Avançados da USP trouxe como tema o descaso do atual governo federal brasileiro com a política ambiental e como isso tem afetado o Fundo Amazônia. Em Bioma Amazônia: atos e fatos, Vanessa Cuzziol Pinsky, pesquisadora associada ao Programa de Pós-Graduação em Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, e Jacques Marcovitch, ex-reitor da USP, Professor Emérito da FEA e do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP, fazem uma reflexão sobre os caminhos para a retomada do Fundo Amazônia e como ele foi afetado durante o governo atual.
Desde 2013 Vanessa e Marcovitch pesquisam a governança do Fundo Amazônia e o artigo veio com o objetivo de levantar os atos e fatos do governo Bolsonaro e discutir as implicações que aconteceram dentro da política ambiental neste período. “Para realizar as análises nós utilizamos reportagens, matérias de mídia impressa qualificada, além de relatórios do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), documentos e relatórios de organismos contratados pela Organização das Nações Unidas e estudos divulgados por coalizões que têm como pauta questões factuais do governo que implicam na agricultura, nas florestas e no meio ambiente”, conta Vanessa ao Jornal da USP.
Em 2004, foi criado o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), que tinha por objetivo reduzir o desmatamento e criar condições para se estabelecer um modelo de desenvolvimento sustentável no bioma. Segundo dados de 2018 do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a taxa de desmatamento da Amazônia Legal brasileira diminuiu 72% no período de 2004 a 2018. Estes são alguns exemplos de acertos anteriores ao governo atual mencionados no artigo e que não prosperaram. Entre 2018 e 2019, a taxa de desmatamento aumentou 34% segundo dados do Inpe de 2020.
Vanessa explica que antes mesmo do atual presidente assumir o cargo, Bolsonaro já questionava o Fundo Amazônia e sua governança. “Quando ele assumiu, começou a atacar a sociedade civil que implementa os projetos aprovados pelo BNDES, que é o banco gestor do fundo, e o próprio Fundo Amazônia”, detalha a pesquisadora.
Outro exemplo levantado por Vanessa foram as medidas tomadas por Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente. “Uma das decisões do ministro foi fazer o desmonte da governança do Fundo Amazônia, estrutura esta que tinha dois comitês: o Comitê Orientador do Fundo Amazônia (COFA), formado por representantes da sociedade civil, do governo federal e no nível estadual, e o Comitê Técnico-Científico do Fundo Amazônia, responsável por atestar a redução das emissões e emitir certificados para captação de recursos de doadores internacionais”, detalha.
Na medida em que o ministro fez o desmonte dessa estrutura de governança, os doadores internacionais, que são o governo da Noruega e da Alemanha, não aceitaram essas imposições. A partir disso, de não haver um entendimento sobre essa governança e como se daria a ação do fundo sem essa estrutura que foi previamente negociada e construída com os doadores internacionais, o Fundo Amazônia foi paralisado.
Segundo Jacques Marcovitch, durante o ano de 2019, o Ministério do Meio Ambiente perpetuou uma cultura de confronto, na qual os representantes do órgão questionaram tudo o que foi feito anteriormente, mas sem propor nada de novo. “Isso também resultou na paralisia do Fundo Amazônia a partir de abril de 2019”, explica Marcovitch.
Em relação à forma como a pandemia do novo coronavírus tem impactado a política ambiental, o professor pontua que o País está caminhando para uma grande era de incertezas. “Será preciso aprender a desenvolver políticas públicas ambientais em paralelo à pandemia ou integrando as incertezas deste momento.”
Os pesquisadores indicam que é urgente a necessidade de retomada do Fundo Amazônia e de sua governança, para que seja possível restabelecer um diálogo e consenso com os doadores internacionais, que financiam projetos ambientais com o objetivo de reduzir o desmatamento. “O aumento das queimadas e do desmatamento demanda essa retomada”, finaliza Vanessa.
Fonte: Jornal da USP
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