Duas premiações internacionais relacionadas a direitos humanos reconheceram, neste mês de outubro, a atuação de indigenas brasileiros.
A primeira foi concedida â líder indígena Alessandra Korap Munduruku com o Prêmio Robert F. Kennedy de Direitos Humanos, como já contamos aqui.
A segunda foi oferecida pelo Instituto de Estudos Políticos de Washington (EUA) – Prêmio Internacional Letelier-Moffitt de Direitos Humanos – e identificou a importância da Jornada Sangue Indígena: Nenhuma Gota a Mais realizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), no ano passado, à Europa, com o intuito de denunciar a violência, incentivada pelo próprio governo, contra esses povos. Divulgamos. aqui, no site também.
O prêmio criado em 1978 em memória de dois antigos membros do Instituto de Estudos Políticos, Orlando Letelier e Ronni Karpen Moffitt, mortos pela ditadura chilena em 1976, é concedido todos os anos aos escolhidos pelo comitê composto por líderes de prestígio da comunidade de direitos humanos.
Esta não é a primeira vez que o Brasil figura na lista dos laureados do Prêmio Internacional Letelier-Moffitt de Direitos Humanos.
Em 1982, Dom Paulo Evaristo Arns foi o primeiro brasileiro a receber a honraria. E, em 1989, a União das Nações Indígenas (UNI) foi reconhecida por sua contribuição ao capítulo sobre os direitos indígenas da Constituição de 1988.
O reconhecimento da APIB
Quem indicou a APIB – “por seu trabalho notável em defesa dos direitos dos povos indígenas do Brasil” – foi Lisa Haugaard, do Grupo de Trabalho para a América Latina.
Devido à pandemia, a cerimônia de entrega foi realizada virtualmente em 15 de outubro, e contou com a presença da jornalista e escritora canadense Naomi Klein, reconhecida por seu ativismo global. Foi ela quem “entregou” o prêmio à APIB, representada, na ocasião, por Sonia Guajajara, coordenadora-executiva. Assista ao vídeo com a transmissão ao vivo, no final deste post.
“A APIB une a luta dos povos originários que são as raízes deste país. Com a força de nossos ancestrais, a articulação luta há mais de 15 anos pelos direitos indígenas em todas as regiões do Brasil. Em nossa luta pela proteção de nossas florestas, trabalhamos por uma cultura inclusiva e pela saúde pública indígena“, destaca Sonia Guajajara.
“Resistimos há mais de 500 anos e continuaremos trabalhando incansavelmente pela justiça. Estamos honrados pelo reconhecimento do Instituto de Estudos Políticos de Washington (EUA) pelo nosso trabalho em defesa do Brasil e dos povos indígenas contra a destruição ambiental e cultural. Nossa luta, por extensão, é por todas as pessoas que vivem neste planeta durante este tempo de crise climática”.
Violência contra indígenas só cresce, aponta Cimi
Alberto Terena, Angela Kaxuyana, Célia Xakriabá, Dinaman Xakriabá, Dinaman Tuxá, Elizeu Guarani Kaiowá e Kretã Kaingang foram as lideranças indígenas que formaram a comitiva da APIB que visitou 12 países da Europa ao longo de 35 dias, entre outubro e novembro de 2019.
Seu objetivo era denunciar as graves violações do governo Bolsonaro contra os povos indígenas. E é terrível perceber que, passado um ano, a situação só piorou: “os ataques aos nossos direitos e territórios multiplicaram-se”.
De acordo com o relatório anual Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil, de 216 páginas, publicado em 29 de setembro pelo Cimi (Conselho Indigenista Missionário), “as invasões em terras indígenas, a exploração ilegal de recursos naturais e os danos ao patrimônio natural e cultural mais do que dobraram no primeiro ano de governo”. Passaram de 109 casos, em 2018 (com Temer), para 256 no ano passado. Ou seja, o crescimento foi de 135%.
O mesmo estudo aponta que houve aumento de casos em 16 das 19 categorias de violência contra indígenas, incluindo:
– “mortes por desassistência”, que de 11, em 2018, passaram para 31 em 2019;
– ameaças de morte: de oito passaram para 33;
– lesões corporais dolosas: de cinco para 13, e
– mortes de crianças entre zero e cinco anos: de 591, em 2018, passaram para 825, no ano passado.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil também tem recebido ataques diretos do governo. Em 22/9, a APIB protocolou no Supremo Tribunal Federal (STF) uma interpelação para que o governo brasileiro explique na justiça as mentiras que tem propagado e agressões contra os povos indígenas que fez durante seu discurso na Assembleia Geral da ONU.
“Continuaremos fazendo o som dos maracás ser ouvido em toda a parte, com a ajuda de aliados brasileiros e internacionais. Continuaremos lutando em nossos territórios e comunidades, no Congresso brasileiro, no Supremo Tribunal Federal, nas cortes internacionais, e nas redes, pelo nosso direito de existir”, salienta Sonia Guajajara.
Comitê mapeia covid-19 nas aldeias
Logo que a pandemia começou no país, ficou claro que o governo Bolsonaro nada faria para proteger os indígenas. Eles foram constantemente agredidos ou desconsiderados no atendimento realizado pela Sesai – Secretaria de Saúde Indígena.
A quantidade de denúncias e o crescimento exponencial de mortes entre esses povos levou a APIB a se unir a organizações de base, coordenando esforços para o enfrentamento à pandemia de Covid-19 entre povos indígenas.
Uma das frentes de trabalho foi criada para atualizar e aproximar ao máximo da realidade os números sobre contaminados e mortos entre os indígenas. Foi criado o Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena, que elabora mapeamento e faz a divulgação dos números de indígenas mortos e contaminados pelo novo coronavírus, bem como da quantidade de povos impactados.
Tal monitoramento contrapõe, com dados, a narrativa oficial do governo federal, que insiste e subnotificar e considerar indígenas como pardos.
O Comitê já contabilizou 865 indígenas mortos pela Covid-19, 38.019 contaminados em 158 povos indígenas.
Fonte: Conexão Planeta
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