“O agronegócio não precisa desmatar para se expandir. Segundo pesquisadores da EMBRAPA, se conseguíssemos transferir 50% da tecnologia sustentável para a agricultura, seria possível dobrar a produção de alimentos sem abrir novas áreas”.
Paulo Roberto Haddad
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Antonio Gramsci, filósofo italiano, certa vez escreveu: “O velho está morrendo e o novo não pode nascer; nesse interregno todas as formas de sintomas mórbidos aparecem”. Esse pensamento está implícito nas últimas declarações de algumas autoridades brasileiras sobre a relação entre o agronegócio, os desmatamentos e as queimadas que vêm assolando os biomas da Amazônia e do Pantanal. O argumento oficial segue na direção de que grande parte do processo de destruição desses ecossistemas estaria associada às necessidades do cultivo de novas terras agrícolas, visando a contribuir para a alimentação de um bilhão de habitantes do Planeta. Um argumento nobre para justificar a posteriori o uso predatório dos recursos ambientais dos dois biomas. Um equívoco que desconhece a dualidade básica da agricultura brasileira.
Durante o Período Colonial, a agricultura se caracterizava pelo uso extensivo e predatório dos recursos naturais, pelo baixo progresso tecnológico, pelos desmatamentos e queimadas, pela sobre-exploração da força de trabalho e, até mesmo, por infringir a ordem jurídica prevalecente. As primeiras transformações ocorreram a partir do avanço da cafeicultura no Sudeste do País, que operava com mão de obra livre e com melhor distribuição de renda, o que levou à dinamização do mercado interno.
Mas, a Grande Transformação da agricultura brasileira ocorreu no início dos anos 1970, quando, sob a liderança de Alysson Paulinelli, realizou-se a revolução científica e tecnológica nos cerrados brasileiros, que ocupam 60% de nosso território. O dinamismo do agronegócio brasileiro, um dos líderes mundiais na produção e exportação de proteína animal e proteína vegetal, se deve, principalmente, ao progresso tecnológico que tem sido incorporado aos seus segmentos produtivos, a partir da criação do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária, liderado pela EMBRAPA.
Atualmente, o agronegócio brasileiro é o setor produtivo mais importante da economia brasileira e tem evitado que a recessão, iniciada em 2014, se transforme em depressão econômica. É o carro-chefe de poderosas cadeias produtivas e de valor que envolvem, direta e indiretamente, diferentes setores, com impactos que se espraiam para a indústria química, a indústria de bens de capital, os setores de tecnologia e informação, o setor de transporte, etc. Contribui para intensa redução do custo da cesta básica que beneficiou, principalmente, os grupos sociais de baixa renda, para os quais o peso das despesas com alimentos é maior.
O agronegócio não precisa desmatar para se expandir. Segundo pesquisadores da EMBRAPA, se conseguíssemos transferir 50% da tecnologia sustentável para a agricultura, seria possível dobrar a produção de alimentos sem abrir novas áreas.
Na verdade, a associação espúria do atual processo de destruição dos ecossistemas com as necessidades de expansão do moderno agronegócio brasileiro que vem sendo utilizada pelas autoridades federais, é argumento diversionista para encobrir concepção equivocada de meio ambiente como almoxarifado de recursos naturais de livre acesso ou para encobrir o desmonte, cuidadosamente planejado, das instituições e das políticas ambientais, tudo isto numa busca frenética de votos, permeada por interesses velados em relação ao patrimônio natural do Brasil.
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