Existe a possibilidade do descobrimento de novas doenças infecciosas no coração da Amazônia. É isso que aponta um novo estudo publicado na revista Anais da Acadêmica Brasileira de Ciências, principal periódico científico brasileiro. A pesquisa revela que mudanças climáticas causadas pelo homem na floresta amazônica podem ser um dos principais fatores para futuras emergências de saúde pública, como surtos de doenças.
Denominado ‘Além da perda da diversidade e das mudanças climáticas: impactos do desmatamento da Amazônia sobre doenças infecciosas e saúde pública’, o trabalho é assinado por Joel Henrique Ellwanger e 13 co-autores, dentre eles, o ecologista Philip Martin Fearnside, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e ganhador do Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007.
Philip diz que “o único efeito positivo da pandemia de Covid-19 é que ela gerou conscientização pública sobre riscos de doenças emergentes”. Para ele, pode-se esperar que isso resulte em políticas públicas futuras de valorização da ciência e contra o desmatamento na Amazônia.
O cientista conta como o desmatamento de florestas tropicais é uma forma de possibilitar o surgimento de novas doenças, principalmente fazendo com que o vírus passe de animais selvagens para humanos, “como aconteceu em Wuhan, na China, provavelmente com pangolins e morcegos”.
A floresta que está sendo morta
Logo no início, o estudo afirma como a Amazônia é um bioma único em muitos aspectos, mas principalmente com a sua enorme diversidade de espécies animais e vegetais. Isso, segundo os pesquisadores, já devia ser motivo suficiente para a preservação da floresta amazônica.
O texto avança e mostra que ações dos seres humanos na floresta amazônica, mudanças climáticas, alterações genéticas e más condições sociais e ambientais podem dar origem ao que é chamado de ‘tempestade perfeita’ para o surgimento e ressurgimento de doenças infecciosas humanas na Amazônia.
“A fauna amazônica abriga uma enorme diversidade de patógenos [agente infeccioso] conhecidos, bem como muitos outros potenciais patógenos novos ou até mesmo desconhecidos. Embora vários desses patógenos possam ter baixo potencial epidêmico em humanos, essa abundância de microrganismos na região amazônica indica que o surgimento de novas infecções da floresta é uma ameaça constante à saúde humana”, diz um trecho do estudo.
Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), do governo federal, entre agosto de 2018 e julho de 2019, foram desmatados 9.762 km². Isso é o equivalente a quase um milhão e quatrocentos mil campos de futebol.
O mesmo período do ano anterior registrou 7.536 km² de floresta desmatada, ou seja, houve crescimento de 29,5%. Ao todo, segundo o Inpe, cerca de 20% da cobertura florestal original da Amazônia do Brasil já foi desmatada.
Como nasce uma doença?
Pesquisadores citam 11 ações humanas que podem gerar pelo menos outras 11 novas doenças ou mesmo ressurgimento de outras que podem afetar os próprios seres humanos.
Uma delas está ligada à derrubada de árvores e a desordem civil. Esse tipo de ação pode, segundo os estudiosos, promover casos de um agente infeccioso de nome bem complicado (Paracoccidioidomicose) na região amazônica.
“A infecção ocorre por inalação de esporos liberados por Paracoccidioides que são encontrados no solo. Surtos de paracoccidioidomicose foram relatados em áreas com desmatamento maciço. […] a remoção do solo pode aumentar a exposição das pessoas aos esporos, causando novos surtos da doença. As mudanças climáticas resultantes do desmatamento da Amazônia podem predispor diferentes regiões da América Latina a novos surtos de Paracoccidioidomicose”, apontam pesquisadores.
O estudo cita também as doenças arboviroses, que são aquelas causadas pelos insetos, como a famosa dengue. Segundo a pesquisa, essas infecções muitas vezes estão sob equilíbrio na natureza, habitando macacos na floresta. O perigo é que com a perda do habitat natural, esses mosquitos podem acabar migrando para as cidades e infectando humanos.
Doenças existentes ganham com desmatamento
No Amazonas, em 2019, foram registrados 63.361 casos de malária. Apesar do alto número, no ano anterior, haviam sido mais de 73 mil casos, segundo a Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas (FVS-AM).
O pesquisador Philip Martin Fearnside diz ainda que as mesmas ações que contribuem para o surgimento de novas doenças, podem ajudar a potencializar outras.
“O desmatamento da Amazônia tem sido associado a uma maior taxa de mordida do mosquito Anopheles darlingi em humanos. Ele é um importante vetor transmissor da malária. Com isso, pode-se dizer que a transmissão da malária está ligada ao desmatamento da Amazônia “, diz um trecho do artigo.
Ao abordar a malária, pesquisadores apontam que ela pode aumentar ou diminuir a depender dos seguintes fatores:
– Nível de desmatamento
– Mudanças climáticas
– Cobertura florestal
– Padrões de chuva
– Faixas de temperatura
– Características paisagísticas
Pesquisadores mostram também que dados recentes comparados com os de 1990 apontam que as mudanças climáticas já aumentaram a capacidade de transmissão até mesmo da dengue. Foi uma alta de 3% no caso do mosquito Aedes Aegupti e 5,9% por outro mosquito, o Aedes Albopictus.
A dengue bateu recorde de mortes em 2019, com o segundo maior número de mortes em 21 anos, no Brasil. Foram 754 mortes de janeiro até o início de dezembro. O número de casos prováveis da doença passou dos um milhão, em 2019.
Até 28 de abril, a nova Covid-19 havia infectado, por números oficiais, 71.886 pessoas no Brasil. As mortes alcançaram mais de cinco mil, mais do que a China. O pico da pandemia causada pelo novo coronavírus ainda não chegou, segundo o Ministério da Saúde. Veja abaixo um resumo do que precisa saber sobre a doença.
Fonte: Jornal Emtempo
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