—– Por Alfredo Lopes —–
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“Todas essas nuances, entretanto, deveriam ser uma pauta do Conselho da Amazônia dentro das diretrizes formuladas por Hamilton Mourão, o vice-presidente da República, um general de sangue indígena, que tem a oportunidade de apresentar ao país essa Amazônia, até aqui sem rosto, que carece de integração, respeito e oportunidades”.
Quando esteve em Manaus em julho do ano passado, para abrir a primeira reunião das seis que competem ao Conselho de Administração da Suframa, o ministro Paulo Guedes, integrando a comitiva do presidente Bolsonaro, assim se expressou: “… o cenário ideal seria que o Brasil todo fosse uma enorme zona franca, e que o governo criasse riqueza na Amazônia preservando a natureza”. Logo em seguida arrematou que o governo quer transformar Manaus na capital mundial da biodiversidade e ressaltou que “uma árvore viva pode valer muito mais do que uma árvore morta”.
Depende dos americanos
Em seus comentários, não precisa muita massa cinzenta, havia uma lógica, cuja dedução seria reforçada e concluída caso o governo brasileiro, diplomaticamente, aprovasse a hipótese “…dos americanos reconheceram o direito de propriedade de oxigênio, pois a Amazônia produz oxigênio para o mundo”. Tendo toda essa riqueza – perguntou o ministro para uma plateia ligada diretamente ao setor produtivo – vamos viver só de diferenças de impostos (incentivos tributários da Zona Franca)?. Essa, provavelmente, foi mais uma formatação, compensação midiática(?) para esvaziar o Programa Zona Franca de Manaus, transformando no último jardim do mundo. O ministro defendeu a criação em Manaus de uma bolsa mundial de oxigênio. Seria esta a condição de possibilidade de implantação e destino da Zona Franca da Ilha do Marajó? Perguntar não ofende…
“Abrace o Marajó”
Num evento extremamente bem estruturado pelo governador do Pará, Helder Barbalho, o presidente Bolsonaro, que anda frequentando as hostes do MDB de Jáder Barbalho, de singular memória, disse, neste dia 03 de março, numa audiência festiva no Palácio do Planalto, que atenderia, de algum modo, as demandas de isenção dos impostos federais para “Abraçar o Marajó”. E que pediria ao ministro Guedes uma modelagem fiscal generosa. Ou seja, prometeu encomendar picanha num empório vegetariano.
São humanos os direitos
O governador paraense disse que já havia renunciado ao ICMS da Ilha, formada por gente humilde, com uma história de genocídio( o que restou da Civilização Marajoara além da cerâmica fantástica?) e hoje com muitos casos de violência sexual, étnica e social. Ou seja, um quadro caótico de Direitos Humanos. É bem verdade que, na estória dos palanques brasileiros, as promessas são generosas, mas por serem tão onerosas, geram desculpas para sua não realização. Se se concretizassem, por exemplo, tantas Zonas Francas quantas foram prometidas, Guedes teria encontrado, ao desembarcar em seu superministro, o cenário ideal: o Brasil transformado numa imensa Zona Franca.
Último jardim ou Parque de Componentes?
Ainda bem, do ponto de vista da gente humilde da lendária ilha, onde se concentrava a produção marajoara agrícola e de um artesanato milenar, o estado do Pará vai muito bem obrigado. Entre as unidades federativas foi a que mais cresceu em 2019, e desponta, com seus programas regionais, com um protagonismo produtivo admirável à luz do verbo empreender. Em vários setores, o Estado está no topo do ranking produtivo. Esse movimento permite gerar riquezas que possam mitigar eventuais danos florestais. É mais inteligente empreender e produzir do que proibir. Essa foi a grande sacada dos investidores paraenses e os que lá aportaram. A renúncia fiscal estadual dos Barbalho não fará muita falta aos cofres paraenses. Entretanto, se o governo federal pudesse criar condições de transferência das empresas de componentes para a região, hoje instalada no Sudeste brasileiro, essa renúncia – que isenta 80% de impostos os fabricantes que trabalham para a ZFM – se transformaria em empregos de que precisamos e custos logísticos mais razoáveis para partes e peças para o Polo Industrial de Manaus. A melhor forma de combater a violência e a pobreza é a geração de emprego. Sonhar é preciso.
E o Conselho da Amazônia?
Arroubos políticos à parte, pois confundem políticas de Estado com planos de governo, essa interlocução entre os estados da Amazônia é uma ideia bastante explorada na Amazônia Oriental, com foco em Belém. Integrar regionalmente para assegurar maior integração nacional, seria uma pauta para a União se unir aos Estados e começar a compreender melhor a Hileia. De tão preteridos, os habitantes da Amazônia começam a fomentar o embrião de uma Nação independente. Todas essas nuances, entretanto, deveriam ser uma pauta do Conselho da Amazônia dentro das diretrizes formuladas por Hamilton Mourão, o vice-presidente da República, um general de sangue indígena, que tem a oportunidade de apresentar ao país essa Amazônia, até aqui sem rosto, que carece de integração, respeito e oportunidades.
Há muita pirotecnia e fantasia irresponsável, que nasce da ignorância crônica e da má-fé militante, quando se fala em salvar a Amazônia. Certamente, a Amazônia de que se fala, acima e além da prioridade florestal, se traduz em mais de 25 milhões de pessoas, que padecem dos benefícios da civilização. Os indicadores de desenvolvimento humano são miseráveis, para uma região tão rica e tão importante aos olhos da Humanidade. E numa visão de totalidade a primeira tarefa de quem quer chegar perto é ajudar na conjugação do dar-se a conhecer internamente, pois há muitas Amazônias, cujas fragilidades e potencialidades estão nos escaninhos dos estudiosos.
“Decifra-me ou serei devorada”
No INPA, Museu Emílio Goeldi, Embrapas, entre outras instituições de ensino e pesquisa, professores e pesquisadores, heroicamente, trouxeram à luz os conhecimentos iniciais desse acervo impossível de inventariar que é a floresta amazônica. E que é inadiável de se entender, para manejar responsavelmente seus benefícios, transformando, de forma sustentável, a imensidão de suas potencialidades em prosperidade de nossa gente. O que não podemos é topar projetos na Amazônia para dar satisfação ao olhar estrangeiro. Chega de promessas e tantos adiamentos. Só nos importa atitudes em favor de quem aqui vive, trabalha e guarda esse patrimônio que o mundo quer.
(*) Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]
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