Foto: Bruno Zanardo
Augusto César Barreto Rocha (*)
É isso mesmo: não é nossa. Se fosse, não precisaríamos vez por outra afirmar que é nossa. Quando possuímos uma casa, não precisamos sair falando “esta casa é minha”, por exemplo. A afirmação é necessária quando ela está longe da verdade em que acreditamos. Ou seja, quando começamos a adesivar carros para afirmar que a “Amazônia é nossa”, é porque não estamos nos sentindo como possuidores da região, como se existisse um afastamento das pessoas com a própria região. Há pessoas que mundo afora se preocupam legitimamente com a região? Certamente. Há pessoas que se preocupam e se metem de maneira ilegítima? Também. Todavia, por qual razão não nos sentimos e não agimos como líderes de nossa região? Quais razões do passado e do presente nos levam a este comportamento estranho, onde não nos sentimos em casa na nossa própria casa? Por que não estamos sendo acolhidos pelos demais habitantes do mundo como os líderes da nossa casa?
De costas para o Rio
Esta dissociação de propriedade e a falta de zelo e cuidado com o nosso habitat é algo estranho. Muitos de nós fazemos pouco caso quando se falam nos riscos associados às queimadas e demais atos predatórios na região, como se fôssemos extremamente ciosos e cuidadosos com o território e a floresta. Somos tão dissociados da floresta que a cidade está de costas para o rio. Poucos habitantes de Manaus possuem uma vida realmente integrada ao habitat da floresta. São poucos os moradores daqui que tiram seu sustento das riquezas da floresta. Esta talvez seja uma parte da explicação.
Indiferença às demandas do interior
A riqueza da floresta é uma miragem chamada de potencial. Deveria existir uma enorme parte da economia do Amazonas que viesse da biodiversidade, mas fomos criando um cipoal regulatório que só dificulta esta possibilidade. A ausência de infraestrutura para conectar a cidade de Manaus com a enormidade do interior do Amazonas também afasta o cidadão comum de uma mínima conexão turística. O desconhecimento do interior é tão grade que ele é tratado de maneira única, como se todas as regiões tivessem as mesmas características. Das pessoas que vêm do interior do Estado para a capital, não se constata um interesse de voltar para as origens, como se dá em outras regiões de interior do mundo, provavelmente pelas tristes lembranças de falta de condições de desenvolvimento, que normalmente estão associadas com a falta de condições de fatores que levem ao morador daquela região a uma condição melhor.
Fragilidade econômica e instabilidade jurídica
E a Zona Franca de Manaus termina se confundindo como uma única identidade de desenvolvimento e como a única tábua de salvação para todos que moram em Manaus. Este olhar tão centrado na ZFM precisará ser transcendido em algum momento, sob pena de nos transformarmos em uma sociedade subserviente e sempre dependente dos aplausos para o mandatário de plantão que suba ou desça algum imposto, por meio de lei ou portaria, bagunçando toda a economia, como se verifica na questão dos Concentrados, onde empresas são colocadas em um ponto de impossível credulidade na mínima estabilidade jurídica.
Esperando o Messias
Como transformar esta realidade sem lideranças que apontem saídas? É uma impossibilidade. Precisarão surgir novas lideranças, que apontem caminhos, para que não fiquemos esperando um mago de outro Estado ou de outro país para vir aqui prescrever o que devemos fazer. Aliás, como não o fazemos, é natural que o mundo inteiro tenha que ocupar este espaço da nossa inércia. Por outro lado, quando alguém ousa apontar saídas alternativas tende a ser chamado de rebelde ou desautorizado. Enquanto o comportamento das lideranças pregar o pensamento único, será impossível mudar a realidade.
Alguém acha que estamos bem?
Hoje temos uma grande autocensura e até lideranças que não aceitam sequer conversar institucionalmente, quando outro líder ousa pensar diferente. É lamentável a situação atrasada em que nos colocamos. Natural que estejamos como estamos. Mas há um alento, o número de empregos cresce: Manaus foi a 5ª cidade do Brasil na geração de empregos formais em 2019: 10.457 – bem longe da necessidade, mas uma quantidade digna de nota, sendo superada apenas por SP, BH, Curitiba e Brasília. Fica a torcida para que esta boa notícia estimule nossos líderes de todos setores para um comportamento mais moderno, para que tomemos posse da riqueza que estamos queimando. Precisamos urgentemente de uma diversidade de pensamentos e líderes que aceitem dialogar com os diferentes, sob pena de não nos afastarmos do atoleiro em que nos encontramos. Ou alguém acha que realmente estamos bem?
(*) Professor da UFAM
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