Os ingleses, que daqui saíram encantados com a acolhida Manaó – a despeito da derrota no esporte que se arrogam ter inventado – descobriram mais uma vez que aqui o calor é sobretudo humano. Eles, porém, jamais se curvarão ao testemunho do cientista francês Charles Marie de La Condamine que, em meados de 1744, ao descer o Rio Amazonas por inteiro, desde as montanhas peruanas até Belém do Pará, relatou a ocorrência de “uns indiozinhos” jogando bola de látex, balata, ou sernambi, nas várzeas amazônicas. Os britânicos sequestraram, além das sementes da Hevea brasiliensis, e do acervo de 20 mil espécies botânicas ora armazenadas no Museu Real Botânico de Kew Gardens, em Londres, a autoria de invenção do futebol.
Mas não foi só de expropriação que se alimentou a presença inglesa na floresta. O amazonólogo Antônio José Souto Loureiro, em sua História da Navegação do Amazonas, ajuda a entender a memória de nossa economia e a jogar luzes no planejamento de novas trilhas e matrizes de crescimento e prosperidade social. Ele relata a grande sacada inglesa e sua percepção visionária de negócios. Inteligentemente, eles souberam atrelar inovação tecnológica à vocação logística natural de nossa malha hidroviária, investindo 200 milhões de libras esterlinas nos estaleiros do Reino Unido para rentabilizar as oportunidades da floresta. A frota mercantil fez da economia do látex um item destacado, entre tantos, dos investimentos que agregaram 60% de valor ao PIB anglicano por três décadas de navegação amazônica. As injunções diplomáticas para abrir a Amazônia à navegação internacional, o espírito visionário do Barão de Mauá, que multiplicou sua frota de cabotagem numa rapidez assustadora, a criação as Companhia de Navegação do Amazonas e a invenção da vulcanização da borracha foram outros itens da visão lucrativa e bem sucedida da Coroa Inglesa. Deixaram um porto que é moderno, depois de mais de um século, e lições visionarias que estamos ainda a aprender.
No século anterior, após o Tratado de Madri, Espanha e Portugal, já atentos às promessas das riquezas imensuráveis da Amazônia, acordaram em relação às suas fronteiras. Foi quando o Marques do Pombal, Sebastião José de Carvalho e Melo, o todo-poderoso primeiro-ministro da Coroa lusitana, tratou de enviar seu irmão, Mendonça Furtado, em 1751, para supervisionar os negócios da companhia monopolista na Amazônia. Ele instalou governança especial no Baixo Amazonas, olhando miríades de riquezas nas cercanias da Velha Serpa, pelas evidências estratégicas de navegação e oportunidades, evidências que as expedições europeias já haviam anotado.
Os ingleses já conheciam a estratégia de negócios da gestão pombalina e mandaram seus emissários para a Amazônia travestidos de cientistas para fazer inventários. E perceberam que na estratégia de ocupação e desenvolvimento dos irmãos lusitanos – apesar dos avanços do agroextrativismo – faltou a componente logística, as definições de negócios relacionadas a planejamento e operação de sistemas físicos no contexto das especificidades amazônicas. Eles estudaram as condicionantes espaciais e temporais de forma econômica e anteciparam os conceitos de suprimentos e integração das cadeias produtivas, sazonalidade da castanha em fevereiro e da borracha em outubro, por exemplo. Entenderam e faturaram na economia amazônica a relação entre os itens que formaram o conjunto de atividades do extrativismo, o suprimento de insumos, distribuição de produtos e serviços e a circulação de pessoas, focados na infraestrutura as cabotagem, no tripé dinâmico e articulado entretransporte,estoque einformação. Tudo aquilo que nos compete aprender o sentido mais amplo da expressão amazônica para inglês ver.
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