Estudo inédito aponta que o desmatamento da floresta amazônica pode impactar fenômeno dos rios voadores e afetar o funcionamento de 17 das 20 maiores usinas hidrelétricas no país
Um estudo realizado pelo projeto Amazônia 2030, iniciativa de pesquisadores brasileiros focados em desenvolver um plano sustentável para a maior floresta tropical do planeta, e pelo Climate Policy Initiative (CPI) da PUC-Rio, revelou que 17 das 20 hidrelétricas de maior capacidade no Brasil estão diretamente no caminho dos rios voadores da floresta amazônica, destacando sua dependência desse fenômeno climático.
O estudo, intitulado (Des)matando as hidrelétricas: a ameaça do desmatamento na Amazônia para a energia do Brasil, ilustra como a ausência de chuvas, agravada pelo desmatamento, compromete a potência dos rios voadores e, consequentemente, a operação dos reservatórios das usinas hidrelétricas nacionais.
O que são os rios voadores?
Segundo o relatório “O Futuro Climático da Amazônia“, escrito pelo cientista e agrônomo Antonio Nobre, toda a massa florestal amazônica, que é formada por milhões de árvores, desprende no ar um volume tão grande de água que é maior que o do próprio rio Amazonas. Esses grandes volumes de vapor d’água, chamados de rios voadores, são transportados por correntes de ar e podem viajar a até 3 mil quilômetros pelo continente a partir da região amazônica, como reforça um artigo da NatGeo Brasil.
Essenciais para a manutenção da biodiversidade, eles também são um fenômeno atmosférico crucial para o equilíbrio do clima da América do Sul, especialmente no Brasil, onde impacta na formação de chuvas em diversas regiões. Entretanto, ao passar por uma área desmatada, essas correntes de ar perdem umidade, já que não têm o corredor formado pelas florestas, e também a força das chuvas no trajeto.
Em períodos de seca e queimadas, esses rios aéreos secam, convertendo-se em “rios de fumaça” e ameaçando a disponibilidade hídrica. Isso afeta não apenas a distribuição de chuvas, mas também a geração de energia elétrica, já que a hidroeletricidade – que representou 60,2% da matriz energética brasileira em 2023 – depende desse ciclo.
A conexão íntima e direta entre rios voadores e hidrelétricas
O estudo apresentado conclui que o desmatamento na floresta amazônica pode já ter reduzido em até 10% a capacidade de geração de energia do país. Na Usina Hidrelétrica de Teles Pires, em Mato Grosso, foi estimada uma perda de geração de energia entre 2,5% e 10%, o que corresponde a oferta para cerca de 330 mil pessoas. A devastação de vegetação impacta até produção de três usinas hidrelétricas (UHE) situadas na Bacia do Paraná, trazendo uma perda de cerca de 3% na capacidade de geração de energia e em torno de 10% de perda de lucro anual.
“É muito assustador pensar que o desmatamento na Amazônia causa efeito na Bacia do Paraná, a quilômetros dali. Mas o mecanismo é muito claro”, explica Gustavo R. S. Pinto, analista sênior do Climate Policy Initiative (CPI) da PUC-Rio, que assina o relatório junto a outros pesquisadores.
Ele pontua que o fenômeno de seca dessas correntes de umidade da Amazônia não necessariamente está ligado à crise das mudanças climáticas, de forma mais geral. “Mesmo se não houvesse um fenômeno global, o desmatamento estaria afetando a geração de energia. Aquela árvore que ia evaporar a água deixa de existir, e as chuvas não são transportadas”, completa.
“O mapeamento dos principais pontos da Amazônia que contribuem para a manutenção da segurança energética do país é fundamental para direcionar políticas de conservação e proteção da matriz elétrica nacional. É importante também a participação dos agentes do setor elétrico na conservação e restauração da floresta.”, diz Pinto.
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