A Cachoeira do Mutum, situada no coração da Floresta Amazônica, a aproximadamente 110 quilômetros de Manaus, é um exemplo fascinante de como a geologia e a natureza podem se unir para criar paisagens únicas e encantadoras. Localizada no município de Presidente Figueiredo, conhecido como a “Terra das Cachoeiras”, essa queda d’água se destaca por suas inusitadas formações circulares, que despertam a curiosidade tanto de visitantes quanto de especialistas.
Vistos do alto, esses círculos no leito do rio Mutum formam um padrão geométrico impressionante, alinhados como se tivessem sido esculpidos por mãos humanas. No entanto, no nível da água, eles parecem grandes jacuzzis naturais, incrustadas no cenário selvagem da maior floresta tropical do mundo. As “marmitas” ou “panelas”, como são chamadas localmente, são cerca de 11 poços cilíndricos com diferentes diâmetros e profundidades, esculpidos pela própria força da natureza ao longo de milênios.
A origem das formações: uma obra milenar da natureza
A explicação para essas formações fascinantes vem da ciência. Segundo a geóloga Isabela Apoema, mestranda em geodiversidade pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), as “marmitas” são fruto de um processo de erosão natural, provocado pelo movimento constante da água do rio sobre as rochas. A água, ao se infiltrar nas fendas das pedras, age como uma esponja, removendo os sedimentos e, lentamente, ampliando os buracos. “Conforme os sedimentos são naturalmente retirados pela força da correnteza, esses buracos se alargam e se aprofundam, como se a rocha fosse retirada grão por grão”, explica Apoema.
Essa formação geológica é um exemplo impressionante de como a natureza pode moldar o ambiente ao longo do tempo, criando estruturas simétricas e perfeitas sem a intervenção humana. As “marmitas” da Cachoeira do Mutum são um verdadeiro testemunho da força erosiva da água, que ao longo de eras geológicas transformou a rocha bruta em poços cilíndricos perfeitos.
A paisagem do Cerrado amazônico: um terreno de altos e baixos
Ao contrário da imagem comum de que a Floresta Amazônica é uma vasta planície coberta de árvores gigantes, a região é marcada por uma diversidade geológica que inclui elevações, depressões e, consequentemente, muitas cachoeiras. As variações no relevo são o resultado de quebras geológicas que ocorreram ao longo de milhões de anos, criando um terreno ideal para a formação de quedas d’água.
Nesse contexto, Presidente Figueiredo surge como um local privilegiado para o surgimento de inúmeras cachoeiras. A cidade possui mais de 100 quedas d’água catalogadas, muitas delas escondidas em grutas e cavernas, outras em áreas de fácil acesso para turistas. A Cachoeira do Mutum é uma das mais emblemáticas, não apenas por suas “marmitas”, mas também pela beleza de sua queda em degraus de cerca de sete metros de altura, com águas de tonalidade ferrugem que fluem pelas pedras, criando pequenas piscinas naturais ao longo do caminho.
Para os visitantes, a experiência é única. Além da beleza das formações rochosas, a cachoeira oferece uma praia com areia branca, perfeita para banho e descanso. Para os mais aventureiros, é possível atravessar o véu d’água usando uma corda que ajuda a vencer a força da correnteza, proporcionando uma experiência imersiva e desafiadora.
O crescimento do geoturismo e os desafios de segurança
Nos últimos anos, o interesse pelo geoturismo – turismo focado em formações geológicas e paisagens naturais – tem crescido no Brasil. A Cachoeira do Mutum é um exemplo claro desse tipo de atração, onde o turista não busca apenas a beleza cênica, mas também o conhecimento e a compreensão das formações geológicas que compõem o local.
O recente acidente em Capitólio, Minas Gerais, que resultou em vítimas fatais devido ao desabamento de uma rocha, ressaltou a necessidade urgente de medidas de segurança em locais turísticos com formações geológicas semelhantes. Embora a Cachoeira do Mutum seja uma área relativamente segura, a falta de sinalização, infraestrutura e estudos específicos pode colocar em risco os turistas que a frequentam, especialmente em épocas de cheia ou aumento no volume das águas.
A Cachoeira do Mutum está localizada em uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), uma área privada destinada à preservação da biodiversidade e ao turismo sustentável. Segundo Louise Ravedutti, proprietária da cachoeira, há um esforço contínuo para melhorar a infraestrutura local, visando garantir uma melhor experiência para os visitantes e proteger o meio ambiente.
Atualmente, um restaurante está em construção próximo ao ramal de acesso à cachoeira, mas longe o suficiente do atrativo natural para evitar a poluição e o descarte inadequado de resíduos. “Queremos evitar que as pessoas levem lixo para a cachoeira ou consumam comida do restaurante na área natural”, explica Louise, enfatizando a importância de manter a integridade do local.
A importância de preservar
A Cachoeira do Mutum é um exemplo do imenso potencial turístico e científico que o Brasil tem em suas paisagens naturais. No entanto, o crescimento do turismo precisa ser acompanhado por uma abordagem cuidadosa e responsável para garantir que essas áreas continuem a ser preservadas para as gerações futuras.
Presidente Figueiredo, com suas mais de 100 cachoeiras e paisagens geológicas únicas, oferece um tesouro natural que atrai tanto turistas quanto cientistas. Para os que visitam a Cachoeira do Mutum, a experiência vai além de um simples banho de cachoeira – é uma oportunidade de se conectar com as forças geológicas que moldaram a Amazônia ao longo de milênios e, ao mesmo tempo, refletir sobre a importância da conservação dessas áreas para o futuro do planeta.
Com o avanço do geoturismo no Brasil, áreas como a Cachoeira do Mutum estão ganhando destaque, tanto por suas belezas naturais quanto por suas formações geológicas únicas. No entanto, é crucial que a preservação dessas áreas esteja no centro das atenções, garantindo que o turismo seja sustentável e que o impacto ambiental seja minimizado.
A Cachoeira do Mutum não é apenas um destino turístico, mas um símbolo da riqueza geológica e natural do Brasil, que precisa ser protegida e valorizada.
*Com informações UOL
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