O que temos na Amazônia são infraestruturas de décadas atrás, com cenários de infraestrutura imaginada apenas para apoiar outras regiões do país. E assim, a energia elétrica vai para o Sudeste, seus rios servem para apoiar o centro-oeste no escoamento da soja. Seus rios servem para transportar cargas ou passageiros com custos e preços extraordinários que permitem margens de lucro excepcionais. Corrigir ou reduzir as desigualdades regionais para o interesse da Amazônia não entra na pauta das ações, por mais que isso faça parte de um discurso e de um diálogo, aqui, acolá, mas está longe da realidade concreta
Por Augusto Rocha
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Vivemos em uma região com infraestruturas imaginadas. Há tantos rios na região que nos habituamos a chamá-los de “hidrovias”, mas eles não são nada além de rios e nem sempre navegáveis. Há tentativas de transformação em hidrovias. Como exemplo, recentemente veio uma draga de maior porte, para tentar manter a navegabilidade nesta “hidrovia” e ela não consegue resolver o problema, mas muitas pessoas acreditam que ela resolverá.
Até aqui, não resolveu, repetindo o fracasso do ano passado, quando foi usada uma draga de menor porte. Pelo menos serviu para acalmar os corações, removendo a sensação de inércia. Ao que tudo indica, a navegabilidade será retomada pela chuva que volta a acontecer, depois do repiquete. Ano passado a dragagem não resolveu e este ano a história vagarosamente se repete.
Frequentemente, falamos sobre a rodovia BR-319. Faz anos e anos. Parecemos presos em uma espiral do tempo. A discussão é vazia e sem fim. Apenas generalismos maniqueístas de proteção versus destruição do meio-ambiente, como se isso fosse simples ou uma luta do bem contra o mal. São tantas e infindáveis discussões, que nos perdemos nas discussões e não nas ações. Fala-se bastante e chega mais um fim de ano e nada mudou: nem temos proteção, nem rodovia.
A concessão do aeroporto de Manaus traria mais voos e menos custos. O que se constata é um aeroporto menor, com menos voos e mais custos. Seguimos com muitas possibilidades e poucas realidades concretas melhores do que o passado. Pela Amazônia não temos nem muitos “voos de galinha”, como se convencionou deliberar o desenvolvimento nacional. O que temos é uma operação que não atraiu mais voos para o Amazonas. Hoje é mais caro voar no Amazonas para a Amazônia e menos voos chegam por aqui do que no passado.
As queimadas acontecem, mas temos pouco entendimento das suas causas, das extensões por mesorregião. Temos apenas números “macro” que relatam efeitos e não as causas destas catástrofes. Sequer conseguimos diferenciar o que foi natural e o que foi criminoso, o que foi da tradição do pequeno produtor ou o que foi destruidor para a grilagem ou pasto. O que foi da natureza e o que foi crime? O que foi um incidente, um dano ou uma catástrofe? Convivemos com o fogo, respiramos a fumaça e não entendemos as suas causas.
A Amazônia ainda não foi percebida institucionalmente como algo valioso. Ela é como um terreno que fica por ali, para especulação e para algum uso futuro que nós nem sabemos qual será. O atraso, a fome, a falta de hidrovias, a falta de portos, a falta de retroportos, a falta de aeroportos, os altos custos de vida, o baixo desenvolvimento humano ou os dramas das capitais e dos interiores são apenas histórias e não existem ações concretas e métricas perseguidas para uma melhoria continuada.
O que temos na Amazônia são infraestruturas de décadas atrás, com cenários imaginados apenas para apoiar outras regiões do país. E assim, a energia elétrica vai para o Sudeste, seus rios servem para apoiar o centro-oeste no escoamento da soja. Seus rios servem para transportar cargas ou passageiros com custos e preços extraordinários que permitem margens de lucro excepcionais. Corrigir ou reduzir as desigualdades regionais para o interesse da Amazônia não entra na pauta das ações, por mais que isso faça parte de um discurso e de um diálogo, aqui, acolá, mas está longe da realidade concreta.
Augusto Rocha é Professor Associado da UFAM, com docência na graduação, Mestrado e Doutorado e é Coordenador da Comissão CIEAM de Logística e Sustentabilidade