Etnias ianomâmi e munduruku são as que mais sofrem com a contaminação do mercúrio causada pela mineração
Por Mariana Albuquerque – Correio Braziliense
A crise humanitária dos ianomâmis chamou a atenção para aquilo que já pode ser considerado um nível irreversível de contaminação por mercúrio não apenas dos povos originários, mas também de uma grande parcela da população que, mesmo de longe, é afetada pelos efeitos do uso do metal na atividade garimpeira.
A tendência, segundo estudo realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), é que nos próximos anos haja um aumento exponencial em Roraima — e possvelmente em estados vizinhos — de doenças relacionadas à contaminação pelo mercúrio.
“A pessoa que consumir e estiver exposta ao alimento e a qualquer coisa proveniente da região, seja ela indígena, ribeirinho, quilombola, habitante da cidade, corre sério risco. Se tem o hábito de comer peixe regularmente, está sujeita à contaminação. Não apenas os trabalhadores que manuseiam o mercúrio, mas o resto da população que mora perto também está vulnerável.
O problema não está restrito aos originários; é um problema da sociedade como um todo”, afirma Paulo Basta, médico e pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fiocruz).
Responsável pelo estudo que comprovou os altos níveis de mercúrio no organismo de indígenas do Pará, de Roraima e do Amazonas, Basta aponta que as etnias ianomâmi e munduruku são as que mais sofrem com a contaminação ambiental causada pela mineração. Ele alerta, porém, que pesquisas apontam para o avanço dos poluentes para outras cidades roraimenses. O principal vetor da contaminação pelo mercúrio são os alimentos.
Segundo o pesquisador, antes mesmo dos indígenas, a principal vítima da contaminação pelo mercúrio é o trabalhador do garimpo, que é obrigado a utilizar o metal para poder apurar o ouro. “Eles precisam separar os materiais, pois o mercúrio tira o valor do ouro.
Nesse processo, fazem a queima do produto, que chamamos de exposição ocupacional — vapor e os resquícios do material deixarão o garimpeiro em uma situação de saúde muito parecida com a do indígena contaminado. Para piorar, aquelas pessoas trabalham em situação análoga à escravidão. Os grandes responsáveis por isso são os financiadores, que não se contaminam”, aponta.
Basta lembra que a garimpagem é essencialmente um trabalho braçal, com instrumentos rústicos e que envolve produtos de alta toxidade. “A atividade é muito rudimentar, e quanto mais rudimentar, mais mercúrio é usado. Há estimativas que apontam que para cada quilo de ouro tirado, são gastos de 2kg a 8kg de mercúrio para obtê-lo”, calcula.
Texto publicado originalmente por Correio Braziliense
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