Em entrevista, a líder da Iniciativa Estratégica de Serviços Ambientais do Idesam, Victoria Bastos falou sobre a situação do mercado de carbono, o cenário da Amazônia, e como usar todo esse potencial em favor dos povos que vivem na floresta
Matéria desenvolvida e publicada originalmente pelo Idesam
O crescimento das metas corporativas para redução e compensação de emissões de carbono no setor privado traz um debate fundamental sobre oferta e demanda responsável dos créditos de carbono no Brasil, principalmente em iniciativas de redução de emissões por conservação ou restauração florestal – onde se concentra a maior disponibilidade de créditos no país.
Mas como conectar os povos da floresta com esses projetos tornando-os protagonistas das tomadas de decisões a partir de uma visão de governança territorial ou multissetorial? A líder da Iniciativa Estratégica de Serviços Ambientais do Idesam e do Programa Carbono Neutro, Victoria Bastos, conversou conosco sobre os principais desafios e o impacto social destas iniciativas na região amazônica.
O que são os projetos de carbono florestais e como está o crescimento deste mercado?
Os chamados projetos de carbono florestal se baseiam na redução de emissões de GEE através de soluções baseadas no uso da terra. Podem ser gerados créditos pela remoção de carbono da atmosfera, em projetos de reflorestamento e restauração, ou através da redução de emissões pela conservação da floresta em pé (REDD+). Ao mesmo tempo, o crescimento desses projetos pode também trazer uma onda de iniciativas ruins, com baixa integridade socioambiental e sem consistência metodológica, o que colocaria em risco a credibilidade dos mecanismos de geração e certificação de créditos do mercado.
Como está a Amazônia neste cenário de crescimento?
A Amazônia apresenta um grande crescimento de projetos do setor de Agricultura, Florestas e Outros Usos do Solo (AFOLU), de acordo com a plataforma do padrão VCS da Verra. Atualmente, existem 71 projetos para geração de créditos de carbono neste setor, dos quais 30 estão com registro finalizado, ou seja, já emitem ou foram autorizados a emitir créditos de carbono. Outros 41 estão em processo de desenvolvimento, nas fases de pré-registro.
A região amazônica também concentra 86% dos projetos registrados no país, totalizando 26 com potencial de redução de 10,8MtCO2 por ano em média entre 2020 e 2030. Dos projetos em processo pré-registro, 30 (73%) tem potencial de geração de redução de emissões anuais em média de 11,2MtCO2 dentro do mesmo período.
Como você avalia o potencial de investimentos na região amazônica?
Importante constar que 104 empresas brasileiras ou globais com atividades no Brasil reportam ao CDP, em 2021, emissões diretas na ordem de 168 MtCO2. Se pelo menos 10% destas emissões fossem compensadas através da compra de créditos em projetos na Amazônia, isso representaria 97,4 milhões de dólares, apenas em 2021 destinadas à conservação ou restauração florestal, considerando a margem de U$ 5,8/tCO2 para projetos AFOLU publicada pelo relatório “State of the Voluntary Carbon Markets 2022 – Q3” do Ecosystem Marketplace.
É importante que a demanda por créditos estimule uma oferta de projetos conectados à realidade dos territórios onde são implementados. De um lado, há um mercado altamente aquecido gerando uma movimentação intensa de recursos, e de outro lado, comunidades, territórios e governos locais precisando de investimentos e ávidos por participar desse mercado para fomentar cadeias produtivas e da bioeconomia.
Como conectar esses projetos aos povos que vivem na floresta?
Os projetos de carbono florestal precisam contribuir para reduzir as desigualdades e gerar renda para as populações tradicionais e desenvolvimento – ou ao contrário não trarão os impactos esperados a longo prazo. É preciso respeito a integridade e investimentos em projetos que valorizem a transformação social dos territórios amazônicos, além de investimentos que dão a devida importância à visão de contexto para o impacto dessas ações, em outras palavras, não basta não gerar impacto negativo, precisa fomentar impacto positivo.
E o dispositivo mais recomendado para isso são os Protocolos de Consulta Prévia Livre e Informada. O crédito de carbono é o maior produto hoje de exportação da floresta amazônica. Frente a isso, para onde esse mercado vai e como ele deve crescer em direção ao impacto e desenvolvimento local? A resposta não é única, mas certamente deve considerar, no presente e futuro, o respeito aos povos tradicionais, geração de renda para comunidades locais e promoção do desenvolvimento sustentável com responsabilidade socioambiental na Amazônia.
Victoria Bastos é Gestora ambiental formada pela ESALQ/USP, atua no Programa de Mudanças Climáticas do Idesam como coordenadora. Trabalha principalmente com a gestão de projetos socioambientais para valorização da floresta em pé através de pagamentos por serviços ambientais e negócios sustentáveis nas comunidades Amazônicas.
Fonte: Idesam
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