Em meio ao cenário singular da Caatinga, o majestoso rugido da onça-pintada ecoa como um lembrete da rica biodiversidade da região. No entanto, a convivência desses felinos com o progresso tecnológico mostra-se frágil.
Estima-se que apenas 250 onças-pintadas e 2.500 onças-pardas habitam o bioma da Caatinga. A maior parte reside na região do Boqueirão da Onça, no norte da Bahia – considerado o maior trecho preservado da vegetação do semiárido. Nesse santuário de biodiversidade, no entanto, erguem-se quatro complexos eólicos, sendo um deles composto por 500 torres.
Essas estruturas, emblemáticas de uma busca por energia limpa, trazem consigo um dilema ecológico. Sua instalação pressupõe o corte da vegetação nativa, podendo levar à secagem de nascentes próximas e alteração do escoamento natural da água da chuva. A consequência direta desse desequilíbrio é o aumento da distância que as onças precisam percorrer em busca de recursos básicos, como água e alimento.
Esse movimento as aproxima de propriedades rurais, onde, na luta por sobrevivência, acabam abatendo cabras e bodes. Infelizmente, essa interação muitas vezes culmina na retaliação dos fazendeiros, levando à morte desses magníficos predadores.
A Caatinga, a despeito de sua importância, carece de políticas públicas voltadas para sua preservação. Surpreendentemente, menos de 10% do bioma está sob proteção de Unidades de Conservação. Em contraste, é neste território que 85% dos complexos eólicos do país estão localizados.
Um caso que ilustra essa situação delicada é o de Vitória, uma fêmea de onça-parda monitorada entre março de 2017 e janeiro de 2018. Durante esse período, pesquisadores do Programa Amigos da Onça, ligado ao Instituto Pró-Carnívoros, observaram uma mudança drástica no padrão de deslocamento do animal. A causa? A construção de um complexo eólico na área que Vitória considerava território.
“Ela não cruzou a área dos aerogeradores nesses dez meses”, relata Carolina Esteves, pesquisadora do Pró-carnívoros. “Essa movimentação ampliada traz um gasto energético muito maior para ela.” Esse padrão, de evitar as áreas de empreendimentos, também foi observado em onças-pintadas.
A história de Vitória lança luz sobre a urgência de equilibrar desenvolvimento e conservação. Embora a busca por fontes de energia sustentáveis seja fundamental, é preciso garantir que ela não comprometa a já frágil existência de espécies icônicas, como as onças da Caatinga.
Em meio à paisagem singular da Caatinga, as onças enfrentam desafios que vão além das já conhecidas adversidades do bioma. O avanço dos complexos eólicos na região traz à tona um dilema: a busca pelo desenvolvimento sustentável e a preservação de uma espécie à beira da extinção.
Características Únicas, Desafios Imensos
Diferentemente de suas parentes em outros biomas, as onças da Caatinga possuem características físicas distintas, adequadas à vida no semiárido. São animais de porte menor, com bigodes mais rígidos e pelos nas patas espessos, ideais para o chão quente. “A sobrevivência nesse bioma exige mais do que habilidade de caça. É vital conhecer os pontos de água”, explica a bióloga Carolina.
Ela enfatiza a importância desse conhecimento ancestral: “Se colocarmos uma onça adulta de outro bioma na Caatinga, provavelmente ela não sobreviverá, principalmente na época da seca”. Durante os primeiros anos de vida, a mãe onça ensina o filhote não apenas a caçar e se proteger, mas, crucialmente, a localizar água.
Uma Espécie em Perigo
Apesar da crescente popularidade das energias renováveis, o impacto desses projetos na fauna local não pode ser negligenciado. As onças da Caatinga, particularmente vulneráveis, dependem das matas nativas para sua sobrevivência.
Estimativas de 2013 apontam que apenas 250 onças-pintadas e 2.500 onças-pardas habitam o bioma. Destas, 30 pintadas estão na região do Boqueirão da Onça. “Esses números, infelizmente, podem ser ainda menores, dadas as atividades de caça e os relatos de retirada de indivíduos”, adverte Carolina. Na Caatinga, a onça-pintada é classificada como “criticamente ameaçada de extinção”, enquanto a onça-parda é considerada “em perigo de extinção”.
Se há seis anos a onça Vitória já apresentava alterações em seu deslocamento devido à presença humana, é alarmante pensar no cenário atual para os felinos da região. Atualmente, quatro complexos eólicos operam na Área de Proteção Ambiental do Boqueirão da Onça, com outros dois em expansão e mais seis planejados.
Cláudia Bueno de Campos, bióloga e cofundadora do Amigos da Onça, destaca a urgência da situação: “Além dos complexos já em funcionamento, há mais seis empreendimentos eólicos previstos para a área.”
A situação descrita destaca uma série de preocupações complexas e interconectadas que dizem respeito à conservação da biodiversidade, ao desenvolvimento econômico e ao impacto humano na natureza. Abordarei os principais pontos e considerações sobre a situação:
- Conflito entre Conservação e Desenvolvimento Energético: Enquanto a energia eólica e solar são vistas como alternativas mais limpas aos combustíveis fósseis e são essenciais para combater as mudanças climáticas, a sua instalação pode ter impactos negativos em ecossistemas sensíveis. O desenvolvimento de projetos de energia renovável precisa ser feito de maneira responsável, garantindo que os habitats naturais sejam preservados.
- Educação e Conscientização Local: O conflito entre humanos e vida selvagem, como o conflito entre as onças e os produtores rurais, é uma preocupação em muitas partes do mundo. Programas de educação são vitais para ensinar as comunidades locais sobre a importância da biodiversidade e formas de coexistir com a vida selvagem. O programa de “educação para a conservação” e os chiqueiros protegidos mencionados são passos na direção certa.
- Valorização do Bioma Caatinga: O texto destaca que a Caatinga é frequentemente vista como um “patinho feio” em comparação com biomas mais exuberantes como a Amazônia ou a Mata Atlântica. No entanto, cada bioma tem sua própria riqueza e importância ecológica. É vital que haja uma conscientização sobre a singularidade e importância da Caatinga para garantir sua proteção.
- Políticas Públicas e Licenciamento: A menção de aerogeradores instalados sem permissão prévia do órgão licenciador e a abertura indiscriminada de estradas demonstra uma falha na fiscalização e no licenciamento ambiental. As políticas públicas devem ser fortalecidas e o cumprimento rigoroso das leis ambientais deve ser garantido.
- Colaboração entre Stakeholders: Dada a complexidade da situação, é essencial que haja colaboração entre ONGs, comunidades locais, governos, empresas de energia e pesquisadores. Soluções sustentáveis podem ser encontradas quando todos os stakeholders trabalham juntos.
- Importância da Pesquisa e Monitoramento: O levantamento e estudos sobre as onças são fundamentais para entender a situação e planejar ações de conservação eficazes. O apoio a pesquisas e iniciativas como o “Amigos da Onça” é crucial.
- Urgência da Situação: Com as onças da Caatinga à beira da extinção, o tempo é essencial. Medidas imediatas e eficazes precisam ser implementadas para proteger esse felino e seu habitat.
*Com informações MONGABAY
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