O maior dos problemas que existe na Amazônia diz respeito ao ignorar dos locais, seus modos de vida, sua terra e a natureza exuberante. A abordagem com a região segue sendo a do saqueador
Por Augusto Cesar Barreto Rocha
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O Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA) foi finalmente destravado, em 03/05/2023, passando a se chamar Centro de Bionegócios da Amazônia. O decreto assinado pela Presidência da República resgata um esforço de mais de 20 anos, desde a sua concepção, passando por muitas idas e vindas em diferentes governos.
Em breve, este sonho acalentado começa a sair do papel para a realidade além de um prédio. As entidades que terão que transformar a situação são lideradas por uma organização social que possui a Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), de São Paulo, voltando, depois de muitos anos, para Manaus.
Convém chamar a atenção dos que virão para Manaus para lerem os textos de Sueli Carneiro e de Boaventura de Souza Santos, para que não façam o “epistemicídio”, que é “à destruição de algumas formas de saber locais, à inferiorização de outros, desperdiçando-se, em nome dos desígnios do colonialismo, a riqueza de perspectivas presente na diversidade cultural e nas multifacetadas visões do mundo por elas protagonizadas”.
O maior dos problemas que existe na Amazônia diz respeito ao ignorar dos locais, seus modos de vida, sua terra e a natureza exuberante. A abordagem com a região segue sendo a do saqueador
Sair da condição de império e passar para a república, sair do saquear e passar para o progresso amplo e total será um grande esforço. Reconhecer os locais será um esforço titânico. O negacionismo é amplo em questões sobre a região.
Tipicamente se fala na Amazônia a partir de uma perspectiva imperial. Quase nunca é ecoado pelo país uma lógica de progresso. Quando há algo na região que é progressista, torce-se e contorcem-se os conceitos para buscar uma forma de destruir, como no caso da indústria da Zona Franca de Manaus, que tem gerado impostos e respeitado o meio ambiente.
Ao invés de se discutir como ampliar esta indústria, melhorar seu nível tecnológico ou de remuneração dos trabalhadores ou ainda como trazer mais capital nacional para alocar seu esforço em Manaus, o que mais se discute é uma forma de regredir da indústria para a extração destrutiva da floresta, como se existisse atividade sustentável na mineração ilegal ou na extração transloucada de madeira. Chega de desperdícios de esforços. É imperiosa uma mudança de pauta sobre a Amazônia, e o CBA precisa se dar conta deste papel.
O maior esforço que terá o CBA será o de mudar da concepção destrutiva e assassina para uma concepção de progresso e valorização da Amazônia. Não existe mais um vasto e desconhecido território na região. O que existe é um potencial econômico enorme, que vem sendo transportado para o exterior ou para o país, com uma ilegalidade ou falta de respeito ambiental ou humano.
Entender o que tem dado errado será o primeiro passo na missão do CBA. Entender o que precisa ser feito para mudar a realidade será o segundo passo.
Estimo que os gestores da UEA e IPT e da Organização Social constituída, percebam que possuem este trabalho histórico e tenham a coragem de trazer Sociólogos, Antropólogos e Economistas, para irem além das biomoléculas, pois há algo muito maior do que o bio e do que a tecnologia para fazer com que a inovação tecnológica saia dos saberes tradicionais, para os laboratórios e daí para os produtos. Afinal, já têm saído – a questão é que quem tira e quem ganha não está na região, nem investe na Amazônia e os lucros estão nos lugares de sempre.
Se não houver um olhar apropriado, teremos mais 20 anos de inação ou uma espoliação potencializada. Seja bem-vindo o novo CBA – mas fica o apelo: comecem com cuidado e sem assassinar pelo epistemicídio ou pelo negacionismo.
Augusto Rocha é Professor Associado da UFAM, com docência na graduação, Mestrado e Doutorado e é Coordenador da Comissão CIEAM de Logística e Sustentabilidade
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