Número de pessoas afetadas pela aumentou em cerca de 150 milhões desde o início da pandemia
O número de pessoas afetadas pela fome no mundo chegou a triste marca de subiu para 828 milhões em 2021, de acordo com o mais edição de 2022 do relatório “O Estado de Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo” (State of Food Security and Nutrition in the World – SOFI, no original em inglês).
Neste documento, o termo fome é sinônimo de má alimentação crônica e é medido pela prevalência de subalimentação. É também uma sensação desconfortável ou dolorosa causada pela energia insuficiente da dieta. Privação de comida.
Infelizmente o número de seres humanos nesta condição segue aumentando: em relação a 2020, aumentou cerca de 46 milhões e, desde o início da pandemia, o crescimento foi de cerca de 150 milhões de pessoas afetadas pela fome.
O documento fornece novas evidências de que o mundo está se afastando ainda mais de sua meta de acabar com a fome, insegurança alimentar e má nutrição até 2030.
Fome no Brasil
No Brasil, a prevalência de insegurança alimentar grave em relação à população total aumentou de 1,9% entre 2014 e 2016 para 7,3% entre 2019 e 2021 – isso significa um salto de 3,9 milhões para 15,4 milhões entre 2014 e 2021. Quando falamos em insegurança alimentar moderada ou grave em relação à população total o aumento foi de 37,5 milhões de pessoas (18,3%) entre 2014 e 2016, para 61,3 milhões de pessoas (28,9%) entre 2019 e 2021.
Dados mais recentes sobre a situação do país revelam que mais de 33 milhões de pessoas passam fome no Brasil, um patamar semelhante ao de 30 anos atrás. De acordo com 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, divulgado no início de junho de 2022, revelam que em menos de um ano 14 milhões de brasileiros entraram na situação de vulnerabilidade alimentar – a cada 10 brasileiros ou brasileiras, 6 pessoas convivem com algum grau de insegurança alimentar.
Quadro sombrio
O mais recente relatório das Nações Unidas apresenta atualizações sobre a situação da segurança alimentar e da nutrição em todo o mundo, incluindo as últimas estimativas do custo e da acessibilidade de uma alimentação saudável. O relatório também analisa maneiras pelas quais os governos podem reformular seu apoio atual à agricultura para reduzir o custo de alimentações saudáveis, estando atentos aos recursos públicos limitados disponíveis em muitas partes do mundo.
Os números pintam um quadro sombrio. Depois de permanecer relativamente inalterada desde 2015, a proporção de pessoas afetadas pela fome saltou em 2020 e continuou a subir em 2021, chegando a 9,8% da população mundial. Isso se compara com 8% em 2019 e 9,3% em 2020.
Outro dado alarmante é o de que cerca de 2,3 bilhões de pessoas no mundo (29,3%) enfrentaram insegurança alimentar moderada ou severa em 2021 – 350 milhões a mais em comparação com antes do surto da pandemia de COVID-19. Cerca de 924 milhões de pessoas (11,7% da população global) enfrentaram a insegurança alimentar em níveis severos, um aumento de 207 milhões em dois anos.
“Há um perigo real de que esses números subam ainda mais nos próximos meses. Os aumentos globais de preços de alimentos, combustíveis e fertilizantes que estamos vendo como resultado da crise na Ucrânia ameaçam empurrar os países ao redor do mundo para a fome. O resultado será a desestabilização global, a fome e a migração em massa em uma escala sem precedentes. Temos que agir hoje para evitar essa catástrofe iminente”, avida o diretor executivo do WFP, David Beasley.
Mulheres e crianças
A lacuna de gênero na insegurança alimentar continuou a aumentar em 2021. Aproximadamente 32% das mulheres no mundo enfrentaram insegurança alimentar moderada ou severa em relação a 27,6% dos homens – uma diferença de mais de quatro pontos percentuais, em comparação com três pontos percentuais em 2020.
Estima-se que 45 milhões de crianças menores de cinco anos sofriam de baixo peso para a estatura (wasting), a forma mais mortal de má nutrição, o que aumenta o risco de morte das crianças em até 12 vezes. Além disso, 149 milhões de crianças menores de cinco anos tiveram crescimento e desenvolvimento atrofiados (stunting) devido à falta crônica de nutrientes essenciais em suas dietas, enquanto 39 milhões estavam acima do peso.
Por outro lado, estão sendo feitos progressos no aleitamento materno exclusivo, com quase 44% dos bebês com menos de seis meses de idade sendo amamentados exclusivamente em todo o mundo em 2020. No entanto, isso ainda está aquém da meta de 50% até 2030. Outra grande preocupação é que duas em cada três crianças não são recebem a dieta mínima diversificada de que precisam para crescer e desenvolver seu potencial máximo.
Projeções
Quase 3,1 bilhões de pessoas não conseguiram pagar por uma alimentação saudável em 2020, um aumento de 112 milhões em relação a 2019, refletindo os efeitos da inflação nos preços dos alimentos ao consumidor decorrentes dos impactos econômicos da pandemia de COVID-19 e das medidas colocadas em prática para contê-la.
Olhando para a frente, as projeções são de que cerca de 670 milhões de pessoas (8% da população mundial) ainda enfrentarão a fome em 2030 – mesmo que uma recuperação econômica global seja levada em consideração.
Trata-se de um número semelhante ao de 2015, quando o objetivo de acabar com a fome, a insegurança alimentar e a má nutrição até o final desta década foi lançado sob a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
No momento em que este relatório está sendo publicado, a guerra em curso na Ucrânia, envolvendo dois dos maiores produtores globais de cereais básicos, oleaginosas e fertilizantes, está interrompendo as cadeias de suprimentos internacionais e elevando os preços de grãos, fertilizantes, energia, bem como alimentos terapêuticos prontos para uso por crianças com má nutrição grave.
Isso ocorre porque as cadeias de suprimentos já estão sendo afetadas negativamente por eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes, especialmente em países de baixa renda, e têm implicações potencialmente preocupantes para a segurança alimentar e nutrição globais.
“Este relatório destaca repetidamente a intensificação desses principais fatores de insegurança alimentar e má nutrição: conflitos, choques climáticos e choques econômicos, combinados com as crescentes desigualdades”, escreveram no prefácio os chefes das cinco agências da ONU envolvidas no relatório deste ano.
“O que está em jogo não é se as adversidades continuarão a ocorrer ou não, mas como devemos tomar medidas mais ousadas para construir resiliência contra choques futuros”, finalizaram os representantes.
Políticas agrícolas
O relatório aponta também que o apoio mundial ao setor alimentício e agrícola foi de quase 630 bilhões de dólares por ano entre 2013 e 2018. A maior parte disso vai para os agricultores individuais, por meio de políticas comerciais e de mercado e subsídios fiscais. No entanto, não só esse apoio é distorcido pelo mercado, como não está atingindo muitos agricultores, prejudica o meio ambiente e não promove a produção de alimentos nutritivos que compõem uma alimentação saudável.
Isso acontece em parte porque os subsídios muitas vezes visam a produção de alimentos básicos, laticínios e outros alimentos de origem animal, especialmente em países de alta e média renda. Arroz, açúcar e carnes de vários tipos são os alimentos mais incentivados em todo o mundo, enquanto frutas, legumes e verduras são relativamente menos apoiados, particularmente em alguns países de baixa renda.
Com as ameaças de uma recessão global iminente, e as implicações que isso tem sobre as receitas e despesas públicas, uma forma de apoiar a recuperação econômica envolve a redefinição do apoio alimentar e agrícola para alimentos nutritivos direcionados onde o consumo per capita ainda não corresponde aos níveis recomendados para dietas saudáveis.
As evidências sugerem que, se os governos repensarem o destino dos recursos que estão usando para incentivar a produção, o fornecimento e o consumo de alimentos nutritivos, eles contribuirão para tornar as alimentações saudáveis mais baratas, mais acessíveis e equitativas para todas as pessoas.
Por fim, o relatório também aponta que os governos poderiam fazer mais para reduzir as barreiras comerciais para alimentos nutritivos, como frutas, legumes, verduras e leguminosas.
“A escala sem precedentes da crise da má nutrição exige uma resposta sem precedentes. Devemos dobrar nossos esforços para garantir que as crianças mais vulneráveis tenham acesso a dietas nutritivas, seguras e acessíveis, além de serviços para a prevenção precoce, detecção e tratamento da má nutrição. Com a vida e o futuro de tantas crianças em jogo, este é o momento de intensificar nossa ambição pela nutrição infantil – e não temos tempo a perder”, alerta Catherine Russell, diretora executiva do UNICEF.
Fonte: CicloVivo
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