Após duas semanas de paralisação, cinco pessoas morreram, 80 foram detidas e deputados discutem impeachment de Lasso
No Equador, completam-se duas semanas de paralisação nacional com um cenário de instabilidade nacional. O presidente Guillermo Lasso levantou o estado de sítio em seis províncias, anunciou a redução no preço dos combustíveis, enquanto a Assembleia Nacional discute um pedido de destituição do mandatário. Em resposta, a Confederação de Nacionalidades Indígenas (Conaie) disse que as medidas anunciadas não são suficientes e a greve continua.
Em 14 dias de protestos e bloqueios de rodovias, foram registrados cinco mortos e mais de 80 detidos em confronto com a Polícia Nacional, segundo levantamento de organizações de direitos humanos. O controle das Forças Armadas estava vigente em seis províncias desde a última segunda-feira (20): Cotopaxi, Imbabura, Tungurahua, Chimborazo, Pastaza e Pichincha, onde está localizada a capital Quito, que estava sob toque de recolher.
Embora tenha suspenso o estado de exceção, o presidente equatoriano declarou que as forças de segurança continuam autorizadas a usar a força “de maneira progressiva para reestabelecer a ordem e devolver a tranquilidade aos cidadãos”, declarou em transmissão televisiva na noite do último domingo (26).
A Aliança de Organizações de Direitos Humanos publicou uma nota acusando o Estado de cometer um massacre contra os povos indígenas e outros setores mobilizados.
“Repudiamos a forma irresponsável como o Executivo usou a figura de estado de exceção […] Rechaçamos a campanha de estigmatização promovida pelo governo de Guillermo Lasso”, escrevem.
O Papa Francisco também comentou a situação de violência no Equador no último domingo (26). “Acompanho com preocupação o que está acontecendo no Equador. Estou próximo desse povo e alento todas as partes a abandonar a violência e as posições extremas”, disse.
A Organização das Nações Unidas (ONU) defendeu um “diálogo urgente” entre governo e grevistas. O representante para a América do Sul do Escritório da Alta Comissária para os Direitos Humanos da ONU pediu que se investiguem de maneira “exaustiva” todas as mortes registradas durante a greve. “Os agentes do Estado devem atuar com apego irrestrito às normas internacionais de direitos humanos”, ressaltou Jan Jarab.
Lasso afirma que seu pacote representa um desembolso de cerca de US$ 600 milhões. Além da redução de 10 centavos no preço do diesel e da gasolina, o Executivo propõe subsídio a 50% do preço de fertilizantes a pequenos agricultores; o aumento de US$ 5 no Bônus de Desenvolvimento Humano que será pago a 1,5 milhão de famílias; o perdão de dívidas de até US$ 3 mil no Banco do Equador.
Na última semana, o governo também reuniu-se com empresários e ofereceu um crédito de US$ 20 milhões para amortecer os “prejuízos da greve”.
“Não insistiremos com quem não quer dialogar, mas também não podemos esperar para dar respostas que o povo equatoriano tanto espera. Assumimos diretamente o compromisso de resolver todos os pontos da agenda dos nossos irmãos indígenas e camponeses, com resultados reais”, disse.
A Coanie, que convocou a greve geral no dia 13 de junho, e outras duas federações indígenas assinaram um comunicado declarando que as medidas anunciadas são insuficientes e a mobilização permanece.
“Uma decisão sem garantias e que não se compadece com a situação de pobreza de milhões de famílias. O anúncio é insuficiente e insensível, no entanto demonstra que a luta do movimento indígena e outros setores sociais estão dando frutos”, publicam.
Com uma plataforma de dez pontos, a Conaie demanda a criação de empregos, a proibição da mineração em terras indígenas, combate à miséria, a retomada da política de subsídios aos combustíveis e a suspensão das privatizações.
Desde 2019, com a gestão do presidente Lenín Moreno, o Equador suspendeu uma política de subsídios aos combustíveis, vigente há mais de 20 anos, para adotar a paridade com preços internacionais — similar ao modelo aplicado pela Petrobras, no Brasil.
Ao mesmo tempo em que ressalta sua disposição em atender as demandas dos setores em greve, Lasso voltou a criminalizar os protestos. “Durante os últimos dias nosso país foi alvo de atos de barbárie e sabotagem, nenhum desses delitos ficará impune, todos que estiveram envolvidos serão levados à justiça. Para aqueles que buscam o caos, a violência e o terrorismo: toda a força da lei”, declarou.
As novas propostas do governo aparecem no mesmo momento em que a Assembleia Nacional discute uma proposta de destituição do presidente e pede explicações dos ministros de Defesa e do Interior sobre a atuação das forças de segurança na contenção da greve.
A bancada de oposição, liderada pela União pela Esperança (Unes), propôs o impeachment de Lasso por “grave crise política e comoção interna”. O texto foi discutido na última sexta-feira, após a intervenção de 71 parlamentares, a sessão foi suspensa e será retomada na próxima terça-feira (27). Para ser aprovada, a destituição deve contar com 92 votos entre os 137 parlamentares em duas rodadas de votação.
Já para a sessão desta segunda, está prevista uma sabatina com os ministros Patricio Carrillo (Interior) e Luis Lara (Defesa) sobre a ação dos militares no controle dos atos.
Na última semana, as forças armadas ocuparam a Casa de Cultura do Equador e universidades públicas, que costumavam ser pontos de encontro das organizações indígenas na cidade de Quito.
Edição: Thales Schmidt
Fonte: Brasil de Fato
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