A Frente Parlamentar da Agropecuária reúne 280 membros, 47% de todo Congresso Nacional, e tende a votar em bloco em pautas prejudiciais ao meio ambiente
O presidente Jair Bolsonaro (PL) segue consolidando sua base de apoio para o pleito que ocorrerá no próximo dia 30 de novembro e definirá o próximo presidente da República do Brasil. Na última quarta-feira (5/10), o atual mandatário recebeu o apoio oficial da bancada ruralista, que detém quase a metade das cadeiras no Congresso Nacional, com 47% das vagas e é representada pelo presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o deputado federal pelo Paraná, Sérgio Souza (MDB-PR).
Em 2018, a presidenta da FPA era Tereza Cristina, ex-ministra de Bolsonaro, eleita senadora em 2022. Foi a primeira vez que o colegiado da bancada anuncia apoio formal a Bolsonaro, ainda no primeiro turno. A então deputada federal acabou sendo escolhida para comandar o Ministério da Agricultura após a vitória do atual presidente. Tereza Cristina chegou a ser cogitada para concorrer como vice na chapa de Bolsonaro em 2022, espaço que por fim foi ocupado pelo general de reserva Walter Braga Netto.
“É muito claro o resultado do que aconteceu e acontece no Brasil nos últimos anos. O agro não parou nem na pandemia. O agro é o grande pilar de sustentação deste país e tem responsabilidade com o desenvolvimento, com a geração de emprego e renda, com a segurança jurídica e, principalmente, com o direito à propriedade”, afirmou Souza à imprensa no Palácio da Alvorada, após reunião com Bolsonaro.
Ao tomar posse para o comando da FPA em fevereiro de 2021, Souza deixou claro quais seriam as prioridades da Frente: flexibilizar o licenciamento ambiental, aprovar a lei de regularização fundiária, aprovar um marco de liberação de novos agrotóxicos e revisar os processos de demarcação de terras indígenas, com o intuito de flexibilizar o uso desses territórios para os modos de produção capitalista.
Já Bolsonaro, em seu pronunciamento oficial após a declaração de apoio da FPA, fez questão de questionar o suporte da ex-ministra do Meio Ambiente e deputada federal recém-eleita Marina Silva (REDE/SP) a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o segundo turno; “Qual xiita vai para o [Ministério do] Meio Ambiente? Inclusive, se você for ver o Lula quando aceitou o apoio da Marina [Silva], o acordo que foi feito, veja o que foi assinado no tocante ao meio ambiente e ao agronegócio. É só regularização. É só Estado, Estado, Estado. E nós sabemos que o bom Estado é aquele que praticamente não existe”, afirmou.
Bancada do boi
Embora a reunião de membros ligados à agropecuária para defesa de interesses políticos seja histórica no Brasil, foi entre 1987 e 1988 que um grupo de parlamentares deu os primeiros passos na defesa conjunta dos interesses políticos do setor. Durante a Constituinte, a Frente Ampla Ruralista trabalhou para obter uma legislação que pudesse assegurar, sobretudo, os direitos da propriedade privada. Como resultado, foi instaurado o texto Constitucional que garante a preservação dos direitos de propriedade rural em terras produtivas. Sua constituição oficial ocorreu em 1995 e hoje a FPA conta com um total de 280 membros.
O objetivo, de acordo com a página oficial da Frente é, “estimular a ampliação de políticas públicas para o desenvolvimento do agronegócio nacional”. Dentre as prioridades atuais estão a modernização da legislação trabalhista, fundiária e tributária, além da regulamentação da questão de terras indígenas e áreas quilombolas, a fim de garantir a segurança jurídica necessária à competitividade do setor.”
Embora seja pluripartidária e atue em conjunto apenas em pautas específicas, a bancada ruralista é fundamental para as pautas ambientais. É a favor de medidas como as presentes no chamado pacote da destruição, que engloba uma série de Projetos de Lei, todos danosos ao meio ambiente, que os deputados da bancada ruralista tendem a apoiar e votar em bloco, reduzindo a chance de não aprovação, uma vez que representam quase a metade de todo Congresso.
De acordo com levantamento feito pelo observatório “De Olho nos Ruralistas”, é possível identificar um núcleo duro de 52 parlamentares da bancada ruralista que, através de articulações políticas e com diferentes setores do empresariado, conseguiram manter o poder no Congresso.
Ainda de acordo com o levantamento, este núcleo é formado majoritariamente por membros de partidos da base aliada ao governo de Jair Bolsonaro, destacando-se PL (14 integrantes), PP (12), MDB (8) e PSD (6) e a ação parlamentar de líderes ruralistas têm como função beneficiar um conjunto específico de empresas como as sucro energéticas Cosan, FS Bioenergia, Zilor, BSBios; os frigoríficos JBS e BRF; as fabricantes de agrotóxicos Syngenta e Mitsui e as cooperativas Coamo e Cooxupé.
Barões do agro
O documento também aponta que Tereza Cristina recebeu doações de campanha de Pedro de Camargo Neto, ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB); Mario Sergio Cutait, conselheiro do Sindirações; e Maria Tereza Zahran, a Tete Zahran, diretora da Famasul é integrante da família proprietária da TV Morena e TVCA, retransmissoras da Rede Globo em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A ex-ministra também recebeu financiamento de Rubens Ometto, dono da Cosan, conhecido como o “Barão da Cosan” – que segundo a Forbes tem um patrimônio de 46 bilhões de reais, a quem concedeu acesso privilegiado ao governo bolsonarista.
Para os candidatos eleitos ao Congresso em 2022 que têm a pauta ambiental entre as suas prioridades, o enfrentamento à bancada ruralista é citado como prioritário. É o caso de Sônia Guajajara (PSOL/SP) , que afirma que o seu principal trabalho será o de atrapalhar as movimentações ruralista e Guilherme Boulos (PSOL/SP), deputado federal mais votado pelos paulistas e que afirma ser necessário que, a partir de 2023, seja estabelecida a maior bancada progressista da história, como forma de buscar ao menos arrefecer o poder e os desmandos ambientais da bancada ruralista.
A pata do boi e a fome
Uma das queixas dos setores sociais contra as políticas defendidas pela bancada ruralista é a falta de repartição de privilégios. Mesmo batendo recordes de exportações, saldo positivo na balança comercial e um rebanho de 224 milhões de cabeças de gado – uma para cada brasileiro, o país voltou ao mapa da fome em 2021, segundo pesquisa da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN), executada em campo pelo Instituto Vox Populi, contratada pelas organizações Oxfam Brasil, Ação da Cidadania, ActionAid Brasil, Fundação Friedrich Ebert Brasil, Ibirapitanga e Sesc São Paulo.
Hoje, 33,1 milhões de pessoas, 13% da população, sofrem com a falta crônica de alimentos, ou seja, um em cada dez brasileiros pode morrer de fome – principalmente mulheres negras e crianças. Mais da metade da população (58,7%) passa por insegurança alimentar, com famílias que vão ao mercado e voltam sem a compra completa. Os dados são do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil.
Com o apoio declarado da bancada ruralista à Bolsonaro, mudar esses dados certamente será uma tarefa mais árdua se o atual presidente for reeleito.
Fonte: O Eco
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