Conselho de Reitores divulgou um comunicado sobre medida provisória que estabelece novas regras para a aplicação dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT)
Por – Jornal da USP
Ciência brasileira
Na última segunda-feira, dia 29 de agosto, uma edição extra do Diário Oficial da União trouxe, na forma da Medida Provisória nº 1.136 de 2022, um duríssimo golpe para a ciência brasileira. A MP retira a proibição do contingenciamento de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), estabelecida pela Lei Complementar 177, aprovada em 2021, pelo Congresso Nacional. O FNDCT tem como objetivo financiar a inovação e projetos ou programas científicos e tecnológicos, com vistas ao desenvolvimento socioeconômico do País.
Sob uma justificativa questionável de obediência ao regramento e às restrições fiscais vigentes – tendo em vista a destinação de grandes quantias para finalidades com pouca transparência – a MP contraria a Constituição Federal que, no seu art. 218, assegura que o Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação.
A MP vai além e estabelece uma sequência de limites que contingenciam o uso dos recursos do fundo nos próximos quatro anos a porcentuais que variam de 58%, em 2023, a 88%, em 2026, dos valores globais a serem aprovados para as próximas leis orçamentárias anuais. O desbloqueio integral do FNDCT só ocorreria em 2027.
De acordo com a nota conjunta assinada por entidades representativas da comunidade científica brasileira, como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Academia Brasileira de Ciências, a MP autoriza a liberação de R$ 5,5 bilhões para o exercício de 2022. Deste valor, metade já está destinado para as operações de empréstimos da Finep, instância vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações e que faz a gestão administrativa e financeira do fundo.
A outra metade já foi liquidada e paga. Outros valores empenhados para a área não serão mais honrados em 2022, postergando ou simplesmente interrompendo dezenas de ações planejadas no âmbito da ciência, tecnologia e inovação do Brasil.
Nós, dirigentes das três Universidades Estaduais Paulistas, guiados por valores acadêmicos, humanísticos e civilizatórios, nos indignamos frente à oficialização de práticas que corrompem o espírito da vida pública, oneram o erário e punem a sociedade com ações não republicanas. O bloqueio de verbas para setores estratégicos, como é o caso da Ciência, Tecnologia e Inovação, atenta diretamente contra a educação de toda a sociedade brasileira e compromete negativamente a formação de novas gerações de profissionais de altíssima qualificação técnica.
Esperamos que a MP seja devolvida. Tanto o Senado quanto o Congresso Nacional não podem aceitar um retrocesso que tornará inviável o cumprimento da finalidade legal do FNDCT, uma iniciativa importante e amadurecida por décadas. O fundo tem em sua gênese o ideal de construção de uma nação soberana e próspera, alicerçada no desenvolvimento da Ciência e Tecnologia.
Este nobre objetivo deveria estar sendo exaltado, e não destruído, às vésperas das celebrações do bicentenário da Independência. Para o Brasil crescer e se desenvolver, tal qual expresso em nossa Constituição Cidadã de 1988, é necessária uma visão de mundo ancorada na busca e na valorização do conhecimento.
São Paulo, 31 de agosto de 2022.
Antonio José de Almeida Meirelles (presidente do Cruesp)
Reitor da Unicamp
Pasqual Barretti
Reitor da Unesp
Carlos Gilberto Carlotti Junior
Reitor da USP
Texto publicado originalmente em Jornal da USP
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