Por Rodrigo de Oliveira Andrade
O matemático Marco Antonio Raupp morreu aos 83 anos de idade, em São José dos Campos (SP), dia 24 de julho, por insuficiência respiratória aguda, decorrente, segundo familiares, de um tumor cerebral. Ministro da Ciência e Tecnologia (MCT, agora MCTI) entre 2012 e 2014, Raupp é lembrado por sua capacidade de gestão e formulação de políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação (CT&I). “Ele se interessava em pensar os problemas da CT&I brasileira e em desenhar soluções inovadoras para que ela pudesse se consolidar”, destaca a bioquímica Helena Nader, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e vice do matemático à época em que ele presidiu a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), entre 2007 e 2011.
Nascido em Cachoeira do Sul, no Rio Grande do Sul, em 1938, Raupp graduou-se em física na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e fez o doutorado em matemática na Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, em 1971. Iniciou a carreira de docente como professor na Universidade de Brasília (UnB). Em fins de 1985, assumiu a direção do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) – em sua gestão, criou o Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos e o Laboratório de Integração de Testes.
“Raupp foi um dos principais responsáveis pela articulação de um acordo de cooperação entre o Inpe e a Academia Chinesa de Tecnologia Espacial”, conta o engenheiro mecânico Petrônio Noronha de Souza, tecnologista do Inpe e ex-diretor de Política Espacial e Investimentos Estratégicos da Agência Espacial Brasileira (AEB). O acordo resultou no Programa Sino-Brasileiro de Satélites de Recurso Terrestre (CBERS), responsável, desde os anos 1980, pelo desenvolvimento de seis satélites de sensoriamento remoto.
Raupp deixou o Inpe em 1989, após desavenças envolvendo o Satélite de Coleta de Dados 1 (SCD-1), que seria lançado quatro anos mais tarde. Em 1990, ele assumiu a direção do recém-criado Instituto Politécnico do Rio de Janeiro da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Voltou para São Paulo em 1994, após obter o título de livre-docência na Universidade de São Paulo (USP), na qual foi professor associado no Instituto de Matemática e Estatística. Em 2001, assumiu a direção do Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC). “Raupp já havia sido um dos responsáveis pela criação do LNCC na década de 1980 e pela institucionalização da matemática aplicada no Brasil”, comenta Ana Tereza de Vasconcelos, pesquisadora do Laboratório de Bioinformática do LNCC. “Como diretor da instituição, trabalhou para congregar pesquisadores de diferentes ramos da física e da matemática em torno de pesquisas aplicadas.”
O matemático também se destacou como entusiasta da ideia de aproximar o setor produtivo da atividade acadêmica e foi um dos idealizadores do Parque Tecnológico São José dos Campos (PqTec), do qual foi diretor-geral entre 2006 e 2011. “Apesar de sua forte atuação na esfera pública, Raupp sempre foi muito sensível às necessidades do setor privado e, principalmente, à importância de aproximá-lo das instituições de ensino e pesquisa”, comenta Souza. Raupp assumiu a presidência da SBPC na mesma época em que era diretor do PqTec. “Ele era muito hábil politicamente e sempre conseguiu se manter no nível estratégico em algumas das principais instituições de pesquisa do país, atuando como um grande empreendedor público.”
O neurocientista Luiz Eugênio Mello, diretor científico da FAPESP, testemunhou a capacidade de articulação de Raupp. “Considero-o, junto com outros colegas, um dos responsáveis pela criação do campus da Unifesp [Universidade Federal de São Paulo] em São José dos Campos. Fomos juntos ao Ministério da Educação e, graças também ao aval do Raupp, então à frente do PqTec, saímos de uma reunião com o então diretor da Sesu [Secretaria da Educação Superior], Nelson Maculan, com as primeiras oito vagas de docentes aprovadas”, lembrou Mello, que, na época da criação desse campus era pró-reitor de Graduação da Unifesp. “Ele naturalmente se tornava um líder nas instituições em que atuava, talvez porque conseguisse contaminar seus colegas com esse desejo de transformar o Brasil em um polo de CT&I”, lembra Vasconcelos. “Pensava muito no futuro das instituições, sempre preocupado em como melhorá-las.”
Em 2011, Raupp deixou a SBPC para assumir a presidência da AEB, instituição à qual levou sua experiência em temas da política e tecnologia do espaço. Ele também integrou o Conselho Administrativo da Alcântara Cyclone Space, empresa pública binacional brasileira e ucraniana criada em 2006 e extinta em 2018. Em 2011, Raupp foi convidado pela então presidente Dilma Rousseff para assumir o MCT no lugar de Aloizio Mercadante. “Era uma questão de tempo até ele ser nomeado ministro”, comenta Vasconcelos. À época em que esteve à frente do ministério, Raupp se envolveu na formulação de empreendimentos de promoção do desenvolvimento de CT&I nas empresas, como a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii). “Ele transitava como poucos no Congresso Nacional, promovendo um diálogo direto e transparente com os parlamentares, quando da votação do orçamento, sobre a importância dessa área para o país”, complementa Luiz Elias, secretário-executivo do ministério à época em que Raupp este à frente da pasta.
“Raupp foi uma figura permanente no cenário de ciência, tecnologia e inovação do país nos últimos 35 anos”, afirmou Marco Antonio Zago, presidente da FAPESP. “Nas numerosas instituições que dirigiu, sua atuação foi sempre voltada para a busca de soluções de grandes problemas. Na direção do Inpe fortaleceu nossa autonomia na fabricação e testes de satélites e foi a grande liderança na criação do PqTec, modelo desse tipo de organização no país.”
Raupp deixa a esposa, Elisabeth Alves Mendonça, sete filhos (mais uma filha falecida) e 13 netos.
Fonte: Revista FAPESP
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