“Pessoas que tiveram que recorrer ao mesmo tipo de assistência médica que os pobres viram o que é a vida da maioria.”
Sérgio Abranches
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“O que a pandemia fez foi acentuar o crescimento da desigualdade que já estava associada à globalização recente, mas isso aumenta a consciência de que há um fosso que precisa ser eliminado. Pessoas que tiveram que recorrer ao mesmo tipo de assistência médica que os pobres viram o que é a vida da maioria. Ela também produziu uma solidão forçada, que não é por escolha individual. Com isso, interrompe o isolamento social voluntário e cria mais laços de solidariedade. Isso ajuda a espanar a polarização ideológica e deixar claro que nem tudo que a esquerda diz que se deve ter, como o gasto público em saúde, é mau. A pandemia torna a sociedade mais amigável a uma outra visão, de oposição a esses governos de extrema direita. Ela também chama atenção para que o isolacionismo não tem cabimento nessa situação. O governo brasileiro vinha memetizando os EUA e rejeitando tudo o que é chinês, e de repente tem que cooperar com a China na questão da vacina. Aí é uma dúvida, porque os partidos estão todos oligarquizados. Mesmo no Brasil, onde estamos supostamente com um comando ultraliberal na economia, ficou claro que o consenso pela austeridade sem limites se rompeu. E não é voltarmos ao Estado de bem-estar anterior, porque ele não responde mais à crise da rede de proteção social, que foi pensada para um tipo de trabalhador que está deixando de existir. A rede não alcança esse mundo da economia do conhecimento, que não tem o mesmo vínculo empregatício nem o mesmo horizonte de trabalho que tinha o trabalhador anterior. No Brasil, acho que o alarme ainda não soou suficientemente forte. Não há essa noção de que tem um inimigo da democracia que é comum a todos e que a ideia é restaurar as condições de competição democrática de ideias. Nos EUA, acho que há. A convenção do Partido Democrata mostrou a tentativa de uma coalizão ampla dentro do partido.”
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