Denis Minev
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“A Economia, como Ciência Social, não dispensa as ferramentas da Econometria, pelo contrário. Nela encontra os cânones metodológicos para demonstrar hipóteses dos fatos sociais ou de interesses do tecido social.
Estudo COVID-19 em Manaus – Evolução da Epidemia
Boletim 15 de maio de 2020. Planilha com óbitos por dia em Manaus a partir de 1o de abril até 14 de maio. Fonte: ARPEN/AM e informações de sepultamentos nos cemitérios de Manaus. Alguns dados ainda não disponíveis no site, obtidos diretamente. Análise e dados disponíveis em 15 de maio de 2020. Links para os boletins anteriores ao final do relatório (assim poderemos aferir a qualidade das estimativas ex-post).
Boletim Anterior – 9 de maio de 2020
Volume de Óbitos em Manaus
Até o boletim anterior, as médias reportadas de emissão de certidões de óbito eram em linha com as médias de enterros, com alta correlação (0,97). A partir daí, as médias começaram a divergir mais, com o número de enterros ultrapassando o de certidões de óbito. Creio que isso se deve principalmente ao prazo dado para emissão das certidões de óbito de 15 dias. Portanto a análise foi modificada para considerar enterros como a melhor fonte.
Temos o pico no dia 26 de abril com 167 enterros e a média móvel de 7 dias atinge seu pico no dia 29 de abril com 150 enterros médios por dia. A partir do pico, já tivemos uma redução no número de enterros acima do normal de 47%, em 14 dias, ou 4,4% ao dia. Essa seria a taxa mais alta de COVID que consegui identificar em todos os exemplos que li a respeito nos trabalhos do Imperial College London, no link.
Uma queda tão brusca, na limitada literatura consultada, indica uma grande queda no R0, a taxa de transmissão. Suspeito que Manaus não é dos melhores casos no mundo de isolamento social. As pessoas estão nitidamente nas ruas. Então qual o motivo de uma queda tão grande? A resposta seria um grau elevado de contaminação, o que faria com que uma parcela grande da população já estivesse imune. Uma queda no R0 tão grande (de 1,62 em 31 de março a 0,73 em 28 de abril) requer um grau de contaminação muito elevado.
Volume de Infecções
Se considerarmos que os óbitos de um dia foram infectados 3 semanas antes e que a taxa de mortalidade é de 0,38% dos infectados, é possível construir uma curva de infecção. Essa estimativa de 0,38% vem do Imperial College London para o Amazonas, considerando a idade média da população, se considerarmos o nível de atendimento de saúde de Manaus equivalente ao da China.
Neste caso (coluna F), o pico de infecções em Manaus cresceu até mais de 32 mil por dia no início de abril, iniciando então uma queda. Em 13 de maio, estimo 9,7 mil infecções ainda ocorrendo. Por este cálculo, até dia 13 de maio, temos cerca de 982 mil manauaras já infectados. Se considerarmos que o período em que é transmissível é entre o 5o e 14o dia de infecção, então devemos ter cerca de 121 mil pessoas transmitindo.
Possíveis fontes de erro
Estimativa de óbito de 0,38% dos que contraem COVID-19. Volume normal de óbitos em Manaus. Pode haver algum motivo que a média usada não é o normal. É possível que o volume de óbitos excedente seja por outras causas que não COVID. Por exemplo, por pessoas que precisaram de atendimento de UTI e não conseguiram devido à lotação. É possível que o volume de óbitos normais não aconteceria. Por exemplo, por menos acidentes de carro ou brigas em bares (que estão fechados). A comunicação com o interior também é um fator que pode influenciar.
É comum tratamento de saúde do interior em Manaus. Não está claro se há mais pessoas com COVID vindo a Manaus se tratar do que pessoas evitando vir a Manaus para tratamentos dada a epidemia na cidade. As estimativas futuras dependem da manutenção do status quo de distanciamento social Mudanças neste status quo podem mudar a taxa de transmissão. O estudo não leva em conta a possibilidade do % de óbitos sobre infectados ser menor no caso do sistema de saúde melhorar sua capacidade de tratamento ou ter mais leitos disponíveis. Por exemplo, se os protocolos de tratamento avançarem, a mortalidade tende a cair. Estima-se 0,7% de óbitos independentemente do sistema de saúde.
Resultado I – Estudo do R0
R0 é a taxa média de transmissão de cada infectado. Utiliza-se como premissa que cada infectado é transmissível entre o 5 e 14 dias desde sua infecção.Este número está calculado na coluna O da planilha.
A taxa cai de 1,53 em 31 de março para 0,63 em 13 de abril, depois volta a subir até 0,77 em 28 de abril. O motivo na queda de óbitos é que este número se manteve abaixo de 1. A queda de enterros tende a continuar caindo, mas não mais na mesma taxa que caiu nas últimas duas semanas.
Resultado II – Estimativa do volume de óbitos acima do normal
Considerando a média dos primeiros 3 meses do ano de enterros (28,4 por dia), até 13 de maio tivemos 2.755 óbitos acima do normal. Dada a taxa atual de queda, estimo ainda mais 1.016 óbitos acima do normal até 3 de junho.
Resultado III – Imunidade Populacional
A imunidade populacional depende do R0 e da IFR (infection fatality rate). No primeiro estudo utilizei 1%. Neste utilizei uma estimativa do Imperial College London que considera a idade da população do Amazonas e a qualidade do atendimento hospitalar semelhante à China. Creio que são boas premissas para Manaus. A nova IFR é de 0,38%, ou seja, uma em cada 263 pessoas que se infectam vem a óbito.
Estimo hoje 982 mil infectados, ou 45% da população de Manaus.Com R0 (calculado no mundo) de cerca de 3, o volume de pessoas infectadas para chegar a imunidade populacional seria atingida quando chegarmos a 67% de infectados. Tristemente, suspeito que Manaus talvez seja a primeira cidade no mundo a chegar ao herd immunity.
O estudo foi feito por Denis Minev. Obtive comentários e contribuições de várias pessoas (Marcelo Lima Filho, Luciana Minev, Adele Benzaken, Tamar Koosed, Mario Adolfo Filho, Jório Veiga e Bruce Nelson) a quem agradeço; os erros são todos meus. Agradeço também a Prof Kristin Sainani, minha professora nos cursos de Medical Statistics I, II e III em Stanford, de onde parte desta metodologia é extraída. Mais informações.
Agradeço comentários / correções para: [email protected]
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