Há um equívoco crasso – lógico e epistemológico – nos fundamentos do pragmatismo apressado do presidente do Brasil que, recentemente, determinou a remoção dos cursos de Sociologia e Filosofia da Escola Pública. É engraçado demitir docentes dessas disciplinas se o próprio presidente da República escolheu um filósofo pra chamar de seu. Diz abertamente que tem um guru que orienta seu pensamento e de seus filhos. É bem verdade que a comunidade pensante não reconhece sua pretensão. O alto mandatário instruiu seu ministro da Educação a encerrar o apoio aos cursos de Ciências Humanas – Filosofia e Sociologia – alegando que a Educação deve servir para ensinar “leitura, escrita e a fazer conta e depois um ofício que gere renda para a pessoa”. Ou seja, não precisa pensar, apenas ler, escrever e trabalhar. Preferencialmente, portanto, sem reclamar.
A medida permite supor que o pensamento crítico passa a ser considerado uma ameaça à ordem pública, à moral e aos bons costumes. De quem? Ruídos da nova corte sugerem que a medida busca deter as ideologias de esquerda, aquelas que foram satanizadas em toda sua campanha, como sendo os enviados das forças do mal. Opor-se a elas significa definir-se como arautos das forças do bem, reinaugurando a ideologia do “Nós contra eles” que tantos estragos tem causado ao país e suas relações com a com a comunidade internacional.
O mundo não se resume à direita ou à esquerda, ambas são ideologias que nominam posturas políticas de gestão da coisa pública. Ideal seria ao poder constituído promover o debate Brasil a partir das diferentes correntes de pensamento. A diversidade de ideias enriquece e esclarece consciências. Não podemos perder a clareza do que são as ideologias? O que são aparelhos ideológicos do Estado? A serviço de quem operam as ideologias? Essas são as questões com que trabalham os filósofos e sociólogos do mundo todo, ao longo da história do pensamento crítico da Humanidade. Desestimular este pensamento significa criar manadas humanas, acéfalas e dóceis à vontade do Rei. A quem agrada tudo isso além de sua majestade e seus vassalos?
Precisamos de pensadores, que vejam além das aparências, fora da caixa e do cabresto, posto que as aparências são enganosas desde Platão, quando ilustrou, no Mito das Cavernas, que as sombras retratadas em seu interior, projetando os corpos de quem vivia de costas para a Luz da entrada. Eram apenas sombras e sombras são sombras, realidades são realidades. Por isso, é mandatório ver além das aparências, ou, do que os pensadores chamam de ideologias, o discurso de falsificação da realidade.
Cogito, ergo sum. Penso, logo existo, deduziu Descartes, um filósofo, físico e matemático, dando uma reviravolta nas tentativas autoritárias de anulação da razão. E se eu não penso, eu não sou, não aconteço, nem precisa que ninguém me ouça nem me dê importância. Contrapondo-se a ele, outros pensadores criaram o empirismo, retomando a discussão histórica sobre onde se assenta a verdade, na razão ou na experiência? Precisamos pensar para poder afirmar com fundamento e rigor a dignidade das pessoas e de seus Direitos. Elas não pertencem nem devem ser enquadradas na demagogia da esquerda ou da direita. Esse discurso ambíguo de retaliação do pensamento crítico confunde Demagogia com Democracia. O governo em nome do povo jamais poderá ser confundido com a manipulação de consciência da população. As mudanças em direção a uma civilização próspera e esclarecida não ocorrem com a supressão do pensamento crítico. Pelo contrário. Uma sociedade consciente não troca votos por vantagens mas governa com seus governantes, com transparência e interatividade, sob o critério cívico da verdade, jamais da manipulação e discriminação. Para além do bem e do mal, como meditou o grande pensador Friedrich Nietzsche, contra esse maniqueísmo ideológico que nos separa e destrói.
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