Foto: Bruno Zanardo
Por Augusto César B. Rocha
Há solução para a arrecadação tributária do Amazonas fora da Zona Franca de Manaus (ZFM)? Ou a ZFM é uma ilusão? Será a ZFM uma ilusão ou uma solução? Estas inquietações permeiam muitas reflexões entre diferentes correntes de intelectuais do Amazonas. Por exemplo, o Alfredo Lopes exalta a importância dos pioneiros para a sua viabilidade e futuro, o Antônio Botelho destaca as Amazonidades e sua preferência pelo capital local, Niomar Pimenta segue pelo mesmo diapasão, defendendo a presença de mais conhecimento para modificar o cenário e o Osíris Silva indica que sequer valorizamos nossa história e vocações. São diferentes visões, mas tenho a impressão que todas convergem para a necessidade de valorização das potencialidades da região.
Executivos do PIM também pensam assim. Há um excesso de valorização do exterior, como arguiu Paulo Said, em uma conversa comigo nesta semana ou ainda que “é hora de exercer o protagonismo”, afirmou Luiz Augusto Rocha, em entrevista dias antes. Entretanto, parece-me que a arrecadação e a riqueza proporcionada pela ZFM tem sido uma ilusão que nos afasta dos potenciais locais. É um fato que não damos atenção para nós mesmos e para as riquezas que aqui existem como riquezas para o presente. Até quando? Também nesta semana tive a oportunidade de ministrar aula para turma de Mestrado em Administração Global, da África do Sul, que optou por visitar com dois de seus professores, dois Estados brasileiros: São Paulo e Amazonas. Tive a incumbência de fornecer o olhar acadêmico sobre a nossa região. Além da experiência ímpar de ministrar aula em inglês, tive acesso ao pensamento acadêmico estrangeiro sobre nós, em um rico debate, logo após as minhas impressões.
É visível para o mundo o quanto não buscamos nossos potenciais. Tanto quanto nos intriga as razões que nos levam ao afastamento de nossas potencialidades, intriga mais ainda aos estrangeiros. Por que seguimos complicando o uso de recursos da região? Por que nos deixamos influenciar por pensamentos alienígenas ou forasteiros? Quem, além de nós, temos um mínimo domínio sobre Amazônia? Aliás, sequer nós temos amplo domínio sobre a região. A abundância de recursos, como impostos, empregos, tecnologias e multinacionais, têm causado uma perda de percepção da realidade em nossas lideranças executivas.
Não faz sentido não explorar o turismo. Como juntar-se com as empresas de aviação, por meio da IATA (Associação Internacional de Transporte Aéreo), para atrair rotas de turismo para cá? Por que não fazemos isso? Foi uma das perguntas intrigantes que me foram feitas. Como desenvolver ainda mais o Polo Digital de Manaus (uma iniciativa brilhante da sociedade civil)? O afastamento da realidade econômica com a realidade da natureza do Amazonas precisa ser resolvido. Deverá haver uma proximidade expressiva entre os dois. Nossos pescadores deveriam fazer parte de uma cadeia produtiva global, com alguma linha de proteção comercial para o pescado amazônico (evitando que a China se consolide como produtora de tambaqui, por exemplo). Deveria haver uma dúzia de projetos nesta direção. É preciso dar legitimidade e apoio para nossas potencialidades (ou Amazonidades).
Há futuro com a ZFM? Certamente, desde que paremos de enxergá-la como única alternativa. Há futuro sem a ZFM? Certamente, desde que comecemos a achar alternativas antes que ela desapareça. O processo de desaparecimento e encolhimento começou, o que será (provavelmente) visível com a fesPIM desta semana. Não é mais a FIAM, mas outra coisa, onde será pouco provável a geração de negócios em abundância, até porque não é este seu propósito. A ZFM é uma ilusão? Certamente, se for percebida como a única saída. Ela deveria ser percebida como uma plataforma que permitirá construir as nossas potencialidades locais. Enquanto ela for percebida como a única alternativa para Manaus e para o Amazonas, ela seguirá sendo uma ilusão que nos afasta das vocações e da criação de capital empreendedor local. Ela deve ser percebida como um colete salva-vidas ou um trampolim, enquanto construímos a riqueza real.
Para construir esta realidade diferente, deveremos ter a coragem de admitir a transitoriedade dos incentivos fiscais e não a sua eternidade. A Aldeia Global não permitirá uma continuidade de reduções tributárias. Christine Lagarde, na semana que passou, começou a enfrentar o conselho do Banco Central Europeu e empurrar para revisar a formulação de políticas. Quem de nossos líderes regionais está disposto a enfrentar a construção de uma agenda responsável para a região que considere a ZFM como um trampolim para as nossas verdadeiras potencialidades? Precisamos disso, sob a pena de uma ilusão nos deixar sem futuro.
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