Parece inacreditável, nesses tempos de banalização da barbárie, que um representante parlamentar da população leve a seus pares uma proposta de ‘beliscar’ R$ 300 milhões das verbas do FTI (Fundo de Fomento ao Turismo, Infraestrutura, Serviços e Interiorização do Desenvolvimento do Amazonas) para tapar o buraco da saúde deixado pelas contravenções habituais no trato desses recursos públicos. Desvio de finalidades com graves sequelas de supressão de benefícios.
Na investigação dessas mazelas, a Polícia Federal associa essas organizações criminosas à supressão de benefícios à população do Amazonas. Imagina faltar morfina aos doentes terminais do Hospital do Câncer. Foram vilipendiados recursos para atender necessidades médicas do cidadão que não tem condições de pagar plano de saúde. “Podemos dizer que esses investigados que se denominam donos do Estado, eram também donos da saúde das pessoas”, diz Alexandre Saraiva, superintendente da Polícia Federal no Amazonas. E o mais grave é a dificuldade de reaver a dinheirama, grande parte travada pelos penduricalhos jurídicos que dão liberdade aos gatunos e complicam o confisco do que foi desviado.
Consta na legislação dos incentivos fiscais, de 2003, em seu Art. 43-A, que o FTI tem por objetivo contribuir para o desenvolvimento socioeconômico do Estado, em consonância com o Plano Estadual de Desenvolvimento. Sua composição tem algumas origens, mas vale chamar a atenção para aquelas proveniente das contribuições de empresas industriais incentivadas, oriundas de decretos ou acordos firmados com o Governo do Estado. Com o passar dos tempos, permaneceram nesses 16 anos as fontes da Indústria e, de acordo com o parágrafo 2º “…os recursos do FTI serão aplicados em programas ou projetos de investimentos nas áreas de infraestrutura básica, econômica e social; interiorização do desenvolvimento, destinando-se 5% (cinco por cento) dos recursos do Fundo para o desenvolvimento e custeio das atividades de assistência técnica e extensão rural e florestal; comércio, esporte e turismo, inclusive na promoção e participação em eventos nacionais e internacionais; e ainda a divulgação do modelo econômico do Estado e atração de novos investimentos.
No parágrafo seguinte, a ironia: “§ 3º É vedada à aplicação dos recursos do FTI para outras finalidades que não as previstas neste artigo”. Diz ainda a Lei que “…a aplicação de recursos se dará em implantação de projetos industriais aprovados pelo Codam e considerados relevantes para o desenvolvimento do Estado, com os seguintes critérios: realização de investimento significativo em ativo fixo; contribuição para a consolidação de segmentos industriais já instalados no Estado; utilização de matéria-prima regional; substituição de importação de insumos do exterior e de outras unidades federadas; fabricação de produtos que introduzam inovação tecnológica no Estado.” O legislador abre mão de suas funções para aliviar a barra daqueles que distorceram a finalidade legal e o benefício social. O que dizem os guardiões da Lei do MPE e o MPF, órgãos responsáveis pelo acompanhamento rigoroso e cotidiano das funções e disfunções do Estatuto Legal? Deixar o interior entregue à própria sorte, ou ao principal empregador da mão-de-obra juvenil da geração nem-nem, nem estuda nem trabalha, o narcotráfico, significa cumplicidade indireta com os descaminhos, ou melhor, os maus caminhos da aplicação das verbas públicas. Aplicar os recursos do interior para tapar os buracos da contravenção metropolitana é desacato explícito à legislação e anuência negligente com a supressão dos legítimos direitos do cidadão, ou não?
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