No último sábado, os devotos de Iemanjá, em Salvador – onde se realiza a mais tradicional celebração da Rainha das Águas – foram estimulados pelo poder público e organizações privadas a fazer ofertas não predatórias na festa anual. Em lugar de objetos habituais, como pentes, espelhos, cestas e frascos de alfazema, entre outros, orações de louvor e gratidão, mais adequados ao ambiente marinho onde a venerável habita. A campanha foi agressiva e apresentou, segundo a imprensa baiana, excelentes resultados. É a consciência planetária que avança num contexto dramático que contabiliza mais de 12 bilhões de toneladas/ano de plástico no ambiente marinho, especialmente trazidas pelos rios. Assim continuando, em 2050, haverá mais plástico do que peixe nas águas e, muitos deles, mortos e/ou contaminados por plásticos.
Bem perto de nós, em Manaus, no Igarapé do Mindu, entre outros caudatários do Rio Negro, a situação é dramática. Projetos, como o Prosamim, de urbanização sustentável, não se fizeram acompanhar de campanhas educacionais agressivas, a partir das escolas e associações comunitárias. E o resultado é continuidade da depredação progressiva das Águas que cortam Manaus. Nos portos regionais em frente da cidade, é lastimável a poluição, sobretudo dos plásticos. Isso fragiliza a reputação de nossa economia. O lixo segue sem coletas seletivas de monta e os lixões ainda padecem de ordenamento e com utilização zero de seu potencial energético. Temos a maior reserva hídrica potável do planeta mas nosso desempenho na cultura da sustentabilidade ainda é desastroso. As verbas publicitárias são de apologia política não de educação cívica e socioambiental. É preciso mudar.
Algumas empresas do Polo Industrial de Manaus estão procurando alternativas do plástico verde, que consiga enfrentar a concorrência chinesa e a performance predatória do plástico usual, num segmento que já empregou 14 mil trabalhadores e hoje recuou para menos de 6 mil. Uma legislação de 1976 estimula, com vantagens fiscais, a empresa que agregar insumos da biodiversidade, produzidos sustentavelmente, na produção de plástico biodegradável. A Embrapa de São Carlos-SP já produz embalagens de “plástico” comestíveis. O canudo predatório de refrigerantes já tem sucedâneo sustentável e as sacolas retornáveis, preferencialmente de retalhos, bem poderiam virar bandeira de iniciativa popular. Vamos encarar? Damos meia volta e esbarramos, sempre, no papel transformador da Educação, a começar pelos pais, em casa, desde o berço. O planeta, não esqueçamos, é a nossa casa comum.
Dos 20 bilhões de toneladas de lixo gerado pelo consumo predatório, 10% é plástico, do qual apenas 9% é reciclado, segundo a ONU, e 40% foi usado uma única vez e em seguida descartado. A bagatela de 12 milhões de toneladas de plástico depositadas no mar causa a morte de 100 mil animais marinhos todos os anos. São 700 espécies de animais, algumas ameaçadas de extinção que padecem a destruição da violência plástica. O que fazer senão apostar na consciência planetária das crianças, a ponto de que elas estimulem seus pais a mudar de atitudes. À Indústria de Manaus é atribuído um papel de proteção florestal. Um ativo, a rigor, involuntário, do qual nos orgulhamos sem as devidas atitudes, entretanto, as entidades que a representam poderiam exigir uma pauta de qualificação técnica de todos os alunos da Universidade do Estado do Amazonas, a quem financia integralmente, reforçando atitudes em todas as profissões com os requisitos climáticos e ambientais no currículo de formação geral. Afinal, nossa contrapartida fiscal, além dos milhões de empregos pelo país afora, os serviços ambientais para o clima, passa por um desempenho socioambiental singular, ou seja, um modo de produzir numa equação que não separa economia de ecologia. Em outros palavras, em tempos de ameaças liberais, é inteligente pensar em precificar esse modo especial de produção, seus benefícios climáticos e sua contribuição efetiva para a construção da civilização tropical sustentável a partir da Amazônia.
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