Os livros de Geografia e História adotados nas escolas do Sudeste e Sul do país – regiões que concentram e de onde emana o poder da grana que “…ergue e destrói coisas belas” – seguem formando consciências equivocadas e indiferentes, desplugadas, em relação à Amazônia. As políticas públicas formuladas por essas consciências, baseadas em achismos perversos, desconsideram a formação histórica, o patrimônio natural, cultural e os acervos de soluções para os enigmas crônicos da brasilidade. Ainda se defende a intocabilidade da floresta nas discussões da academia paulista quando se fala em sustentabilidade na Amazônia, não como indicativo de base científica de benefícios para a humanidade, mas como confirmação do superficialismo com que tratam o assunto. Perdura na consciência do país o mito de “intruso impertinente” para quem queira mergulhar na Amazônia, sugerido por Euclides da Cunha, há 100 anos, o repórter paulista que escreveu “Os Sertões”. Ele descreve a Amazônia como um ambiente bárbaro, estranho, despido de civilidade e urbanidade. Com Alberto Rangel, promoveu a representação de inferno verde ou de paraíso perdido, onde habita o “bom selvagem”, que deu base ao liberalismo francês de Jean-Jaques Rousseau. Nem a revolução digital da comunicação modificou substantivamente este engodo.
Há 15 anos, uma exposição do Museu Britânico, “Unknow Amazon”, Amazônia Desconhecida, desconectada da investigação nacional, trouxe ao mundo pesquisas arqueológicas no Pará com cerâmicas pré-coloniais desenterradas, sobretudo na ilha de Marajó e na região de Santarém, fabricadas por sociedades complexas, mais sofisticadas que as civilizações andinas ou caribenhas, um passado indígena, destruído pela violência da conquista dos europeus e até escondidas pelos livros didáticos do Brasil. Os achados arqueológicos nas cercanias de Manaus, 300 urnas funerárias, com peças da cerâmica Paredão, há 15 anos, curiosamente na mesma semana de abertura da exposição britânica, mostram como as civilizações do Rio Negro viviam, pensavam, se relacionava com a natureza e sequer nos perguntamos como e porque elas se extinguiram, ou a relevância de resgatá-las. As peças estão arquivadas na Arqueologia da Universidade de São Paulo. Assim, perdura na literatura didática a groselha histórica segundo a qual as únicas civilizações americanas de realce são astecas, maias e incaicas.
O que ganharia o país e os ocupantes desta região ignota que – considerando as dimensões da Amazônia Legal – representa 2/3 de seu território e uma dimensão similar de ignorância nacional a seu respeito, se fosse a Amazônia o objeto de desejo, e de pesquisas que norteassem um desenvolvimento harmônico, sustentável e integrado ao país? Por que não integrar a arqueologia com os esforços dos bio-empreendedores na linha de sobreviver, consolidar e expandir as intuições e premonições de um novo paradigma civilizatório? Fármacos, cosméticos, nutracêuticos, um caminho traçado por Bertha Becker, uma trajetória com meio século de presença pesquisa a favor de “estabelecimentos produtivos”, a única maneira de evitar a abordagem predatória.
Ela insistiu no projeto da indústria da juventude, a dermocosmética, que a humanidade procura, com visão harmoniosa entre mercado e meio ambiente. Becker chegou a traçar a referência geográfica de sua intuição, mostrando as vocações regionais e a presença da pesquisa que a universidade poderia amparar e desenvolver. Uma indústria de base biomolecular convivendo com a indústria tradicional de transformação, base do emprego, renda e tributos que hoje dão suporte material e proteção florestal.
Essa indústria vive inquieta, porque vê reduzida, ano a ano, sua participação no PIB brasileiro, enquanto o Paraguai arrebata as empresas do Brasil, combalidas pela crise. Alguns consideram natural o processo de desindustrialização, enquanto outros, argumentam – à parte da crise de credibilidade em torno dos atores políticos – um processo natural de desenvolvimento da economia brasileira, que padece de política industrial e de um olhar inteligente para a nova e biótica economia que surge da floresta, sustentável, alegre e sobretudo ética, porque permite ao Brasil cumprir seus compromissos com o clima é com a qualidade de vida de seus cidadãos da floresta, já!
alfredo.lopes@uol.com.br
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