Maradona sin Argentina y Argentina sin Maradona

“Maradona está sin Argentina, pois ele está morto e vai estar a partir de agora nas mentes e corações dos argentinos. Pero, la Argentina está sin Maradona, y probablemente sufrirá mucho más. No llores Argentina!!! Só nos resta dançar um tango sem Maradona”.

Farid Mendonça Junior
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Farid Mendonça Junior é advogado, economista e administrador.

Como é bom o passado! Ele é sempre melhor que o presente e o futuro. O passado representa o bem estar, a fartura, o progresso, a ausência de corrupção, as melhores músicas, os melhores romances, a família, o conservadorismo, enfim, a nostalgia.
Isso é o que muitos pensam! Não só pessoas, mas, infelizmente, países!

Assim foi com a Argentina, que de fato chegou a figurar entre as principais economias da América Latina, com uma das melhores qualidades de vida entre os países. Isso foi há bastante tempo, principalmente no final do século XIX e começo do XX.

“No início do século XX, a Argentina era o 10º país mais rico do mundo em termos per capita. Reza a lenda que, naquela época, a expressão “tão rico quanto um argentino” era comum e frequentemente utilizada por aristocratas britânicos que tentavam casar suas filhas com argentinos ricos”.

A Argentina era o país que mais atraía investimentos na América do Sul e naquela época possuía uma infraestrutura invejável para os padrões da época. Recebia muitos investimentos da Inglaterra, muito mais que o Brasil.

Nutria em relação ao Brasil, e vice-versa, um clima de grande disputa, mas não era por causa de futebol. Estamos no século XIX e o interesse era o controle da Bacia do Prata. Quem tivesse o controle desta importante bacia estaria estrategicamente bem posicionado para fins comerciais, mas, sobretudo, militares.

A Argentina é um sonho que não deu certo, até agora. Começou como aquele cavalo de corrida com a expectativa altíssima, haja vista ter começado numa situação mais privilegiada que os demais países da América do Sul, principalmente devido ao seu estreito relacionamento com os ingleses.

Mas, pouco a pouco o país foi se perdendo e vendendo seus sonhos para ilusões travestidas em forma de políticos populistas e um conjunto de memórias de passados ‘ditos’ gloriosos.

Se você conversar principalmente com pessoas mais idosas, a tendência é achar que tudo no passado era melhor ou dava certo. Vide por exemplo o caso do Brasil. “Ah, meu filho, no tempo dos militares não tinham estas coisas. A corrupção não era assim. A educação funcionava”.

Um exemplo mais local. Quando eu atuava como Secretário de Relações Internacionais pelo Estado do Amazonas, escutava de muitos empresários como era boa a época da Zona Franca em sua fase mais comercial, em que as pessoas de diversas partes do Brasil vinham até Manaus para comprar vídeo cassete, toca fitas, entre outras coisas. E nas reuniões ainda exclamavam: “o Estado deveria resgatar isso. Adotar uma política para atrair as pessoas até Manaus para comprar os produtos fabricados aqui”. Ãhhhmmm? Naturalmente eu ficava mais calado. Mas a vontade era perguntar: Sr., você já escutou falar em globalização, cadeias globais, logística? Entre outras coisas. Mas pensava logo que isso não ia adiantar, afinal a nostalgia e a crença de que tudo no passado era melhor era uma espécie de dogma.

Assim é a Argentina também, mas num grau ainda mais profundo! Para aqueles que já tiveram a oportunidade de visitar o país e conversar com os autóctones de lá, poderá comprovar o que estou a falar.

Já estive no país por 3 vezes, e em todas sempre costumo cutucar as pessoas. Pergunto: “¿Cómo está la situación económica del país? La crisis?”. Geralmente o comerciante me devolve: ¿De qué crisis estás hablando? Sí, porque aquí en Argentina llevamos más de 30 años en crisis.

E assim segue vivendo a Argentina, de crise em crise, definhando cada vez mais conforme a história passa. E pior, cultuando líderes e memórias que insistem em fazer o país viver no passado, cultuando a dor do “passado glorioso”.

José de San Martín (libertador da Argentina), Juan Domingo Perón (político), Eva Perón (A Evita, política), Che Guevara (o revolucionário), Carlos Gardel (cantor de tango), e o mais recente é o Maradona, entrando para a lista.

Antes de chegar no Maradona, é importante falar um pouco de política. E evidente que é inevitável falar de Juan Domingo Perón, que se consolidou como o grande líder da Argentina, como uma espécie de pai dos pobres e sua esposa Evita, a mãe. Algo bem típico de republiquetas da América do Sul que ainda insistem nesta história até os dias de hoje (seja de esquerda ou de direita). Perón foi tão importante para o povo da Argentina que depois dele só existe praticamente o peronismo como corrente política na Argentina e todos os argentinos são como uma espécie de órfãos de Perón, como se naquela época Perón não tivesse tido oposição (e como teve, inclusive dos militares). Resultado: todos os partidos e políticos praticamente se dizem peronistas, não importam se são de direita, de esquerda ou de centro. O importante lá é dizer para o povo que você respeita as ideias e a memória de Perón, grandes m…, ops, coisas.

E o Maradona? Este foi um gênio da bola, indiscutivelmente. E parece que estava no momento e na hora certa na história da Argentina. Um exemplo disso foi aquela jogada genial que empolga qualquer um ao rever o lance, no jogo pelas quartas de final da Copa do Mundo do México, em 22 de junho de 1986, com o resultado de 2 x 1 para a Argentina. Ele saiu quase que do meio de campo, driblou uns três jogadores, o goleiro e fez o gol. Sensacional! Não é a toa que o cara foi aclamado como “Diós” em seu país.

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Foto: FIFA

O momento foi marcante para os argentinos devido principalmente à guerra das Malvinas ou Falklands ocorrida em junho de 1982, em que a Argentina reivindicou a soberania sobre a ilha mencionada e invadiu a mesma, tendo o Reino Unido reconquistado.
Maradona fez o povo argentino explodir de emoção, como se estivesse golpeando os colonizadores ingleses e dizendo: “nós somos melhores que vocês”. O que não deixa de ser irônico, pois foi exatamente a Inglaterra que ajudou a Argentina no século XIX em sua belle époque, como já dito. “Amizade, amizade, colonizações à parte”.

Enfim, o argentino médio com certeza vai dizer que 1982 era melhor que 1992, 2002, 2012 e provavelmente 2022 (o futuro, o que ainda não chegou).

Falando de economia, a Argentina resolveu se alinhar automaticamente às ideias liberais que invadiam o mundo na década de 1990, tanto é que o então Chanceler da Argentina, Guido Di Tella, chegou a caracterizar as relações entre a Argentina e os Estados Unidos como “relaciones carnales” (apesar de o próprio ex-Chanceler negar que tenha dito isso). O fato é que no governo Menén, na Argentina altamente liberal, só faltou ‘vender la madre’ e para a desgraça deste país, adotou a política desastrosa de dolarização da economia, ao equiparar a moeda argentina (os pesos argentinos) ao dólar, no 1 pra 1. A Argentina tornou-se depende monetariamente dos Estados Unidos. Como a Argentina é um país economicamente fraco, sentado em cima de algumas commodities, o resultado foi ao longo do tempo os pesados déficits no balanço de pagamentos em conta corrente, até que em 6 de janeiro de 1999 o sonho acabou, pois o governo argentino anunciou, para o desespero dos argentinos, o fim da paridade entre o peso e o dólar.

“Ao final de 2009, o PIB em dólares era praticamente o mesmo de 1998, o que significa que a economia levou 11 anos para voltar ao mesmo nível de onde estava durante a crise da Rússia”.

Apesar de tudo isto, ou seja, do melodrama da Argentina, os argentinos são maravilhosos, acolhedores como os latino americanos em geral, parecem italianos as vezes (falantes). A arquitetura principalmente de Buenos Aires é linda, muito semelhante a muitos prédios de Paris e seus Boulevards. Clima gostoso, comida boa, muita cultura (muitos museus maravilhosos). Até o passeio do Cemitério é enriquecedor. Mas, a crise, ahhh, a crise continua. A crise faz parte da Argentina. Assim como Peron, Evita, Carlos Gardel, Che Guevara, e o “Diós” Maradona. Desta vez, a mão de Maradona, “la mano de Diós”, não salvará a Argentina, nem de um jogo, e nem do sonho, ou melhor, pesadelo de crises e mais crises e de suas ilusões amorosas com o passado.

Maradona está sin Argentina, pois ele está morto e vai estar a partir de agora nas mentes e corações dos argentinos. Pero, la Argentina está sin Maradona, y probablemente sufrirá mucho más. No llores Argentina!!! Só nos resta dançar um tango sem Maradona!

Farid Mendonça Júnior
Farid Mendonça Júnior
Farid Mendonça é advogado, economista e administrador

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