“A verdadeira sabedoria reside na interconexão entre o ser humano e a natureza, onde o diálogo e a responsabilidade coletiva são essenciais para um futuro sustentável.”
Por Estevão Monteiro de Paula
_____________________________
Tiago, um jovem estudante de filosofia, sempre foi fascinado pela intersecção entre o pensamento humano e a complexidade do mundo natural. Com uma formação que abrange desde os clássicos como Platão e Kant até pensadores contemporâneos como Foucault e Žižek, ele desenvolveu uma base sólida que lhe permite questionar e refletir sobre as realidades sociais e ambientais que o cercam.
Sua paixão pela Amazônia, uma região rica em biodiversidade e cultura, o impulsiona a buscar respostas para os desafios que ela enfrenta. Ao se imaginar conversando com filósofos de diferentes épocas, Tiago se vê como um mediador de ideias, pronto para integrar suas reflexões filosóficas ao contexto amazônico, onde a luta pela preservação e a busca por justiça social se entrelaçam em um diálogo vital.
Parte I
“O Encontro de Pensamentos: Diálogos Filosóficos sobre o Destino da Amazônia”
A noite na Amazônia estava particularmente quieta. O jovem estudante de filosofia, Tiago, sentou-se à margem de um rio sereno, contemplando as águas escuras que refletiam as estrelas. Ele estava preocupado. A cada novo texto que lia sobre desenvolvimento e sustentabilidade, mais dúvidas surgiam em sua mente. Como equilibrar progresso e preservação? Como ouvir as vozes da floresta e ao mesmo tempo responder às demandas de uma sociedade globalizada?
Foi então que, inexplicavelmente, algo incomum aconteceu. Uma brisa suave e misteriosa atravessou a floresta, e diante de Tiago começaram a surgir figuras que ele reconheceu imediatamente dos livros de filosofia que tanto estudara. Immanuel Kant, Hegel, Sartre, Platão, e outros pensadores de eras diferentes materializaram-se diante dele, formando um círculo. O jovem, atônito, percebeu que eles estavam ali para responder à sua inquietação.
Kant foi o primeiro a falar, com sua voz calma e ponderada.
– Jovem Tiago, suas preocupações são legítimas. Para iniciar, acredito que as pesquisas na Amazônia devem ser guiadas pelas categorias do entendimento e pelas formas a priori de intuição. Devemos considerar como nossas percepções da floresta são moldadas por essas estruturas mentais. A pesquisa deve buscar compreender a Amazônia não apenas empiricamente, mas também como um fenômeno que se apresenta a nós através dessas categorias.
Hegel logo interveio, balançando a cabeça em concordância parcial.
– Concordo, Kant. No entanto, acrescento que o conhecimento da Amazônia deve evoluir dialeticamente. Devemos considerar as teses e antíteses presentes nas diferentes perspectivas – científica, indígena, econômica – e buscar uma síntese que integre essas visões em um entendimento mais completo e dinâmico. A história da floresta é uma dialética em constante movimento.
Sartre, sentado com os braços cruzados, olhou para Tiago de maneira penetrante.
– Interessante, Hegel, mas eu diria que a pesquisa na Amazônia deve enfatizar a liberdade e a responsabilidade individual. Cada pesquisador deve reconhecer sua liberdade de interpretar a floresta de maneira única, mas também sua responsabilidade ética em relação às implicações de suas descobertas e ações. A Amazônia não é apenas um objeto de estudo, mas um espaço onde a liberdade humana encontra seus limites.
Platão, que até então observava em silêncio, finalmente se pronunciou.
– Meus caros, acredito que devemos buscar o conhecimento das Formas. A verdadeira essência da Amazônia reside em uma realidade ideal e imutável, acessível apenas através da razão. As observações sensoriais são apenas sombras dessa realidade superior. Devemos, portanto, buscar compreender a floresta em sua forma ideal, o que vai além do que os sentidos nos oferecem.
Aristóteles, que não podia deixar de reagir às palavras de seu mestre, contrapôs com suavidade.
– Platão, valorizo sua perspectiva, mas acredito que a observação empírica é fundamental. Devemos estudar a Amazônia através da experiência direta e sistemática, analisando sua flora, fauna e ecossistemas para obter um entendimento profundo e prático. O conhecimento nasce da observação cuidadosa da natureza.
Enquanto Aristóteles falava, Heidegger ponderava com uma expressão grave.
– A relação entre o ser humano e a natureza é crucial. Devemos abordar a Amazônia como um ser que merece respeito e compreensão em sua própria essência. A pesquisa deve ir além da exploração e buscar uma conexão autêntica com a floresta, revelando o verdadeiro ser da natureza.
De repente, Yuval Noah Harari interveio com uma visão que ampliava o horizonte da discussão.
– Concordo com todos vocês, mas gostaria de trazer uma perspectiva histórica e futurista. Devemos considerar como o conhecimento da Amazônia se insere no contexto mais amplo do desenvolvimento humano e tecnológico. A preservação desse ecossistema é vital não apenas para o presente, mas para o futuro da humanidade e do planeta. A Amazônia pode ser a chave para nossa própria sobrevivência.
Tiago, maravilhado com a profundidade das discussões, olhou para cada um deles com respeito e fascinação. O debate continuou, com Spinoza, Foucault, Habermas, Edgar Morin, Žižek, Enrique Leff, e Yuk Hui contribuindo com suas visões filosóficas únicas sobre a relação entre o homem, a tecnologia, a natureza, e o poder na Amazônia.
Após ouvir atentamente as reflexões de filósofos de diferentes eras, Tiago estava imerso em um mar de pensamentos. Cada filósofo trouxera uma perspectiva única, e embora houvesse divergências claras, ele começava a perceber algumas conexões sutis entre as ideias. Tiago sabia que a questão sobre o desenvolvimento e a sustentabilidade da Amazônia era complexa e multifacetada, e sentiu-se privilegiado por ter tido essa chance de ouvir grandes mentes debaterem sobre o tema.
Tiago, ao refletir sobre as diversas perspectivas que ouviu, começou a articular suas conclusões de forma mais coesa, identificando tanto convergências quanto divergências nas ideias apresentadas. Ele percebeu que a Amazônia, com sua complexidade e riqueza natural, não pode ser compreendida de maneira superficial. Essa visão fragmentada é insuficiente, pois a floresta deve ser vista como um sistema interdependente, onde natureza e sociedade estão profundamente entrelaçadas. Essa interligação implica que abordagens sustentáveis devem considerar a Amazônia em sua totalidade, integrando elementos ecológicos, sociais, políticos e culturais.
Tiago também reconheceu a necessidade de redefinir o papel da tecnologia na região. Embora muitos filósofos concordassem que a tecnologia pode ser uma aliada na preservação da Amazônia, ele concluiu que sua aplicação deve ser feita com cuidado e respeito ao contexto cultural local. Essa abordagem deve evitar a imposição de modelos externos de progresso, que frequentemente desconsideram as tradições e o conhecimento indígena. Assim, o uso da tecnologia deve ser uma extensão das práticas locais, respeitando a sabedoria ancestral e promovendo um desenvolvimento que beneficie as comunidades da região.
A ideia de que a democracia é essencial para o futuro da floresta ressoou fortemente em Tiago. Ele percebeu que o desenvolvimento sustentável só seria alcançado por meio de um processo deliberativo inclusivo, onde todas as vozes fossem ouvidas. O diálogo contínuo entre os diversos stakeholders, incluindo comunidades locais, acadêmicos, ambientalistas e representantes do governo, é vital para garantir que as decisões reflitam uma ampla gama de interesses e valores. Essa participação democrática, segundo Tiago, é fundamental para que a Amazônia não seja vista apenas como um recurso a ser explorado, mas como um patrimônio coletivo que exige responsabilidade compartilhada.
Ao considerar as divergências entre os filósofos, Tiago se deparou com questões fundamentais sobre o papel da experiência sensorial em oposição ao conhecimento racional. A tensão entre idealismo e empirismo, exemplificada nas visões de Platão e Aristóteles, o levou a refletir sobre a importância de equilibrar a intuição e a observação prática na compreensão da Amazônia. Essa ambivalência destaca a necessidade de integrar diversas formas de conhecimento, permitindo uma visão mais holística que valorize tanto as experiências subjetivas quanto os dados objetivos.
Outra reflexão significativa surgiu da discussão sobre a liberdade individual e a responsabilidade coletiva. Enquanto Sartre enfatizou a importância das escolhas individuais, Tiago percebeu que o futuro da Amazônia também depende da construção de um sentido de coletividade. Essa interação entre o individual e o coletivo, conforme discutido por Habermas e Hegel, aponta para a necessidade de um diálogo que não apenas respeite a autonomia do indivíduo, mas que também reconheça a interdependência das comunidades e do meio ambiente.
Tiago ficou particularmente impactado pelas questões levantadas por Foucault e Žižek sobre o poder e a exploração. Ele entendeu que a Amazônia é um campo de disputa de poder, onde decisões sobre seu futuro são moldadas por interesses econômicos muitas vezes em conflito com as necessidades sociais e ambientais. Para ele, isso reforçou a importância de uma vigilância crítica em relação às narrativas que cercam o desenvolvimento na região, assegurando que a exploração não prevaleça sobre a justiça social e os direitos humanos.
Ao final do encontro, Tiago saiu ciente de que ainda havia muitas questões a serem exploradas e que a busca por respostas continuaria. No entanto, ele se sentiu fortalecido pela diversidade de ideias discutidas e pelo rico debate filosófico, o que o deixou mais preparado para enfrentar as complexidades do desenvolvimento e da sustentabilidade na Amazônia. Com uma base sólida de reflexões e um entendimento mais profundo das interconexões em jogo, Tiago se sentiu pronto para contribuir para um futuro mais justo e sustentável para esta parte vital do planeta.
Parte II
“Interrogando o Futuro: A Busca de Tiago por Respostas sobre a Amazônia”
Tiago, agora mais à vontade diante dos pensadores, resolve tomar a palavra. Após ouvir tantas perspectivas distintas, uma dúvida o incomodava.
“Vocês trouxeram pontos valiosos sobre a Amazônia, mas como reconciliar essas ideias na prática? Como integrar a racionalidade da ciência, o respeito à natureza e as necessidades de desenvolvimento econômico? Em especial, fico intrigado com a posição de Spinoza, que vê a Amazônia como uma manifestação divina, e a de Žižek, que sugere uma crítica às forças econômicas por trás da destruição ambiental. Como podemos conciliar essas visões?”
Enrique Leff, percebendo o dilema de Tiago, é o primeiro a responder:
“Tiago, sua dúvida é válida e necessária. O que vejo como fundamental é adotar uma racionalidade ambiental, uma forma de pensar que reconheça a interdependência entre natureza e sociedade. A Amazônia não pode ser tratada apenas como um recurso para o desenvolvimento econômico ou como um templo intocável. Precisamos de um diálogo de saberes, integrando o conhecimento científico com o tradicional, respeitando a cultura dos povos indígenas que habitam a floresta há milênios.”
Michel Foucault intervém, concordando parcialmente com Leff, mas oferecendo uma advertência:
“Leff, sua visão é ideal, mas não podemos ignorar as estruturas de poder que moldam essas relações. Tiago, para responder à sua pergunta, é crucial entender como o poder opera nas disputas pela Amazônia. Quem define o que é desenvolvimento? Quem se beneficia? É nesse ponto que a crítica de Žižek se torna pertinente. Precisamos desmascarar as forças econômicas e políticas que exploram a floresta e marginalizam seus habitantes.”
Jean-Paul Sartre, com um tom mais individualista, acrescenta:
“Foucault, concordo que o poder é uma questão central, mas não podemos esquecer que cada indivíduo é responsável por suas escolhas. Tiago, você perguntou sobre como conciliar essas visões. Eu acredito que, além das estruturas, a solução passa por reconhecer que cada pesquisador, político ou empresário tem liberdade para agir de forma ética. É uma questão de responsabilidade individual frente à Amazônia.”
Tiago, intrigado com a diversidade de opiniões, decide explorar a questão da tecnologia e da ciência, lembrando-se das palavras de Yuval Noah Harari.
“Harari, você falou sobre a importância do conhecimento da Amazônia no desenvolvimento humano e tecnológico. No entanto, como evitar que essa tecnologia se torne mais uma ferramenta de exploração e destruição da floresta? Existe um equilíbrio entre o progresso tecnológico e a preservação ambiental?”
Yuval Noah Harari, refletindo sobre a pergunta, responde:
“Tiago, o progresso tecnológico pode ser tanto uma bênção quanto uma maldição. A história da humanidade nos mostra que a tecnologia, sem uma orientação ética, pode levar à destruição. No entanto, se aplicada com sabedoria, ela pode ser usada para monitorar, preservar e até regenerar a Amazônia. A chave está em integrar as tecnologias com as necessidades e o conhecimento local, algo que, como Yuk Hui mencionou, deve ser culturalmente situado. A tecnologia não é neutra, ela precisa respeitar as tradições e a cultura da floresta.”
Neste momento, Yuk Hui intervém para reforçar sua visão:
“Exatamente, Harari. Tiago, devemos pensar em termos de cosmotechnics, ou seja, a tecnologia deve ser compreendida e desenvolvida de acordo com o contexto cultural em que se insere. A Amazônia tem suas próprias formas de lidar com a natureza e, muitas vezes, as técnicas indígenas são extremamente sofisticadas. Devemos aprender com esses saberes e não simplesmente impor tecnologias externas que desconhecem a lógica da floresta.”
Tiago pondera as palavras, mas ainda sente que falta uma resposta sobre o equilíbrio entre a natureza e o desenvolvimento econômico. Ele olha para Enrique Leff e pergunta:
“Leff, você falou sobre a racionalidade ambiental e a necessidade de um diálogo entre os saberes científicos e tradicionais. Mas como podemos garantir que o desenvolvimento econômico necessário para as populações locais não acabe entrando em conflito com a preservação da Amazônia?”
Leff responde com convicção:
“Tiago, o desenvolvimento não precisa ser destrutivo. É possível promover uma economia ecológica, que respeite os limites naturais da floresta enquanto oferece meios de subsistência para as populações locais. O segredo está na criação de políticas públicas e projetos sustentáveis que envolvam diretamente as comunidades indígenas e tradicionais. Elas devem ser protagonistas do processo, e não meras espectadoras.”
Slavoj Žižek, sem perder a oportunidade de oferecer uma perspectiva crítica, acrescenta:
“Tiago, a questão do desenvolvimento é inseparável das ideologias que o sustentam. Muitas vezes, o chamado ‘desenvolvimento econômico’ esconde interesses corporativos e políticos que não se importam com a Amazônia, mas sim com o lucro. Precisamos questionar essas motivações e entender que, em muitos casos, o que é vendido como progresso é, na verdade, destruição. Apenas uma crítica radical pode expor essas contradições.”
Enquanto o debate se intensifica, Jürgen Habermas intervém, tentando buscar uma síntese:
“Tiago, você levantou uma questão fundamental. Eu acredito que a única maneira de encontrar um equilíbrio real é por meio de um diálogo inclusivo e democrático, envolvendo todos os interessados – cientistas, políticos, empresários, comunidades locais e a sociedade em geral. Apenas com um processo deliberativo transparente e igualitário conseguiremos alcançar um consenso sobre o que é melhor para a Amazônia e para o planeta.”
Tiago reflete sobre todas essas falas, reconhecendo a riqueza das visões. Ele percebe que cada filósofo oferece uma lente distinta para pensar o futuro da Amazônia: Kant, com sua ênfase nas estruturas mentais; Hegel, com sua dialética; Foucault, com a crítica ao poder; Leff, com sua racionalidade ambiental; e Žižek, com sua visão crítica das ideologias. No entanto, ele também começa a notar algumas convergências.
Após refletir sobre as diversas perspectivas apresentadas, Tiago chega a conclusões significativas sobre a Amazônia. Ele percebe que a floresta deve ser entendida como um sistema interdependente, onde a natureza e a sociedade estão intrinsecamente conectadas, o que implica que qualquer abordagem sustentável precisa considerar essa interligação. Além disso, Tiago reconhece a necessidade de redefinir o papel da tecnologia na região, enfatizando que seu uso deve ser respeitoso e sensível às tradições culturais locais, em vez de impor modelos de progresso externos.
Ele também se convence de que a democracia desempenha um papel crucial no futuro da Amazônia. Para garantir um desenvolvimento justo e sustentável, é essencial que exista um processo deliberativo inclusivo, onde todas as partes interessadas sejam ouvidas. Por fim, Tiago entende que o poder e as ideologias devem ser constantemente questionados. Inspirado por Foucault e Žižek, ele acredita que a sociedade deve manter um olhar crítico e vigilante, assegurando que os interesses econômicos não se sobreponham às necessidades ambientais e sociais. Essas reflexões fortalecem a convicção de Tiago de que a preservação da Amazônia requer uma abordagem holística e colaborativa
Parte III
“A Nova Sociedade e a Crise da Modernidade”
Tiago, com uma expressão mais séria, decide trazer à tona novas questões. Ele pensa nas condições atuais da sociedade e se pergunta como as ideias de filósofos e sociólogos contemporâneos poderiam ajudar a compreender o momento em que vivemos. Ele se volta para a figura de Zygmunt Bauman, que até então estava observando o debate em silêncio, e questiona:
“Bauman, em sua obra sobre a modernidade líquida, você fala sobre a fragilidade das estruturas sociais e a incerteza constante. Como essas ideias se aplicam ao que discutimos aqui? A Amazônia está sendo impactada por um mundo em que tudo parece estar em fluxo, onde o consumo, o capital e a tecnologia dominam. Como podemos pensar em um futuro sustentável em um mundo tão instável?”
Zygmunt Bauman responde, pensativo:
“Tiago, a modernidade líquida é marcada pela incerteza e pela dissolução de vínculos sólidos. Tudo o que antes parecia estável – trabalho, identidade, comunidades – agora está em constante mutação. No caso da Amazônia, estamos vendo como os desejos globais de consumo imediato e a lógica do capital destroem lentamente essa floresta. A liquidez da modernidade dissolve também a nossa capacidade de pensar a longo prazo. Ninguém quer lidar com a responsabilidade pelas gerações futuras porque estamos presos à busca incessante pelo prazer e pelo lucro imediato. A verdadeira questão é: como criar estruturas que possam resistir a essa fluidez?”
Tiago, impactado pela visão de Bauman, faz outra pergunta:
“Então, como poderíamos construir algo mais sólido? É possível escapar dessa fluidez?”
Antes que Bauman responda, Anthony Giddens, outro sociólogo contemporâneo, intervém:
“Tiago, Bauman está certo em apontar a fluidez da modernidade, mas precisamos lembrar que a globalização também cria novas formas de organização social. Eu falo sobre a reflexividade moderna – a ideia de que estamos constantemente revisando e adaptando nossas práticas à luz de novas informações. Na Amazônia, essa reflexividade pode ser nossa aliada. As comunidades locais e globais podem aprender e se adaptar às novas realidades ambientais, desde que tenhamos mecanismos eficazes de governança. O problema, como Bauman indicou, é que o mundo se move rápido demais, e nem sempre temos tempo para refletir.”
Jean-François Lyotard se junta à conversa:
“Eu gostaria de acrescentar algo, se me permitem. A sociedade contemporânea não só é líquida, mas também é tribal. As pessoas se agrupam em torno de causas, frequentemente sem um entendimento profundo da complexidade que essas causas envolvem. Isso se reflete no ativismo ambiental. Muitos defendem a Amazônia e a preservação da natureza, mas não estão dispostos a se aprofundar nas dinâmicas sociais, econômicas e políticas que cercam essas questões. Sem esse entendimento, corremos o risco de repetir os erros do passado, apoiando soluções simplistas que podem ser prejudiciais.”
Michel Maffesoli, que até então tinha escutado atentamente, se pronuncia:
“Tiago, eu concordo com Lyotard. A sociedade contemporânea, caracterizada por uma nova tribalidade, revela a necessidade de pertença e de identificação. As pessoas se agrupam em comunidades baseadas em interesses, paixões e emoções. No caso da Amazônia, é vital entender que essa conexão emocional pode ser tanto uma força quanto uma fraqueza. As pessoas podem se mobilizar rapidamente, mas também podem se apegar a visões simplistas e imediatistas. É preciso fomentar um senso de responsabilidade que transcenda as tribos e crie um entendimento mais profundo das questões que enfrentamos.”
Tiago, surpreso com a perspectiva de Maffesoli, pergunta:
“Então, como podemos garantir que nossos esforços sejam eficazes? Como podemos nos conectar com a complexidade dessas questões?”
Lyotard responde:
“Precisamos ser céticos em relação às nossas próprias certezas. Em vez de buscar uma solução única, devemos abraçar a diversidade de vozes e perspectivas. A sociedade pós-moderna nos oferece a oportunidade de ouvir essas múltiplas narrativas e encontrar formas de agir que sejam inclusivas e respeitosas das complexidades locais. O desafio é aprender a dialogar e a ouvir, em vez de simplesmente impor nossas próprias visões.”
Tiago, agora claramente envolvido na discussão, reflete sobre como esses conceitos de fluidez, tribalidade e reflexividade podem ser aplicados à Amazônia. Ele lembra de discussões sobre o capitalismo global e a exploração dos recursos naturais, e traz a visão de Manuel Castells, um pensador da era da informação:
“Castells, você fala sobre a sociedade em rede, onde as informações fluem globalmente e instantaneamente. A Amazônia, nesse contexto, não é apenas uma floresta, mas também um nodo nesse sistema global. Como podemos usar essa conectividade para preservar a Amazônia, em vez de simplesmente explorá-la?”
Manuel Castells responde:
“Tiago, você está correto. A Amazônia está conectada a todos nós, e a globalização da informação pode ser tanto uma ameaça quanto uma oportunidade. Por um lado, o mundo está mais ciente dos problemas que a floresta enfrenta. No entanto, ao mesmo tempo, o capitalismo globalizado pode transformar a Amazônia em mais uma mercadoria. A verdadeira questão é: como podemos usar essa conectividade para fortalecer a governança ambiental? Talvez a solução esteja em uma sociedade civil global, onde pessoas de todos os lugares possam unir forças para proteger a floresta, independentemente de fronteiras políticas.”
Tiago sente que, cada vez mais, as questões que enfrenta são complexas e interligadas. Ele percebe que o que está em jogo não é apenas a Amazônia, mas também a forma como as sociedades se organiza no mundo pós-moderno. É nesse momento que ele levanta uma última questão para os filósofos e sociólogos reunidos:
“Se vivemos em uma era de incerteza, fluidez e tribalidade, como posso, como indivíduo e estudante, encontrar um caminho que contribua para a preservação da Amazônia e para um futuro sustentável? Ou estamos condenados a sermos vítimas dessas forças globais?”
Bauman, com um leve sorriso, responde:
“Tiago, a modernidade líquida nos ensina que não há respostas fáceis. Mas isso não significa que não há esperança. A chave está em encontrar maneiras de agir localmente, enquanto pensa globalmente. O que você faz na Amazônia pode ter ressonâncias em todo o mundo. A verdadeira mudança virá quando as pessoas começarem a se mover em direção a uma responsabilidade compartilhada, onde cada pequena ação conta.”
Giddens, complementando Bauman, diz:
“Não podemos controlar tudo, Tiago, mas podemos criar sistemas que respondam rapidamente às mudanças. A reflexividade e a adaptabilidade são fundamentais para um futuro sustentável.”
Tiago, em sua reflexão, demonstra uma profunda preocupação com as complexidades do mundo contemporâneo e como elas impactam a preservação da Amazônia, articulando suas angústias em relação à fragilidade das estruturas sociais e à incerteza que permeia a sociedade, conforme discutido por Bauman. A ideia de que a modernidade líquida está ligada à dissolução de vínculos e à busca incessante por consumo e lucro o leva a questionar a possibilidade de um futuro sustentável em um contexto tão volátil. Ele percebe que a fluidez da modernidade não apenas afeta as instituições, mas também a forma como as comunidades se relaciona com a natureza e entre si, reconhecendo que a busca por prazer imediato pode obscurecer a responsabilidade ambiental.
A visão de Giddens sobre a reflexividade moderna ressoa com Tiago, que entende que as comunidades podem aprender e se adaptar, mas observa que a rapidez das mudanças dificulta essa reflexão. Ele se identifica com a crítica de Lyotard e Maffesoli sobre a nova tribalidade, compreendendo que o ativismo deve ir além de uma abordagem simplista e incluir uma compreensão mais profunda das dinâmicas sociais e ambientais. Ao considerar a conexão da Amazônia com a sociedade em rede, conforme descrito por Castells, Tiago começa a ver a globalização como uma oportunidade para fortalecer a governança ambiental, unindo vozes e esforços.
No entanto, ele enfrenta angústias em relação à incerteza do futuro, preocupando-se com a possibilidade de que as forças globais tornem impossível a ação eficaz em defesa da Amazônia e questionando se os indivíduos realmente podem fazer a diferença. Além disso, sua inquietação se estende à responsabilidade compartilhada, refletindo sobre como cada pessoa pode se sentir parte de uma responsabilidade coletiva em um mundo que muitas vezes parece indiferente às questões locais.
Ao final, Tiago conclui que, embora a modernidade líquida e a globalização apresentem desafios significativos, ainda há espaço para a esperança. Ele percebe que, como indivíduo e estudante, pode contribuir para a preservação da Amazônia e para um futuro sustentável através de ações locais, que, mesmo pequenas, podem ter repercussões globais. Sua reflexão sugere que a verdadeira mudança começa com a responsabilidade individual e coletiva, promovendo um diálogo mais inclusivo e consciente sobre as questões ambientais e sociais que cercam a Amazônia, sentindo-se incentivado pela ideia de que a ação local pode influenciar o cenário global e que a construção de uma sociedade civil global pode fortalecer a luta pela preservação do meio ambiente.
Parte IV
“Vozes Femininas na Questão Ambiental e Social”
Tiago, refletindo sobre a discussão anterior e sentindo a necessidade de diversificar as vozes que ecoam na conversa, menciona:
“Estou percebendo que a nossa discussão até agora carece de perspectivas femininas. Mulheres ao longo da história têm desempenhado papéis cruciais na luta pela justiça social e ambiental. Como podemos integrar essas vozes em nossa conversa? Como Hipátia de Alexandria, que desafiou as normas de sua época em busca do conhecimento?”
Bauman, interessado, acena com a cabeça e diz:
“Hipátia representa a busca pelo saber e a resistência ao dogmatismo. Ela nos ensina que o conhecimento é uma ferramenta poderosa para questionar as normas sociais. Em um mundo onde a informação é muitas vezes manipulada, a busca pela verdade deve ser um dos nossos principais objetivos. Devemos nos inspirar em sua coragem para trazer novas visões e desafios.”
Tiago continua:
“E o que dizer de Rachel Carson? Sua obra Primavera Silenciosa despertou uma consciência ambiental sem precedentes. Como sua perspectiva pode enriquecer nosso entendimento sobre a Amazônia?”
Rachel Carson responde com uma voz firme e clara:
“Na verdade, Tiago, o que quero enfatizar é a interconexão entre todas as formas de vida. Quando escrevi Primavera Silenciosa, não estava apenas alertando sobre os perigos dos pesticidas; estava chamando a atenção para a fragilidade de nossos ecossistemas. A Amazônia não é apenas uma floresta; é uma rede complexa de vida. Precisamos ver a natureza como um todo, em vez de fragmentá-la em partes isoladas.”
Vandana Shiva, ao ouvir Rachel, adiciona:
“Concordo plenamente. A destruição ambiental muitas vezes é acompanhada pela opressão das comunidades locais. As mulheres, especialmente nas sociedades indígenas, desempenham um papel vital na conservação dos recursos naturais. Temos que escutar suas vozes e reconhecê-las como guardiãs do conhecimento tradicional. A luta pela justiça ambiental é também uma luta por justiça social.”
Tiago, intrigado, pergunta:
“Como podemos garantir que as vozes das mulheres sejam ouvidas, especialmente em questões tão complexas como a Amazônia?”
Carolyn Merchant intervém, trazendo seu olhar crítico:
“Precisamos desafiar a narrativa que muitas vezes marginaliza as mulheres. Historicamente, a ciência e a natureza foram vistas como algo a ser dominado. É vital reescrever essa história, incorporando as perspectivas femininas que veem a natureza como uma parceira, não como uma adversária. Precisamos de uma abordagem ecológica que inclua as experiências e o conhecimento das mulheres.”
Virginia Woolf, com seu olhar poético, acrescenta:
“E lembre-se, Tiago, que a luta pela expressão feminina vai além do âmbito científico. Em um mundo que frequentemente silencia as vozes das mulheres, precisamos criar espaços onde essas vozes possam emergir livremente. É a história de cada mulher que compõe o mosaico da nossa sociedade, e essas histórias precisam ser contadas. A literatura, assim como a ciência, é uma forma poderosa de transmitir experiências e inspirar mudanças.”
Nesse momento, Cathy O’Neil, que até então estava ouvindo atentamente, decide se juntar à conversa:
“Se me permitem, gostaria de introduzir uma nova dimensão a essa discussão. A tecnologia e o uso de dados têm um papel cada vez mais importante nas decisões que afetam o meio ambiente. No entanto, esses sistemas não são neutros; eles muitas vezes refletem preconceitos e interesses que podem marginalizar ainda mais as vozes que estamos tentando amplificar. Devemos ser críticos em relação ao que consideramos como ‘dados objetivos’. A forma como coletamos, interpretamos e aplicamos dados pode reforçar desigualdades existentes, em vez de combatê-las.”
Tiago, interessado, pergunta:
“Como podemos então garantir que os dados usados em pesquisas ambientais sejam justos e representem as realidades das comunidades locais, especialmente as mulheres?”
Cathy O’Neil responde:
“Precisamos de transparência e responsabilidade. Isso significa envolver as comunidades na coleta de dados, garantindo que suas vozes e experiências sejam integradas ao processo. Além disso, as análises devem ser feitas de forma crítica, questionando quem se beneficia dessas informações e quem é deixado de fora. Somente assim podemos avançar em direção a uma abordagem verdadeiramente inclusiva e equitativa.”
Tiago, absorvendo todas essas ideias, reflete:
“Então, o que estamos discutindo aqui é que a preservação da Amazônia e a luta pela justiça ambiental precisam incluir vozes diversas e multifacetadas. O que podemos fazer como indivíduos para garantir que essas vozes sejam amplificadas?”
Bauman oferece uma perspectiva:
“Podemos começar ouvindo. Ouvir as histórias, os desafios e as vitórias das mulheres que atuam em suas comunidades. Quando ampliamos nosso círculo de escuta, começamos a perceber a complexidade das questões que enfrentamos e, ao mesmo tempo, cultivamos um senso de empatia que é crucial para a ação social.”
Tiago, encorajado por essa nova abordagem, pergunta:
“E se começássemos a criar uma plataforma onde essas vozes pudessem ser compartilhadas e discutidas? Uma maneira de integrar ciência, literatura e ativismo?”
Rachel Carson sorri, vislumbrando a possibilidade:
“Isso poderia ser uma forma poderosa de unir a comunidade. A comunicação é vital para a mudança. Ao compartilhar histórias, ideias e práticas, podemos criar uma rede de solidariedade que transcende fronteiras.”
Vandana Shiva, entusiasmada, conclui:]
“Sim, uma rede de mulheres e homens que lutam juntos pela proteção da Amazônia e por um mundo mais justo. A mudança começa com cada um de nós, e quando nos unimos, podemos criar um impacto significativo.”
A reflexão de Tiago, ao longo dessa conversa, revela seu crescente entendimento de que a preservação da Amazônia e a luta pela justiça ambiental não podem ser realizadas de forma unilateral ou superficial. Ele conclui que a inclusão de vozes diversas, especialmente as femininas, é essencial para uma abordagem holística e eficaz. Ao ouvir figuras históricas como Hipátia, Rachel Carson, Vandana Shiva e outras, Tiago compreende que a contribuição feminina à ciência, literatura e ativismo não apenas fortalece a causa ambiental, mas também traz uma dimensão de justiça social que frequentemente é marginalizada.
Tiago percebe que o conhecimento tradicional, especialmente o guardado pelas mulheres das comunidades indígenas, é vital para a conservação da Amazônia. A preservação, segundo ele, vai além de proteger um ecossistema; é sobre respeitar os saberes e as experiências das pessoas que vivem em íntima relação com a natureza.
A principal conclusão de Tiago é a necessidade de criar um espaço onde vozes femininas e outras perspectivas marginalizadas possam emergir e ser amplificadas. Ele propõe uma plataforma que integre ciência, literatura e ativismo, onde histórias e conhecimentos possam ser compartilhados para promover uma rede de solidariedade e ação coletiva.
Seu parecer final é de que o diálogo e a escuta ativa são passos cruciais para a construção de uma abordagem inclusiva e justa. A ação individual é importante, mas unir forças em prol de um objetivo comum pode criar um impacto duradouro e significativo.
Parte V
“Amazônia: O Epicentro das Crises Globais”?
Tiago continua sua busca por compreender a complexidade da Amazônia e sua importância para o mundo. Depois de ouvir as diferentes perspectivas filosóficas e sociológicas, ele agora convida pensadores e ativistas contemporâneos para refletirem sobre a Amazônia no contexto das crises globais.
Tiago, lembrou das discussões sobre Bauman e Maffesoli,e decide aprofundar a conversa, levantando novas questões sobre as complexidades da sociedade contemporânea:
“Entendo o que Bauman e Maffesoli estão dizendo sobre o esgotamento da modernidade e a fragmentação da sociedade, mas parece que estamos em uma nova fase, onde não só a liquidez que Bauman menciona é um problema, mas também a complexidade das estruturas econômicas e tecnológicas que nos cercam. Como a economia comportamental e as mudanças tecnológicas afetam essa nova sociedade? Como Tim Harford, por exemplo, descreve essas transformações?”
Tim Harford, o economista conhecido por sua capacidade de traduzir questões econômicas complexas para o público geral, entra na discussão:
“Bem, Tiago, a economia comportamental nos ensina que os seres humanos são profundamente irracionais em suas tomadas de decisão. Boa parte das escolhas que fazemos é influenciada por fatores emocionais, contextuais e inconscientes. Isso é ainda mais problemático em contextos complexos como a Amazônia, onde forças econômicas e políticas globais afetam decisões locais. A crescente demanda por commodities, como soja e carne, por exemplo, empurra a fronteira agrícola para a floresta, provocando a destruição desse ecossistema essencial.”
Tiago reflete:
“Então, a nova sociedade é moldada não só por escolhas individuais, mas por forças globais que ditam o comportamento local, como vemos na Amazônia, onde as pressões econômicas afetam diretamente o meio ambiente. L. Friedman fala sobre isso quando descreve como a globalização está transformando até mesmo os lugares mais remotos.”
L. Friedman, com seu tom mais sério, concorda:
“Exato, Tiago. A globalização e a revolução tecnológica criaram uma interdependência global, mas também um desequilíbrio de poder. Na Amazônia, por exemplo, vemos como os interesses de multinacionais e grandes corporações moldam as políticas locais, levando à exploração predatória de recursos naturais. Ao mesmo tempo, a conectividade global oferece novas oportunidades para resistir a essas pressões, com a emergência de movimentos indígenas e ambientalistas que lutam pela proteção da floresta.”
Neste momento, Jonathan Cary, crítico da influência dos mercados e do comportamento social, entra na conversa:
“E a Amazônia é um exemplo claro da desigualdade gerada por essas forças. O poder econômico está concentrado nas mãos de poucos, enquanto as populações tradicionais e os defensores da floresta são marginalizados. Os recursos naturais são vistos como commodities globais, e não como parte de uma ecologia interdependente. A crise da Amazônia reflete essa desconexão entre o capitalismo global e as necessidades locais de preservação.”
Tiago, já pensando no papel da ciência e no debate ambiental, questiona:
“Essas crises sociais e econômicas afetam diretamente a maneira como tratamos o meio ambiente. Como essas ideias se relacionam com as discussões anteriores sobre o impacto ambiental na Amazônia? A ciência pode ajudar a entender e propor soluções para essa crise?”
Humberto Maturana responde de forma serena:
“Tiago, a relação entre sociedade e natureza é um elo inseparável, especialmente em um bioma tão importante quanto a Amazônia. O que está acontecendo lá não é apenas uma questão ambiental, mas também uma questão de sobrevivência humana. A ciência pode, e deve, nos guiar a entender a interdependência entre os sistemas naturais e sociais. A Amazônia não é apenas um recurso a ser explorado; ela é um ecossistema vivo, que regula o clima global, abriga biodiversidade e sustenta as vidas de comunidades indígenas. Quando desmatamos a floresta, estamos destruindo uma parte essencial de nós mesmos.”
Tiago, contemplando essas palavras, questiona:
“Isso me lembra a crítica de Bruno Latour, que questiona a ideia de uma separação entre natureza e sociedade. Como ele vê essa relação, especialmente no caso da Amazônia?”
Bruno Latour, com seu tom reflexivo, responde:
“A Amazônia é o exemplo perfeito do que eu chamo de ‘politização da natureza’. Não podemos mais ver a floresta apenas como uma paisagem natural isolada das forças políticas e econômicas. A dicotomia entre natureza e sociedade é uma ilusão criada pela modernidade. A Amazônia é um ator global, influenciando e sendo influenciada pelas decisões políticas e econômicas de todo o mundo. Precisamos pensar em redes de relações entre humanos e não humanos, entre a floresta e as populações que nela vivem, e como todas essas interações moldam o futuro do planeta.”
Nesse ponto, Tim Harford complementa:
“Latour tem razão. Quando olhamos para a Amazônia, não estamos apenas vendo uma crise ecológica, mas também uma crise social e econômica. As soluções não podem ser apenas tecnológicas ou científicas, elas precisam ser multidimensionais. Precisamos de políticas globais que considerem os impactos locais, e vice-versa, para que a preservação da Amazônia seja possível.”
Tiago, cada vez mais convencido da complexidade da questão, provoca:
“A Amazônia parece ser o ponto de encontro de todas essas crises da modernidade: a exploração capitalista, o impacto ambiental, a globalização e o enfraquecimento das instituições democráticas. Será que estamos preparados para enfrentar essas questões de forma integrada, ou a modernidade falhou em nos preparar para isso?”
Bauman, com seu tom característico, responde:
“Em muitos aspectos, a modernidade nos deu ferramentas para transformar o mundo, mas também criou os problemas que agora enfrentamos. A Amazônia é um microcosmo dessas tensões. Como Maffesoli sugere, estamos voltando a uma era tribal, onde nos agrupamos em torno de causas, muitas vezes sem entender as complexidades por trás delas. Mas o que está em jogo na Amazônia vai além da preservação ambiental — é a sobrevivência da própria humanidade.”
Tiago: “Com tantas visões diferentes e profundidade no debate, ainda me pergunto: como a Amazônia se tornou o símbolo central das crises globais? Quais são os aspectos que devemos priorizar na sua proteção, se não estamos apenas lutando contra a devastação local, mas contra um colapso global?”
Eduardo Gudynas: “Tiago, a questão da Amazônia não é apenas sobre preservação ambiental. É sobre repensar o modelo de desenvolvimento. O ‘Buen Vivir’ sugere que o bem-estar humano e a natureza são inseparáveis. O problema é que o modelo ocidental de desenvolvimento, focado em exploração e lucro, desconsidera as vidas das populações tradicionais e o equilíbrio ecológico. Para a Amazônia sobreviver, precisamos aprender a coexistir com ela, não apenas explorá-la.”
David Harvey: “Exatamente, Eduardo. O capitalismo transforma tudo em mercadoria, inclusive a natureza. A Amazônia, assim como outras áreas de exploração, está presa no ciclo da acumulação de capital. O sistema econômico global depende da extração incessante de recursos, e a floresta é uma das últimas fronteiras desse processo. Proteger a Amazônia exige não apenas conservação, mas uma crítica ao próprio sistema econômico que impulsiona sua destruição.”
James Lovelock: “Concordo, David. Eu acrescentaria que a Amazônia desempenha um papel crucial no sistema de autorregulação da Terra, o que eu chamo de ‘Hipótese de Gaia’. Destruir a Amazônia é como destruir um órgão vital de um ser vivo. Quando derrubamos as árvores e interrompemos o ciclo da água, estamos interferindo diretamente na capacidade do planeta de manter o equilíbrio climático.”
Tiago: “Então estamos falando de um impacto que vai além da Amazônia… afeta todo o planeta. Mas como podemos equilibrar a necessidade de desenvolvimento com a necessidade de preservação?”
Amartya Sen: “Tiago, o desenvolvimento não precisa ser sinônimo de destruição. Há formas de desenvolvimento que respeitam os direitos humanos e a preservação ambiental. Precisamos focar no conceito de ‘capacidades’, garantindo que as pessoas que vivem na Amazônia tenham oportunidades de desenvolvimento econômico, mas sem sacrificar suas terras ou a biodiversidade. O desenvolvimento precisa ser sustentável e equitativo.”
Naomi Klein: “O problema, Tiago, é que o desenvolvimento, como o conhecemos, está nas mãos de grandes corporações e elites políticas que não se importam com a sustentabilidade. A Amazônia é um campo de batalha no conflito entre a lógica do lucro a qualquer custo e a necessidade de um futuro viável para todos. As empresas que lucram com a destruição da floresta precisam ser responsabilizadas. Precisamos de um movimento global de resistência contra a exploração desenfreada.”
Noam Chomsky: “O que Naomi diz é crucial. O poder econômico e político que impulsiona a destruição da Amazônia é parte de um sistema global de dominação. As grandes potências, junto com suas corporações, mantêm o controle sobre as áreas de recurso, como a Amazônia, através de políticas neoliberais. Essa é a nova forma de colonialismo. Precisamos de uma mobilização internacional que não apenas proteja a Amazônia, mas que enfrente esses interesses globais.”
Tiago: “Então, o que está acontecendo na Amazônia não pode ser separado da política global… Mas qual é o papel do Brasil nesse contexto?”
Antonio Nobre: “Tiago, o Brasil está no centro dessa questão. A Amazônia é parte do coração climático do planeta. Suas árvores funcionam como grandes bombas que enviam umidade para o resto do mundo. A destruição da floresta afetará tanto o Brasil quanto o planeta, comprometendo a agricultura, o ciclo da água e o clima global. O Brasil precisa liderar, não apenas pela sua própria sobrevivência, mas pela do mundo.”
Tiago: “É impressionante como a Amazônia está tão interligada com o futuro global. Mas como podemos transformar essa consciência em ações concretas?”
David Harvey: “Tiago, a mudança precisa começar com uma crítica ao sistema econômico que cria essas crises. Enquanto o capitalismo global continuar a depender da destruição de recursos naturais, não haverá verdadeira mudança. Precisamos de alternativas radicais, tanto no plano local quanto global.”
Eduardo Gudynas: “E essa mudança só virá com a valorização de outras formas de conhecimento, como o dos povos indígenas da Amazônia. Eles têm uma relação simbiótica com a floresta, algo que a civilização moderna esqueceu. O caminho para salvar a Amazônia passa por respeitar e integrar esses conhecimentos.”
A conversa de Tiago, ao refletir sobre as interações entre economia, tecnologia, e a crise ambiental na Amazônia, provoca nele um sentimento de profunda conscientização sobre a complexidade das questões envolvidas. Ele percebe que, mais do que um problema local, a Amazônia é o epicentro de crises globais ligadas ao capitalismo, à exploração desenfreada de recursos e à desigualdade social.
Ao conectar pensadores como Bauman, Maffesoli, Tim Harford, e outros, Tiago compreende que a liquidez social e a fragmentação moderna, discutidas por Bauman, estão profundamente interligadas com as transformações econômicas e tecnológicas que moldam a sociedade contemporânea. Ele percebe que as decisões irracionais que moldam o comportamento humano são amplificadas pelas forças globais, que frequentemente ignoram o impacto ambiental e social de suas ações.
Tim Harford destaca que essas forças econômicas globais influenciam as escolhas locais, como a expansão da fronteira agrícola na Amazônia, o que provoca em Tiago uma reflexão sobre a interdependência entre o local e o global. Ao ouvir L. Friedman e outros, Tiago reconhece o desequilíbrio de poder entre corporações e comunidades locais, e o quanto isso afeta a sustentabilidade da floresta e a sobrevivência das populações tradicionais.
A provocação de Tiago sobre o papel da ciência reflete sua busca por soluções para essa crise, e ele se conecta com a visão de Humberto Maturana e Bruno Latour, que enfatizam a necessidade de repensar a relação entre natureza e sociedade. A ideia de que a Amazônia é um “ator global” que interage com forças políticas e econômicas em todo o mundo leva Tiago a questionar se estamos prontos para enfrentar as crises globais de forma integrada.
Assim, o pensamento que provoca Tiago é o reconhecimento de que a Amazônia simboliza uma encruzilhada de crises globais — ambientais, econômicas, sociais e políticas — e que qualquer solução passa pela reconsideração do modelo de desenvolvimento, pela integração de conhecimentos indígenas, e por uma mudança estrutural no sistema econômico que atualmente domina o mundo.
Parte VI
Reflexões de Tiago: Um Compromisso com o Futuro
Ao final do encontro, Tiago sentiu-se imerso em um turbilhão de pensamentos e emoções. As discussões que havia presenciado ecoavam em sua mente, onde as vozes dos filósofos se misturavam com as preocupações ambientais que tanto o inquietavam. Ele percebia, com crescente clareza, que compreender a Amazônia e os desafios que ela enfrentava não era algo que poderia ser feito de maneira isolada. A troca de ideias e a diversidade de pensamentos eram essenciais para formar uma visão mais abrangente e profunda.
Tiago refletiu sobre a responsabilidade de cada um na luta pela preservação da floresta. Ele compreendeu que as ações individuais, por menores que fossem, reverberavam em um mundo cada vez mais interconectado. A preservação da Amazônia não envolvia apenas a proteção de um ecossistema, mas também o respeito pelas tradições e pelos direitos dos povos que ali habitam. A floresta, com toda sua riqueza e mistério, era um reflexo vivo das interações humanas com a natureza, e ele se comprometeu a amplificar as vozes dessas comunidades, trabalhando em colaboração com elas.
A crise da modernidade, com todas as suas incertezas, não deveria servir como uma desculpa para a inação. Pelo contrário, para Tiago, era um chamado urgente à ação consciente. Ele sabia que, diante da magnitude dos desafios, era fundamental criar estruturas que promovessem a sustentabilidade e a responsabilidade para com as futuras gerações. Inspirado, ele decidiu buscar soluções que respeitassem a complexidade das questões que a Amazônia enfrentava, reconhecendo que a luta pela justiça ambiental e social era uma jornada coletiva.
Tiago reconheceu que a Amazônia não é apenas um problema local, mas um epicentro de crises globais ligadas ao capitalismo, à exploração desenfreada de recursos e à desigualdade social. Ele conectou pensadores como Bauman e Tim Harford, percebendo que a liquidez social e a fragmentação moderna estavam profundamente interligadas com as transformações econômicas e tecnológicas que moldam a sociedade contemporânea. Essa reflexão o levou a entender que as decisões irracionais que moldam o comportamento humano são amplificadas por forças globais que frequentemente ignoram o impacto ambiental e social de suas ações.
Ele refletiu sobre como as escolhas locais, como a expansão da fronteira agrícola na Amazônia, são influenciadas por forças econômicas globais e reconheceu o desequilíbrio de poder entre corporações e comunidades locais, o que afeta diretamente a sustentabilidade da floresta e a sobrevivência das populações tradicionais. Tiago também buscou soluções para essa crise, inspirando-se em Maturana e Latour, que enfatizam a necessidade de repensar a relação entre natureza e sociedade. Ele entendeu que a Amazônia é um “ator global” que interage com forças políticas e econômicas em todo o mundo, levando-o a questionar se estamos prontos para enfrentar as crises globais de forma integrada.
Porém, Tiago também se deu conta de que as divergências de opinião eram inevitáveis. O que poderia parecer uma solução clara para alguns era muitas vezes visto como um problema para outros. E essa disparidade de perspectivas, longe de ser um obstáculo, era o que impulsionava o avanço e a criatividade humana. As diferenças de pensamento, embora desafiadoras, eram oportunidades para explorar novas ideias e novas maneiras de lidar com a crise ambiental.
Ele ponderou sobre como o sucesso de qualquer esforço coletivo estava sempre acompanhado por múltiplos desafios. As decisões não eram simples e carregavam consigo a responsabilidade de considerar todas as nuances e consequências. Tiago percebeu que unir forças e ouvir as vozes diversas da comunidade seria essencial para fortalecer os laços sociais em prol do bem comum. Essa colaboração não apenas enriquecia o processo de tomada de decisões, mas também gerava um senso de pertencimento e responsabilidade compartilhada.
Finalmente, Tiago entendeu que a inclusão de diferentes vozes, especialmente das mulheres e dos detentores do conhecimento tradicional, era crucial para a construção de um futuro mais justo e sustentável. Com esse novo senso de propósito, ele se levantou determinado a ser um agente de mudança, pronto para enfrentar os desafios que viriam. Sabia que, mesmo em meio às discordâncias, a verdadeira força estava na capacidade de dialogar, de ouvir e de encontrar caminhos que respeitassem a diversidade de pensamentos e experiências. Com esse pensamento, Tiago sentiu-se preparado para seguir em frente, certo de que o futuro da Amazônia dependia da união entre pessoas, ideias e ações. O caminho era longo, mas ele estava disposto a percorrê-lo.
Com esse pensamento, Tiago sentiu-se preparado para seguir em frente, certo de que o futuro da Amazônia dependia da união entre pessoas, ideias e ações. O caminho era longo, mas ele estava disposto a percorrê-lo.
Estevão Monteiro de Paula é engenheiro civil, mestre em Engenharia de Estruturas e Ph.D pela Universidade do Tennessee, coordenador de pesquisas do INPA e professor titular da Universidade do Estado do Amazonas
Comentários