O fim do ano aponta para um forte aumento no faturamento do Polo Industrial de Manaus (PIM), que deve superar os 20%. Em reais, a notícia será comemorada, mas, em dólares, o cenário é diferente: provavelmente haverá queda. Esse contraste, que podemos chamar de “dólar nosso”, reflete como o PIM acompanha o ambiente de negócios do Brasil. O dólar mais caro incorpora os riscos e ineficiências locais, impactando não só o país como um todo, mas também o Amazonas.
Por André Ricardo Costa
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Receita para ganhar dinheiro fácil: Abra uma conta em banco japonês. Pegue empréstimo, em ienes, a taxa de 1% ao ano. Compre reais brasileiros. Empreste ao governo brasileiro a juros de 10,75% ao ano.
Essa é a tal “operação de carry trade”, que como dizem alguns de ambos os extremos do espectro político, faz do Brasil o paraíso dos rentistas. Funcionou durante boa parte do Plano Real, sendo um dos principais direcionadores de fluxos de moeda estrangeira para o Brasil. Simbólico daquela época em que um dólar valia menos que dois reais.
Ok, a operação não é tão fácil assim. É acompanhada do risco de o rentista ficar solitário na operação. Se os demais potenciais operadores acharem que aquele patamar de juros pagos pelo governo brasileiro não é suficiente para conter a inflação, pode ser que aquele retorno de 10,75% ao ano em reais seja inferior à perda da capacidade da moeda brasileira ser trocadas por itens precificados em seu próprio ambiente.
Pior, se os operadores não tiverem muita companhia, a queda na demanda pelo real faz a moeda brasileira perder valor de troca ante as moedas estrangeiras. Ficam mais pobres os poucos especuladores que se aventuram a isso, e o povo cuja produção dá lastro à moeda que seria alvo do carry trade.
Para mitigar esse risco o especulador pode, ao mesmo tempo que empresta dinheiro ao governo brasileiro, comprar direito de vender a moeda brasileira, na data em que vai receber os juros, pela sua cotação na data do empréstimo. Ou para evitar a complicação, simplesmente se evita a transação. Provavelmente é isso que tem ocorrido ao longo deste 2024, que começou com o dólar a R$ 4,85 e hoje está a R$ 5,71.
Enquanto isso, a população brasileira prossegue na vida tomando suas decisões de consumo um pouco indiferentes. No fundo há um desalento, como se o brasileiro tivesse que se acostumar em não interagir com o exterior. Talvez até alegria, sobretudo nos ciclos produtivos de menor valor agregado, cujas rendas em moeda local aumentam com o câmbio depreciado. Ressoa mais forte a cantilena do Brasil ser o país no agro e minérios.
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Para a indústria de bens duráveis, se as cadeias forem pouco verticalizadas e dependerem de importação de insumos, há a esperança da renda do agro e minérios ser direcionada para consumir a produção industrial local. O custo fica maior pelos insumos mais caros, mas o volume de vendas tende a aumentar, e a demanda interna pode até justificar o aumento de preços.
Exatamente isso explica o que veremos ao fim do ano com o forte aumento do faturamento do PIM, que deve superar 20%. Olhando em reais, a notícia será comemorada. Em dólares, contudo, provavelmente haverá queda. É a dimensão em que o PIM reflete o ambiente de negócios do Brasil como um todo. O dólar mais caro embute nossos riscos e ineficiências. Afeta o Brasil, afeta o Amazonas.
Talvez alçar nossa voz a nível nacional nos enrouqueça. Então nos resta olhar o macroambiente do Amazonas e rastrear as cadeias produtivas para além das questões pontuais. Resolvendo nosso ambiente de negócios, podemos premiar os que agora nos procuram para investir em suprema audácia contra todos os sinais de riscos. Ganhos nos fatores de produção resultará em surpresas positivas na rentabilidade até em moeda estrangeira. Mostrando que vale a pena investir no PIM.
André Ricardo Costa é Doutor em Administração pela FEA/USP e professor da Ufam