A psiquiatra Tânia Correa Toledo Ferraz Alves comenta dados da OMS, segundo os quais os casos de depressão e de ansiedade cresceram 25% durante a pandemia
A questão da saúde mental está sob os holofotes há algum tempo, ganhando uma maior atenção e interesse por conta da pandemia. Neste mês, celebra-se o Janeiro Branco, um movimento social dedicado à conscientização dos cuidados com a saúde mental e emocional. Segundo a OMS, a depressão e a ansiedade aumentaram mais de 25% apenas no primeiro ano de pandemia.
A organização estima que mais de 300 milhões de pessoas têm depressão e, em relação ao outro transtorno, o Brasil é classificado como o país mais ansioso do mundo. Apesar de já serem um problema anterior à pandemia, esse período mudou nossos hábitos, agravando-os ainda mais.
“Teve isolamento social, home office – que é um desafio –, o stress, as perdas, o medo. Tudo isso levou a um agravamento do sofrimento emocional, das dificuldades, dos nossos hábitos e de rotinas que mudaram”, diz Tânia Correa Toledo Ferraz Alves, psiquiatra e diretora das unidades de internação do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.
Desequilíbrio emocional
Segundo Tânia, os casos de ansiedade e depressão triplicaram durante o período pandêmico. Os sintomas, muitas vezes confundidos ou deixados de lado, são o cansaço, desgaste emocional, exaustão e sofrimento. Pessoas que, no dia a dia, sentem maiores dificuldades de realizar tarefas ou se sentem drenadas após o período de trabalho, mesmo que não seja estressante nem tenha muitas tarefas.
Outro ponto importante, ressaltado pela especialista, é o regime de trabalho: por não haver separação de ambientes no home office, as pessoas não têm um horário estipulado para o almoço – que pode passar “batido” –, além de não interagirem com outros colegas de trabalho. Essas pessoas pararam de fazer exercícios físicos, deixaram de lado a rotina de autocuidados, a alimentação ficou pior e, somado a tudo isso, o estresse aumentou.
“Tudo que funcionava como equilíbrio emocional para contrabalancear o estresse, a gente foi abrindo mão e, muitas vezes, nós mantivemos alguns hábitos que não são bons para o nosso dia a dia e para a qualidade de vida. E com isso a gente não vai perceber esse cansaço, esse desânimo”, explica ela.
A médica ainda esclarece que a ansiedade é normal e pode até ser benéfica. Porém, passa a ser um problema quando não há explicação plausível para o sentimento: “Eu estou em casa tranquila e de repente meu coração dispara, eu tenho uma sensação de que algo vai acontecer de muito grave. Eu tenho um medo e, nessa hora, naturalmente, vou pensar que eu estou passando mal”, exemplifica Tânia.
Qual o primeiro passo?
“Na dúvida, procure ajuda.” Essa é a dica da psiquiatra para qualquer dos sintomas de que algo não está dentro dos conformes. Uma pessoa que ganha ou perde peso muito abruptamente, está isolada e que já tentou mudar seus hábitos alimentícios, de autocuidado e de exercícios físicos, mas não funcionou, deve ir a um profissional especializado.
A tristeza passa, diz a médica, mas, se o sentimento persiste, isso é um indicativo de um desequilíbrio emocional. Mas como começar a mudança? Tânia diz que mudar o estilo de vida ajuda com o tratamento. Não apenas isso, mas aqueles próximos a alguém que está sofrendo têm a missão de ajudar, por meio do acolhimento e direcionamento para tratamentos.
“Às vezes, um quadro que parece psiquiátrico pode ser físico”, alerta a psiquiatra. Os problemas de saúde mental atingem todas as faixas etárias, sendo que as mulheres são mais propensas a desenvolver depressão, segundo a OMS. O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece atendimento especializado em doenças mentais. Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) também são uma opção para quem busca ajuda.
Hoje, psiquiatras já fazem parte do time de médicos em hospitais e estão preparados para atender. “Janeiro branco é um mês interessante, porque é um mês em que a gente faz planos. Então, a gente faz planejamento e é uma oportunidade para nós olharmos para nossa vida. Com saúde mental, a gente está falando de equilíbrio: não é ausência de estresse, não é ausência de dificuldade, mas o que eu posso fazer para melhorar a minha capacidade de lidar com adversidades, com essa dificuldade de crescer, e como que eu vou me cuidar”, finaliza Tânia.
Texto publicado por Jornal da USP
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