“Na Amazônia, a bala que mata jornalistas, ativistas e indígenas é comprada com o dinheiro da grilagem, do garimpo ilegal e da madeira roubada. Sob Bolsonaro, esses crimes aumentaram seus negócios, seu poder e sua atuação e hoje estão mais preparados do que nunca para eliminar quem atravessa seu caminho”. Com esta fala de Marcio Astrini, do Observatório do Clima, Daniela Chiaretti abre no Valor uma série de reações poderosas ao assassinato de Bruno Pereira e Dom Phillips no Vale do Javari.
A repercussão do assassinato do indigenista e do jornalista britânico expuseram ao mundo a realidade vivida hoje pela Amazônia: a de uma “Terra sem lei”. Segundo o delegado da PF Alexandre Saraiva, “as regras que valem ali são as do crime organizado (…) Ali atuam organizações criminosas com apoio dos políticos locais, estaduais, e tentáculos até nas altas esferas do governo brasileiro”, como reportado pela Deutsche Welle (DW). À GloboNews, Saraiva mencionou nomes de alguns destes políticos que chamou de “bancada do crime”: Zequinha Marinho, Telmário Mota, Mecias de Jesus, Jorginho Melo e Carla Zambelli.
O domínio do crime sobre a região não é novo: há duas décadas a violência vem dominando a Amazônia, como relata o economista Rodrigo Soares, do Insper, em entrevista a’O Globo: “Entre 1999 e 2019, municípios pequenos da região apresentaram um ‘excesso de violência’ se comparados às cidades brasileiras de mesmo porte (…) os municípios sob maior risco de atividades ilegais associadas à grilagem e extração de madeira e ouro são responsáveis, em média, por 70% desse excesso de violência (…) desde 2015, há uma generalização da violência na região, em decorrência da maior relevância do tráfico internacional de drogas na Amazônia”.
Mas a situação piorou com os ataques de Bolsonaro ao IBAMA e ao ICMBio, os cortes de recursos destes órgãos e a nomeação de aliado de ruralistas para a chefia da FUNAI. Como reporta a DW, “é recorrente ouvir de agentes da fiscalização ambiental que os discursos do presidente da República criaram um clima de ‘liberou geral’ na Amazônia. (…) Às vezes, estamos 200 km dentro da mata e tem gente dizendo que não deveríamos estar lá porque o presidente falou que iria acabar com a fiscalização”, relata Wallace Lopes, diretor da Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente. É “difícil, cansativo, perigoso”, como disse Bruno Pereira em entrevista à Folha antes de ir à floresta pela última vez.
Como escreve o bravo jornalista investigativo Lúcio Flávio Pinto, no Amazônia Real, o atual presidente “homologou a violência nas frentes que avançam sobre as áreas ainda isoladas da Amazônia à cata de riquezas a qualquer custo e para obter o maior lucro, mesmo que seja à base de destruição da natureza e das fontes dos produtos que são buscados. O presidente da República protege esses ‘bandeirantes’ de velho estilo e lhes aponta seus inimigos, deles e da autoridade máxima do país.”
O “tudo dominado” na Amazônia foi objeto de várias matérias e artigos nos últimos dias; seguem alguns que valem ser mencionados e lidos:
– O ex-secretário Nacional de Justiça no Ministério da Justiça e Segurança Pública, Vladimir Passos de Freitas, discute no site ConJur como os cartéis de drogas de Miami (EUA), Medelin (Colômbia) e Sinaloa (México), além de diversas facções nacionais do crime, foram atraídas para Amazônia pelo “enorme potencial de negócios lucrativos, como o tráfico de entorpecentes, a caça e a pesca ilegal, extração de madeira, tudo mesclado com negócios aparentemente lícitos, como hotéis e estabelecimentos comerciais que possibilitam a lavagem de dinheiro”; no artigo Freitas mostra o histórico e as razões deste processo, discutindo inclusive alguns caminhos de solução do enorme problema;
– O Globo divulgou dados da CPT dizendo que 19 pessoas foram assassinadas na Amazônia por defenderem o meio ambiente e/ou Populações Tradicionais da região; o número não leva em consideração as mortes de Bruno e Dom;
– O Valor repercutiu nota da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) afirmando que o poder público negligencia a proteção ao meio ambiente, aos Povos Originários e aos defensores de Direitos Humanos;
– A BBC fez matérias sobre os jornalistas serem categoria sob ataque no Brasil, sobre as tipologias do crime organizado na Amazônia e sobre a resistência à situação; e
– Jamil Chade antecipou no UOL a escalada da pressão na ONU contra o governo Bolsonaro que está sendo preparada por lideranças indígenas brasileiras.
Fonte: Clima INFO
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