Nos últimos 66 milhões de anos, o planeta experimentou quatro estados gerais do sistema climático: muito quente, quente, frio e glacial. A identificação dos estados gerais do sistema climático foi realizada por estudo publicado na revista ‘Science‘.
Cada um deles se caracteriza tanto por diferentes concentrações atmosféricas de gases do efeito estufa quanto por tamanhos distintos das calotas polares. E essas características condicionaram uma reposta particular do sistema climático às variações nos ciclos astronômicos da Terra e na concentração atmosférica de dióxido de carbono – CO2.
A era Cenozóica
No estudo da história geológica do planeta, os últimos 66 milhões de anos são denominados de era Cenozóica. De acordo com o estudo, desde 1975 a análise de fósseis de organismos marinhos permitiu à ciência reconstruir as condições ambientais e climáticas da era Cenozóica.
O primeiro levantamento identificou que o sistema climático terrestre experimentara um período quente, entre 60 e 40 milhões de anos atrás. As condições passaram então gradualmente para um estado frio entre 10 e 5 milhões de anos atrás.
Apesar de inúmeros outros levantamentos, as reconstruções da era Cenozóica ainda mantinham limitações de resolução temporal e incluíam lacunas. O estudo buscou produzir uma série de dados mais precisa e contínua, aprimorando as informações retiradas de registros paleoclimáticos a respeito do passado terrestre.
Os 4 estados do sistema climático
O trabalho se baseou na análise de fósseis de foraminíferas, um tipo de organismo marinho encontrado nos sedimentos do fundo do oceano. A partir da análise físico-química das foraminíferas, e da datação das camadas de sedimento, produziram-se informações sobre as condições ambientais ao longo de toda a era Cenozóica.
Os resultados foram cruzados com as variações astronômicas históricas da Terra – a precessão e inclinação do eixo e a excentricidade da órbita. Assim, pode-se detectar como o sistema climático respondeu à essas variações, levando-se em conta suas características nos últimos 66 milhões de anos.
Detectaram-se quatro estados gerais dos sistema climático durante a era Cenozóica. Os estados muito quente e quente se estenderam entre 66 e 34 milhões de anos atrás. No estado quente, a temperatura média global era mais de 5°C maior do que no presente. No estado muito quente, entre 56 e 47 milhões de anos atrás, a temperatura média global era mais de 10ºC maior.
Uma transição de grande magnitude marcou o início do estado frio do sistema climático, abrangendo entre 34 e 3,3 milhões de anos atrás. Ele se dividiu em duas fases. A primeira testemunhou a formação da calota polar no leste da Antártica, culminando em um período de temperaturas médias maior. A segunda fase traz um resfriamento e a consolidação da calota polar em toda a Antártica.
O estado glacial emerge quando do desenvolvimento da calota polar da Groenlândia. É quando a tempertura média global atinge os valores mínimos de toda a era Cenozóica, e tem início o ciclo das glaciações.
Resposta diferente, dependendo do estado
Uma hipótese avaliada pelo estudo estabelecia que a resposta do sistema climático às variações nos ciclos astronômicos e às concentrações atmosféricas de CO2 dependeria do estado do sistema climático.
No caso dos ciclos astronômicos, estima-se que cada tipo de ciclo exerça influência no regime da temperatura de diferentes regiões do planeta. A excentricidade dominaria as respostas em latitudes baixas, a precessão, em latitudes médias, e a obliquidade, em latitudes altas.
O estudo identificou que as variações na excentricidade representaram a maior influência sobre as tendências durante os estados muito quente e quente e no início do estado frio da era Cenozóica. Indicava uma forte influência dos processos em baixas latitudes nas variações das condições climáticas globais.
Após a a formação da calota polar da Antártica na segunda fase do estado frio, o ciclo da obliquidade aumenta continuamente sua influência, até dominar as tendências globais. E no estado glacial, com o aparecimento da calota polar da Groenlândia e a diminuição do CO2 atmosférico, amplificou-se a influência dos processos e dinâmicas dos pólos sobre o sistema climático terrestre.
Revelou-se, assim, o papel crítico das calotas polares na história climática da Terra. Elas são titãs que, nos últimos 3,3 milhões de anos, tomaram as rédeas do clima global.
Mais informações: Westerhold, Thomas, et al. “An astronomically dated record of Earth’s climate and its predictability over the last 66 million years.” Science 369.6509 (2020): 1383-1387. O estudo pode ser acessado aqui.
Imagem: adaptado da figura 3 do estudo – gráfico da evolução da temperatura média global nos últimos 66 milhões de anos. As cores mostram os 4 estados do sistema climático terrestre: muito quente, quente, frio e glacial. As barras no alto, à direita, indicam a formação das calotas polares.
Fonte: Ciência e Clima
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