Foto: Bruno Zanardo
Por Alfredo MR Lopes (*)
Há 50 anos, nas turbulências políticas de um Brasil obscuro, e atraídos pelas promessas dos incentivos fiscais em troca do desenvolvimento regional, uma leva de empreendedores paulistas desembarcou na Amazônia. O capital, que daqui migrara com o fim do Ciclo da Borracha, para a economia cafeeira, voltou com o pioneirismo bandeirante a revisitar as oportunidades da Hileia. Com os ganhos e eventuais equívocos na conjugação do empreender que o capitalismo costuma revelar, esse retorno, entretanto, representou um tirocínio de aprendizagem neste secular desafio que a equação meio ambiente e desenvolvimento impõe. O atrativo fiscal, no bojo do Acordo de Washington, era produção de proteína bovina para abastecer o mercado europeu e norte-americano, entre outras commodities e demandas minerais globais.
Esse Acordo, descrito por FHC e Geraldo Müller, em Amazônia, a expansão do capitalismo, liberou incentivos para quem derrubasse 50% da floresta na gleba envolvida para gozar das vantagens fiscais. Isso consumiu 17% da cobertura florestal – e induziu um acertado programa desenvolvimentista: a Zona Franca de Manaus. No Amazonas, há 50 anos, praticamente inexistia projetos agropecuários de monta, por isso os governos da época se empenharam em atrair grupos de empreendedores para expandir um segmento vital para a roda da economia. Foi aí que localizamos o desembarque dos Vergueiro na região, os irmãos o advogado Fernando e o engenheiro agrônomo, Sérgio Vergueiro, que mantinham um escritório de projetos em São Paulo para atender/orientar investidores na região.
Descendentes do português de Traz-Os- Montes, Senador Nicolau Pereira Campos Vergueiro, Doutor em Letras e Leis, pela Universidade de Coimbra, que veio – na migração compulsória da Família Real, no inicio do século XIX – eles herdaram a vocação jurídica e agrícola do bisavô, que estabeleceu uma banca de Advocacia em São Paulo. Ali atuou – como deputado e senador – com José Bonifácio, Feijó, Azevedo Marques, entre outras, para a Independência do Brasil e introdução das ideias liberais que antecederam a República, além de estabelecer no interior paulista, o pioneirismo da colonização agropecuária do café com migrantes alemães e suíços, como forma de combater o regime escravagista, então dominante nos latifúndios do país.
No Amazonas, os Vergueiro adquiriram glebas em Itacoatiara e Itapiranga, hoje Presidente Figueiredo, onde iniciaram, na gestão do governador Danilo Areosa, a pecuária de corte, com duas fazendas inauguradas no governo Henoch Reis. Porém, 15 anos depois, à luz das dificuldades climáticas de adaptação dos parâmetros acadêmicos da ESALQ, Escola de Agronomia da USP, foram convencidos em Itacoatiara, na Agropecuária Aruanã, a abrir mão do pasto e recompor a cobertura vegetal com o plantio de 1,5 milhão de árvores castanheiras, além de outras espécies, e ver inundada a Fazenda Santa Inês, pela maior tragédia socioambiental da Amazônia, o Lago de Balbina.
Com a mudança de paradigma, o ouriço dos Vergueiro trouxe um tesouro biológico multiuso chamado castanha-do-Pará, da Amazônia, do Brasil. Com ajuda de cientistas de peso, tanto da EMBRAPA, como do INPA, USP, Unicamp, e empreendedores do ramo, como Cosme Ferreira, Moisés Israel, no lugar do boi, veio a fixação do carbono, com três milhões de árvores plantadas, selênio para combater Alzheimer- prêmio Jovem Cientista 2015 CNPq – milhões de mudas distribuídas pelo Instituto Excelsa, habitat do primeiro cogumelo comestível do Brasil, o Raphanica, energia de biomassa, a Rede Castanha, de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação, duas dezenas de teses de pós-graduação, e seus insumos já estimulam demandas internacionais da indústria de cosméticos, nutracêuticos e alimentos funcionais, as biomolécula dos resíduos da castanha. “Todas as propriedades bioquímicas da castanha de interesse da Indústria e do mercado estão em seu ouriço”, conclusão dos primeiros estudos do cientista Adrian Martin Pohlit, e de seus pesquisadores no Centro de Biotecnologia da Amazônia. O ouriço dos Vergueiro trouxe à luz o caminho da bioeconomia, o mais coerente, sustentável e promissor legado para esta e futuras gerações.
Publicado Originalmente no site Informoney, 2 jan 2018 09h02
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