A seca que atinge a região amazônica em 2024 já é considerada uma das mais severas da história, confirmando previsões científicas sobre o agravamento das mudanças climáticas. A redução dramática dos níveis de água do Rio Negro atinge, um dos maiores afluentes do Rio Amazonas, tornou-se um símbolo da gravidade da situação. Essa estiagem extrema está impactando não só o meio ambiente e a economia local, mas também o processo eleitoral em comunidades isoladas.
Rio Negro registra o nível mais baixo em 122 anos
O Rio Negro, que desempenha um papel crucial na economia e na vida cotidiana de Manaus e de muitas comunidades ribeirinhas, atingiu um novo recorde de baixa. Em 4 de outubro de 2024, o nível do rio no Porto de Manaus desceu para 12,66 metros, a menor cota desde o início das medições há 122 anos, de acordo com o Serviço Geológico do Brasil (SGB). O recorde anterior, registrado no ano passado, era de 12,70 metros.
Essa marca é mais um indicativo do agravamento da crise hídrica na região. Já no dia anterior, 3 de outubro, o Rio Negro havia registrado 12,68 metros, superando o recorde de 2023. A cada dia, o nível do rio tem diminuído em média 19 centímetros, afetando não só a navegação fluvial, mas também toda a dinâmica social e econômica da região.
Eleições impactadas pela seca
No dia 6 de outubro, quando ocorreram as eleições municipais no Amazonas, a baixa histórica do Rio Negro gerou dificuldades adicionais para cerca de 120 mil eleitores. Em muitas comunidades da região, especialmente as ribeirinhas e indígenas, o transporte fluvial é o principal meio de deslocamento, o que tornou o acesso às urnas extremamente difícil devido à estiagem.
Como medida emergencial, o Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas precisou utilizar helicópteros para garantir o transporte das urnas até 78 locais de votação. Essas seções eleitorais, que atendem a um total de 27.777 eleitores, incluem 30 áreas indígenas com 55 seções eleitorais, somando 12.890 eleitores, de acordo com o jornal O Globo. O uso de transporte aéreo tornou-se essencial para manter a integridade do processo democrático em meio a uma crise climática sem precedentes.
Seca antecipada agrava a situação
A seca deste ano se destaca não apenas pela sua intensidade, mas também pela sua antecipação. Historicamente, a estiagem na região amazônica costuma ocorrer mais tarde, entre outubro e novembro. Em 2023, por exemplo, o nível mínimo de 12,70 metros do Rio Negro foi registrado apenas no final de outubro, enquanto neste ano a cota mínima já foi atingida no início de outubro, quase um mês antes.
Esse agravamento da seca reflete a intensificação dos fenômenos climáticos extremos na Amazônia. Em 2023, a falta de chuvas foi histórica, com o nível do Rio Negro registrando 15,66 metros no final de setembro, antes de atingir o recorde de baixa no final de outubro. Em 2024, o ritmo acelerado da queda do nível do rio, combinado com a redução das chuvas, tem criado um cenário de crise hídrica prolongada.
A seca tem transformado drasticamente o cotidiano de muitas comunidades ribeirinhas que dependem do Rio Negro para atividades econômicas e de subsistência. Na orla do bairro Educandos, uma área portuária na Zona Sul de Manaus, a paisagem é de terra seca onde antes havia água. Raimundo Filho, de 65 anos, chefe de máquinas de embarcações, é um dos trabalhadores que enfrentam dificuldades há mais de dois meses. Ele teve que atracar seu barco em terra firme devido à baixa do rio e, sem acesso à água para atividades diárias, precisou perfurar um poço artesiano improvisado para suprir as necessidades de sua família e de outros trabalhadores locais.
Esse exemplo ilustra o impacto direto que a estiagem tem tido sobre a economia local, especialmente em setores que dependem dos rios para transporte e comércio. A pesca, o turismo fluvial e o transporte de mercadorias também estão entre os setores mais afetados pela crise.
População atingida
Além dos impactos econômicos e sociais, o número de pessoas diretamente afetadas pela seca extrema continua a crescer. De acordo com um boletim da Defesa Civil do Amazonas divulgado em 4 de outubro, 767.186 pessoas foram afetadas pela estiagem, o que representa cerca de 190 mil famílias. Essas populações enfrentam uma série de desafios, desde a falta de acesso à água potável até a interrupção das atividades econômicas que dependem da água dos rios.
A situação é particularmente crítica nas áreas mais isoladas e em comunidades indígenas, onde a seca tem agravado a vulnerabilidade socioeconômica das populações locais.
Os eventos de seca extrema e a antecipação da estiagem na Amazônia são consistentes com os alertas de cientistas sobre o impacto das mudanças climáticas na região. A diminuição das chuvas, combinada com o aumento das temperaturas e a destruição de florestas, tem causado desequilíbrios nos ciclos naturais da Amazônia, exacerbando crises como a que estamos presenciando em 2024.
A continuidade desse cenário coloca desafios significativos para a sustentabilidade da região, exigindo respostas rápidas tanto no nível local quanto no global. As soluções envolvem desde o manejo adequado dos recursos hídricos até políticas mais robustas de mitigação das mudanças climáticas.
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