A imposição de pautas é um dos maiores desafios para diálogos. Enquanto isso, temos deficiência de fiscais do Ministério da Agricultura em Manaus e Itacoatiara. É inacreditável o quanto deliberamos sobre as pautas dos outros. Neste contexto, o programa Diálogos Amazônicos, promovido pela Fundação Getúlio Vargas é uma interessante iniciativa
Por Augusto Rocha
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Os diálogos com a Amazônia são limitados. Tipicamente, o que vemos é a imposição de pautas, onde nem sempre há um interesse real para nós que vivemos na região. A indústria, por exemplo, é o setor da economia de maior importância para o Amazonas. Entretanto, pouco ou nada se verifica para aumentar a competitividade para a infraestrutura de transportes daqui. Se não fossem os esforços dos terminais privados moverem píeres para transbordo em Itacoatiara, estaríamos novamente com um severo problema logístico em Manaus.
A solução mais perene, com hidrovias que sejam o ano inteiro navegáveis ainda não foi estudada. Há uma draga posicionada para fazer uma dragagem na região de restrição de navegação, com a expectativa de que isso resolva o gargalo. Será que resolverá? Só o tempo responderá esta questão. Uma coisa é sabida: ano passado não resolveu – apenas a chuva sanou o problema. Este ano há um equipamento melhor – quem sabe teremos um desfecho alternativo.
A BR-319 é uma rodovia que permite a conexão de Manaus e Boa Vista com Porto Velho e de lá com o restante do país. Ela será recuperada? É provável que sim. Todavia, como ficará a fila de caminhões nas balsas. Atualmente, por menor que seja o tráfego nela, já percebemos o efeito das filas esperando a travessia dos rios em seu percurso. A pequena restrição dos navios de contêineres demonstra a fragilidade da logística amazônica.
Dialogar sobre nossos problemas deveria partir dos nossos anseios e relatos. Entretanto, as soluções da Amazônia são para os outros e dificilmente para nós mesmos. Temos indústrias aqui para atender ao mercado brasileiro, reduzindo os custos de importação. Temos hidrelétricas pelo Norte? Sim, mas elas geram energia para outras regiões do país. Há preocupações com as queimadas? Sim, por conta do aquecimento global e não pelo dano aos nossos pulmões.
Há uma enormidade de oportunidades, mas o debate parte da necessidade dos outros e dificilmente pela perspectiva própria. Há seca? Como fazer a produção chegar para a Black Friday ou Natal? As perguntas são sintomáticas. As perguntas trazem em si uma carga de conceitos e pré-conceitos sobre a Amazônia. Ninguém trará desenvolvimento para cá. Tal qual a destruição não gerará prosperidade para nós.
A questão que precisamos dialogar é sobre quais potenciais e quais necessidades é que temos. Fala-se agora numa rota para o Peru, que sempre esteve por aqui, mas ela renasce para atender a perspectiva do Porto de Chankay. A questão que se analisa é a conexão da Ásia com Manaus ou com o Peru. Pouco ou nada se discute sobre os nossos interesses e se isso é uma alternativa almejada pela região.
A imposição de pautas é um dos maiores desafios para diálogos. Enquanto isso, temos deficiência de fiscais do Ministério da Agricultura em Manaus e Itacoatiara. É inacreditável o quanto deliberamos sobre as pautas dos outros. Neste contexto, o programa Diálogos Amazônicos, promovido pela Fundação Getúlio Vargas é uma interessante iniciativa. Escrevo este texto no contexto de um diálogo sobre as “Rotas de Integração na Amazônia”, que aconteceu na semana passada, via YouTube, comigo e o João Villaverde, Secretário de Articulação Institucional do Ministério do Planejamento e Orçamento. A pauta rompeu esta lógica? Convido os leitores para assistirem ao diálogo no YouTube e constatarem por si.
Augusto Rocha é Professor Associado da UFAM, com docência na graduação, Mestrado e Doutorado e é Coordenador da Comissão CIEAM de Logística e Sustentabilidade
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