A bioeconomia indígena ganha força na Amazônia, onde ferramentas tecnológicas e práticas ancestrais colaboram para o manejo sustentável de recursos naturais, reforçando a economia local e assegurando a conservação ambiental.
A bioeconomia indígena, considerada uma tática fundamental para a defesa da Amazônia, baseia-se numa exploração sustentável da floresta, aproveitando o conhecimento milenar das comunidades que coexistem harmoniosamente com o meio ambiente.
Para Tairene Santos, pertencente ao povo Karipuna e residente na Aldeia do Manga no Amapá, a bioeconomia transcende a noção de uma estratégia econômica. Para ela, representa um estilo de vida que honra e conserva a natureza, ao mesmo tempo que fomenta o crescimento sustentável das comunidades locais. Ela articula uma nova dinâmica entre os conhecimentos tradicionais e a modernidade.
“Para nós, a bioeconomia é o aproveitamento de tudo que a natureza nos oferece de bom.”
Tairene Santos, índigena Karipuna
Técnicas ancestrais e artesanato
Utilizando técnicas passadas através das gerações, as comunidades indígenas extraem da natureza o essencial para sua sobrevivência, enquanto cuidam e revitalizam a floresta, assegurando sua manutenção para o futuro.
O artesanato, como parte integral dessa prática, ilustra a conexão profunda entre os povos indígenas e seu ambiente. “O artesanato é vital para nossa aldeia, não apenas como fonte de renda, mas como expressão de identidade e transmissão de saberes ancestrais. Desde pimentas e açaí até cerâmicas e pinturas corporais, os produtos indígenas representam uma tradição viva e pulsante, conectando profundamente as comunidades às suas raízes”, relata Tairene.
Empreendedorismo e Desenvolvimento Sustentável
Tairene Santos não apenas é artesã e artista, mas também gerencia a loja Empório Uasei, oferecendo produtos das etnias Palikur, Galibimaruor, Kali’na e Karipuna do norte do Amapá.
Esse modelo se apresenta como uma estratégia vital para promover o desenvolvimento sustentável na Amazônia, beneficiando tanto as comunidades locais quanto o meio ambiente. O estudo “Bioeconomia indígena: saberes ancestrais e tecnologias sociais”, conduzido pelos antropólogos indígenas Braulina Baniwa e Francisco Apurinã, enfatiza o papel crucial do território na cosmovisão indígena, destacando atividades como produção e venda de café, cogumelos, pimenta e artesanatos, que não só garantem a segurança alimentar como também geram renda e ajudam na preservação ambiental.
Os pesquisadores reforçam a necessidade de uma participação mais ativa dos povos indígenas no estabelecimento de políticas e estratégias voltadas para a bioeconomia.
A bioeconomia é descrita por Marcelino Carneiro, pesquisador da Embrapa no Amapá, como “a economia da floresta em pé, da sociobiodiversidade amazônica”.
Esta perspectiva holística não só valoriza os produtos oriundos da floresta, mas também as comunidades que dela dependem, enfatizando a conservação dos ecossistemas e o bem-estar das populações locais em detrimento do lucro imediato.
Inovação e sustentabilidade
Inovações como a plataforma Infobee e o aplicativo Manejatech-açaí, desenvolvidos em parceria entre a Embrapa e pesquisadores, se destacam como recursos valiosos na bioeconomia indígena. O Infobee promove a apicultura e meliponicultura, fornecendo informações e orientações técnicas às comunidades indígenas. O Manejatech-açaí, por outro lado, auxilia no manejo sustentável de açaizais nativos, coletando dados sobre produção e comercialização, o que ajuda na preservação de recursos naturais e fortalece a economia local.
Estes aplicativos exemplificam como a fusão de inovações tecnológicas com práticas ancestrais pode fomentar uma bioeconomia sustentável na Amazônia, valorizando os conhecimentos tradicionais para a sustentabilidade regional.
Guardiões
A interação entre o saber científico e o tradicional pode ser decisiva para o desenvolvimento econômico e social da região, protegendo a biodiversidade e respeitando as culturas ancestrais.
Tati Peppe Macuxi, mestra da medicina tradicional indígena da OMIR (Organização das Mulheres Indígenas de Roraima), ressalta a conexão intrínseca entre os elementos naturais e a vida humana, sublinhando que este conhecimento é um legado precioso que é passado de geração em geração. “São experiências vivenciadas e compartilhadas no nosso dia a dia que alimentam a nossa prática de como fazer e conhecer a diversidade e funcionalidade de cada espécie de flora e fauna com a qual convivemos”, afirma ela.
A partir dessas experiências, surge a necessidade de utilizar esses recursos para reforçar o corpo e o espírito, levando à produção de produtos fitoterápicos derivados de elementos da floresta amazônica, como copaíba, jatobá e angico.
Apesar da simplicidade desses processos, os povos indígenas enfrentam obstáculos significativos para acessar políticas públicas devido à burocracia. Marcelino Carneiro enfatiza a necessidade de políticas mais participativas e inclusivas que levem em conta as demandas reais das comunidades indígenas. Ele propõe a criação de políticas, programas e projetos mais envolventes desde o planejamento, incorporando as demandas e experiências das comunidades. “O conhecimento que eles têm do território, dos produtos florestais, das áreas com maior potencial produtivo, de como fazer o manejo e respeitar a floresta para que não haja grandes impactos é essencial para o fortalecimento da bioeconomia inclusiva”, conclui.
Com informações do Uol
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