Em uma ação que visa garantir mais segurança aos povos originários da região amazônica, o governo Lula (PT) reconheceu oficialmente, na última semana, mais duas terras indígenas: Rio Gregório, localizada no Acre, e Acapuri de Cima, no Amazonas. A decisão, que celebra o Dia da Amazônia, chega em um momento crucial para as comunidades que residem nessas áreas, constantemente sob pressão de madeireiros, pescadores e narcotraficantes.
A homologação representa a última fase de um longo e muitas vezes exaustivo processo demarcatório, que pode se arrastar por várias décadas. Para os indígenas, a assinatura presidencial não é apenas um ato formal. Ela confirma seus direitos plenos sobre as terras, garantindo-lhes a posse permanente e o uso exclusivo de seus recursos naturais. Além disso, facilita o acesso a políticas públicas e potencialmente pacifica conflitos territoriais ao assegurar a expulsão de invasores.
Moradores das recém-homologadas terras indígenas estão otimistas
No Amazonas, a comunidade Kokama, situada em uma rota conhecida pelo narcotráfico, vê a decisão como um reforço para a pesca sustentável do pirarucu. Enquanto isso, no Acre, os Yawanawa celebraram com fervor e emoção a regularização. Para eles, a boa nova é um marco em um período que tem sido marcado pelo renascimento cultural, especialmente após enfrentarem longos anos de subjugação nos seringais.
Este ano tem sido promissor para a causa indígena. Com as recentes homologações, já são oito territórios indígenas reconhecidos apenas em 2023. E as expectativas são altas: a gestão Lula prevê a homologação de 14 terras até o fim do ano. Essas ações marcam uma retomada significativa após um período de quatro anos de estagnação nas demarcações durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).
Acapuri de Cima: Da Sustentabilidade à Rota do Narcotráfico
Em um gesto histórico, o presidente Lula homologou a terra indígena Acapuri de Cima, trazendo esperança a cerca de 200 membros do povo Kokama que ansiavam por essa demarcação desde 1991. Situada no município de Fonte Boa, no Amazonas, a área estende-se por 19 mil hectares, abrigando 14 lagos ricos em peixes como tambaqui e pirarucu.
Porém, as ricas águas de Acapuri de Cima também são palco de uma tensa dualidade: enquanto a região se destaca por práticas sustentáveis de pesca, principalmente do valioso pirarucu, também é cruzada por uma das principais rotas do narcotráfico do Brasil. O rio Solimões, que banha a terra, é uma via de transporte para drogas vindas dos países andinos, tornando-se alvo constante dos piratas de rio.
Jocivaldo Kokama, líder da comunidade, desabafa sobre a difícil situação local: “Não tem fiscalização do governo que vai dar apoio para a gente. Só nós mesmo que fazemos isso”. Os desafios não se restringem apenas ao tráfico de drogas. Caçadores e pescadores ilegais também são uma ameaça constante, colocando em risco a vida e os recursos dos Kokama.
Os perigos ficaram evidentes quando Jocivaldo detalhou um episódio ocorrido em agosto. Durante uma atividade de manejo sustentável do pirarucu, o grupo se viu forçado a abandonar o local devido à iminente chegada de piratas armados. “Tivemos que abandonar tudo, deixar tudo para trás”, relata.
A regularização, embora seja uma conquista, é apenas o início de um novo capítulo para os Kokama. Agora, a comunidade espera maior fiscalização e suporte por parte do Ibama, na esperança de que a homologação traga não apenas reconhecimento, mas também segurança.
Rio Gregório: Uma Vitória Contra o Passado de Escravização
A esperada homologação da terra indígena Rio Gregório, que se estende por vastos 187 mil hectares — superando a dimensão da cidade de São Paulo — pôs fim a uma espera de 17 anos de seus aproximadamente mil moradores. Situada próxima à rodovia BR-364, essa rica reserva de fauna, flora e madeiras nobres tornou-se um alvo desejado por madeireiros.
O povo Yawanawá, que há tempos enfrentou a sombria história de escravização nos seringais, vive agora um renascimento cultural. No passado, a resistência dessa comunidade levou à expulsão da Companhia Paranaense de Colonização Agropecuária e Industrial do Acre (Panacre) e dos missionários da Novas Tribos do Brasil na década de 1980. O etnoturismo, centrado em rituais xamânicos com ayahuasca, e as parcerias para produção de artesanato com grandes marcas agora atraem olhares globais.
Na capital, Brasília, enquanto o presidente Lula firmava a homologação, os Yawanawá comemoravam durante o festival Mariri, reafirmando sua cultura e espiritualidade. O líder Yawanawá, Joaquim Tashka, expressou sua gratidão em um vídeo divulgado nas redes: “Muito obrigado, presidente Lula. Você ficará na história do povo Yawanawá”.
Hushahu Yawanawá, pioneira pajé mulher entre os Yawanawá, também expressou sua emoção: “Esse momento foi tão lindo para todo o nosso povo… Agora todas as nossas orações foram realizadas em favor do futuro de nossas crianças”.
Apesar das comemorações, desafios persistem. O Instituto Socioambiental reporta que 32% das 676 terras indígenas do Brasil ainda aguardam homologação. Toya Manchineri, da Coiab, enfatiza a necessidade de maior fiscalização contra invasores.
O panorama político indica progresso na regularização. O presidente Lula já homologou oito das 13 terras identificadas como prontas pela equipe de transição, contrastando com a paralisação de regularizações na gestão anterior. Entretanto, ações judiciais e interesses de grandes fazendeiros e empresas complicam futuras homologações.
Toya Manchineri ressalta: “Já é conhecido que o caminho é a demarcação dos territórios indígenas, pois somos guardiões da biodiversidade e das florestas”. A luta pelo reconhecimento e proteção das terras indígenas, por tanto, continua.
*Com informações Brasil de Fato
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