A ala desenvolvimentista do século passado que integra o governo é defensora ferrenha da Ferrogrão. A polêmica e ambientalmente questionável ferrovia teve a retomada da análise de estudos e processos administrativos relacionados à sua implantação autorizada recentemente pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Há dois anos, Moraes havia concedido liminar determinando a paralisação dos estudos.
A Ferrogrão é uma ferrovia de quase 1.000 km que atravessa Terras Indígenas e Áreas de Proteção ambiental, e por isso é “gentilmente” chamada de “nova Belo Monte”. O UOL traz mais detalhes do projeto. Um deles é que sua implantação pode provocar um desmatamento de 49 mil km2 na Amazônia, mais que a área do estado do Rio de Janeiro. Outro é que ignora ferrovias já implantadas ou com menor impacto de instalação que poderiam cumprir o mesmíssimo papel de escoar a produção agrícola do Centro-Oeste sem causar tanto estrago.
A um custo que pode chegar a R$ 34 bilhões – mais de quatro vezes o projetado –, a Ferrogrão promete reduzir o preço do transporte ao produtor agrícola ao substituir os caminhões que trafegam pela BR-163 pelos vagões da ferrovia.
Com 933 km, ligaria Sinop, no Mato Grosso, a um porto em Miritituba, no Pará. Daí, a carga seguiria de navio para portos da Ásia, África e Europa.
O projeto foi criado (surpresa!) pelo agronegócio. A Ferrogrão foi formulada em 2014 por ADM, Bunge e Amaggi, três das maiores tradings agrícolas em operação no Brasil. Encampado pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT), o projeto ganhou fôlego com Michel Temer (MDB), foi defendido por Jair Bolsonaro (PL) e agora pelo Ministério dos Transportes do governo Lula.
Se sair do papel, a ferrovia pode desmatar 49 mil km² em 48 cidades, segundo a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A área é 64% superior à devastação recorde da Amazônia em 2022, de 17,7 mil km², e também maior que o estado do Rio e países como Eslováquia, Dinamarca e Holanda.
Essa devastação deve emitir 75 milhões de toneladas de carbono. Levando em conta um preço de US$ 25 (R$ 119,95) a tonelada de carbono, o custo das emissões chegaria a R$ 9,2 bilhões.
O Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental da Ferrogrão, feito pela EDLP (Estação da Luz Participações) a pedido das tradings, reconhece que o projeto fica no Arco de Desmatamento da Amazônia, marcado por conflitos fundiários.
A região conta com 102 assentamentos de reforma agrária e 16 Terras Indígenas que não foram consultadas sobre a obra durante a fase de planejamento, como manda a Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Especialistas ainda afirmam que ferrovias em atividade ou em fase de construção serão capazes de transportar a produção agrícola do Centro-Oeste sem a necessidade da Ferrogrão. São elas: Ferrovia Norte-Sul, em funcionamento; Fiol (Ferrovia de Integração Oeste-Leste no Estado da Bahia), prevista para entrar em operação em 2026; Fico, cujo primeiro trecho será inaugurado em 2024, com duas extensões sem previsão de entrega; e Ferronorte (Rumo), que liga o Centro-Oeste ao Porto de Santos e tem extensões adicionais em fase de construção e de estudo.
“A Ferrogrão vai criar pressão para desmatamento e ocupação de produtores de soja perto da ferrovia, porque essa proximidade cortará custos de frete. O objetivo não declarado do projeto é a expansão da área plantada no seu entorno”, esclarece o secretário executivo do GT Infraestrutura e Justiça Sociambiental, Sérgio Guimarães.
Texto publicado em CLIMA INFO
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