A poluição do meio ambiente contribui para o aumento da resistência de micróbios a antibióticos, gerando supermicróbios, afirma relatório de órgão das Nações Unidas
Reduzir a poluição gerada pelos setores farmacêutico, agrícola e de saúde é essencial para reduzir o surgimento, a transmissão e a propagação de supermicróbios – cepas de bactérias que se tornaram resistentes a todos os antibióticos conhecidos – e outros casos de resistência antimicrobiana, conhecida como RAM. Esta é a mensagem chave de um relatório divulgado na última terça-feira (7) pelo PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) sobre as dimensões ambientais da RAM, que já está causando um sério impacto na saúde de humanos, animais e plantas, bem como na economia.
O relatório, Preparando-se para os supermicróbios: fortalecendo a ação ambiental na resposta à resistência antimicrobiana pela abordagem de Saúde Única, foi lançado na Sexta Reunião do Grupo de Lideranças Globais sobre RAM, realizada em Barbados. O documento defende uma resposta multisetorial de Saúde Única. Isto está de acordo com o trabalho da Aliança Quadripartite, formada por PNUMA, FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), OMS (Organização Mundial da Saúde) e WOAH (Organização Mundial de Saúde Animal).
“A atual crise ambiental é também uma crise de direitos humanos e geopolítica – o relatório de resistência antimicrobiana publicado hoje pelo PNUMA é mais um exemplo de iniquidade, na medida em que a crise da RAM está afetando desproporcionalmente os países do Sul Global”, disse a primeira-ministra Mia Amor Mottley, presidente do Grupo de Lideranças Globais sobre RAM. “Devemos permanecer focados em reverter a maré nesta crise, aumentando a conscientização e colocando este assunto de importância global na agenda das nações em todo o mundo”.
O desenvolvimento e a propagação da RAM ocorre quando os medicamentos antimicrobianos usados para prevenir e tratar infecções em humanos, animais e plantas perdem sua eficácia, e a medicina moderna perde a capacidade de tratar até mesmo infecções leves.
A resistência antimicrobiana está na lista da OMS como uma das 10 principais ameaças globais à saúde. Estima-se que em 2019, 1,27 milhões de mortes foram atribuídas diretamente a infecções resistentes a medicamentos em todo o mundo, e 4,95 milhões de mortes em todo o mundo foram associadas à RAM bacteriana (incluindo aquelas diretamente atribuíveis à RAM).
Estima-se que a RAM cause 10 milhões de mortes diretas adicionais a cada ano até 2050. Isto equivale ao número de mortes causadas globalmente pelo câncer em 2020.
O custo econômico da RAM deve resultar em uma queda do PIB de pelo menos 3,4 trilhões de dólares ao ano até 2030, empurrando mais 24 milhões de pessoas para a pobreza extrema.
A tripla crise planetária implica em temperaturas mais altas e padrões climáticos extremos, mudanças no uso do solo que alteram sua diversidade microbiana, assim como poluição biológica e química. Tudo isso contribui para o desenvolvimento e a disseminação da RAM.
“A poluição do ar, do solo e dos cursos d’água mina o direito humano a um ambiente limpo e saudável. Os mesmos fatores que causam a degradação do meio ambiente estão agravando o problema da resistência antimicrobiana. E os impactos da resistência antimicrobiana podem destruir nossa saúde e nossos sistemas alimentares”, disse Inger Andersen, Diretora Executiva do PNUMA. “A redução da poluição é um pré-requisito para mais um século de progresso rumo à fome zero e à boa saúde”, completou.
O relatório destaca um conjunto abrangente de medidas para enfrentar tanto o declínio do meio ambiente quanto o aumento da RAM, especialmente ao abordar as principais fontes de poluição provenientes de saneamento básico deficiente, esgoto, resíduos comunitários e municipais.
Para prevenir e reduzir tais poluentes, é crucial:
- Criar marcos robustos e coerentes de governança, planejamento, regulamentação e legislação a nível nacional, e estabelecer mecanismos de coordenação e cooperação;
- Multiplicar os esforços globais para melhorar a gestão integrada dos recursos hídricos como promover o abastecimento de água, o saneamento e a higiene, com o objetivo de limitar o desenvolvimento e a propagação da RAM no meio ambiente, bem como para reduzir as infecções e a necessidade de medicamentos antimicrobianos;
- Estimular que países integrem um enfoque ambiental aos Planos de Ação em nível nacional relacionados com o meio ambiente, por exemplo: programas nacionais de gestão de resíduos e poluição por químicos, planos de ação em matéria de biodiversidade nacional e planejamento frente à mudança climática;
- Estabelecer padrões internacionais relativos a indicadores microbiológicos adequados de RAM a partir de amostras ambientais, que podem ser usados para orientar a tomada de decisão a fim de reduzir riscos e criar incentivos eficazes para implementar os padrões;
- Explorar opções para redirecionar investimentos, estabelecer incentivos e esquemas financeiros novos e inovadores, bem como justificar o investimento no sentido de garantir financiamento sustentável, incluindo a alocação de recursos internos suficientes para enfrentar a RAM.
- Reforçar o monitoramento e a vigilância ambiental, bem como priorizar a pesquisa para fornecer mais dados e evidências que fundamentem melhores intervenções.
A RAM requer uma resposta de Saúde Única que reconheça que a saúde das pessoas, dos animais, das plantas e do meio ambiente estão intimamente ligados e são interdependentes. A prevenção está no centro da ação necessária para deter o surgimento da RAM e o meio ambiente é uma parte fundamental da solução. O fortalecimento abrangente e coordenado da ação ambiental na resposta de Saúde Única à RAM reduzirá o risco e a carga da resistência antimicrobiana sobre os seres humanos e a natureza, bem como ajudará a enfrentar a tripla crise planetária.
Fonte: CicloVivo
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