Ex-ministro do meio ambiente, entre 2019 e 2021, Ricardo Salles concedeu entrevista ao Pânico onde não poupou farpas aos seus opositores, elogiando apenas Tiririca
Embalado pela onda do bolsonarismo e conservadorismo que mostraram força no primeiro turno das eleições de 2022, Ricardo Salles voltou à cena política, desta vez como deputado federal pelo Partido Liberal de São Paulo. Cargo que já tentou em outra eleição (2018), sem muito sucesso e apenas 36 mil votos.
Com a quarta maior votação em São Paulo para a Câmara dos Deputados, 640 mil votos, o triplo de sua antagonista Marina Silva, Salles concedeu entrevista, nesta quarta-feira (5), ao programa Pânico, onde explicou a sua tese sobre o seu triunfo nas urnas.
Além de falar de sua votação, Salles não poupou nenhum desafeto de críticas e palavrões. A entrevista contou com uma série de alfinetadas indo do empresário João Paulo Lemann – acusado de dupla personalidade; a direção do partido Novo – do qual fez parte e considera hoje ser formada por uma elite esquerda gourmet que são Marinas Silvas de laranja; Felipe D’Avila – o candidato do Novo que teve menos votos que Salles para presidente; seu antigo padrinho político e vice de Lula, Geraldo Alckmin; o general Santos Cruz – rompido com Jair Bolsonaro; disparando também contra jornalistas, como Reinaldo Azevedo.
Nem o presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro, foi poupado. Segundo Salles, ele deveria ter pedido desculpas por suas falas debochadas durante a pandemia. O único elogio amplo foi para o reeleito deputado federal Francisco Everardo, o Tiririca.
Nenhum dos entrevistadores do Pânico questionou o ex-ministro sobre o aumento recorde das queimadas em sua gestão na pasta do Meio Ambiente, tão pouco sobre as acusações judiciais às quais ele responde por envolvimento com crimes ambientais.
O máximo que se chegou perto de tais temas foi quando Emílio Surita o questionou sobre a diferença entre sua votação e a de Marina Silva. “Como pode ser você, um cara condenado. Ninguém aqui quer destruir a Amazônia. Como pode essa sua votação ser maior que a de Marina Silva?”
Sem medir palavras, Salles disparou contra a também ex-ministra. “Ela é tão querida na Amazônia que não consegue se eleger no Acre e vem se eleger aqui com apoio da Neca Setúbal (uma das herdeiras e acionistas do Banco Itaú). Esses caras precisam parar de encher o saco”, disse.
Para Salles, o erro de Marina foi não ter reconhecido o verdadeiro problema ambiental do país, que não seria a Amazônia, e sim o saneamento.
“A explicação decorre do seguinte ponto, a Marina (Silva) tem um discursinho frouxo e inconsistente. De falar da Amazônia e num sei o que, mas quando você olha o que ela deixou na Amazônia é uma população de 25 milhões de brasileiros na miséria e sem saneamento, que ela nunca se preocupou em fazer. Sem arrumar os lixos e resíduos sólidos. Nunca se preocupou em fazer. Essa turma é boa de pegar o jatinho de luxo do dono do creme de mão e fazer palestra em Paris, e voltar. Deixou um país sem saneamento.
Quem aprovou o saneamento no Brasil, apesar do voto contrário desta turma? Fomos nós, eu era ministro do meio ambiente, Rogério do Desenvolvimento Regional e Bolsonaro presidente. E graças a nós está sendo feito um investimento de mais 100 bilhões de reais em saneamento no país em curto espaço de tempo”.
Salles acerta ao dizer que o país precisa de saneamento. Mas, segundo os milhares de cientistas do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC/ONU), reduzir o desmatamento na Amazônia é a prioridade ambiental do Brasil para um futuro com qualidade de vida para todos.
Ricardo Salles também se esqueceu (ou desconhece) que na verdade a lei ( nº 12.305) que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, uma das mais importantes legislações ambientais do Brasil e que ordena o saneamento, não foi criada por Jair Bolsonaro. A lei é de 2010, e surgiu durante a gestão do petista Lula, sendo resultado dos debates da Rio-92, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de 1992.
O que foi feito na gestão de Bolsonaro foi o novo marco legal do saneamento básico, instituído pela Lei nº 14.026/2020, que deu a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) a competência de editar normas de referência para o setor de saneamento. A lei também trouxe a meta de garantir que 99% da população tenha acesso à água potável e 90% disponha de coleta e tratamento de esgoto até 2033
Segundo dados do Instituto Trata Brasil, até 2022, o país ainda esta bem longe da meta. A ausência de acesso à água tratada atinge quase 35 milhões de pessoas e 100 milhões de brasileiros (quase a metade da população) não têm acesso à coleta de esgoto, refletindo em centenas de pessoas hospitalizadas por doenças de veiculação hídrica.
Outra tese defendida pelo novo deputado federal para explicar a impopularidade ambiental de Jair Bolsonaro, apesar de seus grandes feitos como resolver o saneamento no país, seria a falta de assessoria de imprensa.
Desta vez, o vilão seria o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ministro da secretaria de Governo até junho de 2019, quando deixou o governo rompido com o presidente.
“A comunicação é muito sensível. Quando entramos, a mentalidade do nada presta teve na parte de comunicação uma pessoa que era o Santos Cruz, que chegou lá e disse que estava tudo errado. Ele supôs que todos os contratos eram superfaturados e era besteira gastar esse dinheiro com comunicação, era frescurite.
Santos Cruz disse: – ‘Vamos tirar todos os contratos, de propaganda, de relações públicas, de assessoria de imprensa, de tudo’’. E cortou tudo, do dia pra noite. E disse que a solução era colocar um general na comunicação. Foi uma puta de uma besteira. O que aconteceu? Tirou todos os instrumentos de comunicação e colocou gente que não entende nada e só sabe ler a ordem do dia. Hoje é dia de Dom Pedro I!”, resumiu Salles que afirmou que pela burocracia o governo de Jair Bolsonaro teria permanecido três anos sem assessoria de imprensa.
Na entrevista, com mais 867 mil espectadores, Ricardo Salles afirmou que a grande maioria das críticas que recebeu por sua gestão à frente do ministério do meio ambiente teria vindo de uma elite com tendências à esquerda.
“A turma do patinete elétrico que almoça no Manioca (restaurante dos Jardins em São Paulo) e fica enchendo o nosso saco, esses caras perderam as eleições. Todos os candidatos que eles queriam boicotar ganharam”, rebateu.
O novo deputado , que irá participar de votações de muitos projetos de leis do desmonte ambiental que tramitam no Congresso, também afirmou que a economia da floresta em pé, defendida inclusive no plano de governo de Jair Bolsonaro – que se comprometeu a promover sustentabilidade na Amazônia, não existe.
“O grande discurso dela (Marina Silva) é o grande discurso da elite. Eu fui pra Xapuri, na Reserva Chico Mendes (no Acre). Lá moram cinco mil pessoas e os caras odeiam a Marina. Eu achei que seria linchado lá. Mas os caras odeiam ela. Juntamos 300 líderes dos caras e eles disseram: ‘Nós não aguentamos mais esse discurso da Marina de florestania, de que temos que viver de seringueira e castanha. Nós queremos ter gado de leite, piscicultura, café. Não é que o cara quer plantar maconha ou AR15, cocaína e sei lá o que.
O cara quer gado de leite e piscicultura, mas a turma da esquerda que fiscaliza esses lugares não deixa. Diz que o cara tem que viver da floresta para comprovar a tese da florestania. Ou seja, você vai se ferrar aqui no meio da mata pra vender essa imagem bonita lá pra fora, e o povo que se dane”, concluiu.
Apesar da bancada do PL ter grande parte dos parlamentares mais votados entre os paulistas, o líder de votos por São Paulo foi Guilherme Boulos, do Psol, com um milhão de votos. Também se elegeram entre os quinze mais votados pelos no estado, Marina Silva (REDE), a trans Erika Hilton e Samya Bonfim, ambas do PSOL. O partido, aliás, teve um crescimento de representatividade na Câmara Federal, somando ao PT uma base de 94 parlamentares, ficando atrás apenas do PL, com 99 cadeiras. A indígena, Sônia Guajajara, também foi eleita por São Paulo, com expressivos 150 mil votos.
Ao ser questionado se concorda com as teses de alguns comentaristas políticos que alegam falta de inteligência do brasileiro na escolha nas urnas, Salles rebate que não concorda. Segundo o ex-ministro, seus votos expressivos seriam fruto de mudanças e avanços na conscientização do eleitor.
“O Tiririca, por exemplo, é um cara que fez os vídeos mais engraçados da eleição. Por que a turma votou no Tiririca? Porque a pessoa se identifica com o Tiririca. Um cara simples, fala o que pensa, e daí o cara pensa, eu também queria ser um Tiririca e votar nele. Você viu o cara imitando o Roberto Carlos? -Cala boca bicho, Tiririca 2255, pora, é engraçado pra caralho.”, conclui.
Fonte: O Eco
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