Instituições estão nascendo no Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP para propor soluções para os problemas da Amazônia
Texto: Luiz Roberto Serrano
Confidência do Itabirano, A Montanha Pulverizada, O Maior Trem do Mundo e Lira Itabirana, de Carlos Drummond de Andrade; A Queda do Céu, de Davi Kopenawa e Bruce Albert; Ideias para Adiar o Fim do Mundo, de Ailton Krenak.
A leitura de trechos dessas obras, que relatam a perplexidade de seus autores diante de ações humanas que prejudicam o meio ambiente e apontam para a destruição de paisagens tão prezadas pelos serem humanos, criou o ambiente para o seminário Antropoceno e o Paradigma Ambiental Brasileiro, cujo conferencista foi o cientista ambiental Carlos Nobre, do Instituto de Estudos Brasileiros da USP, entre outras inúmeras atividades, mundialmente reconhecido como defensor da preservação da Amazônia.
O professor Carlos Nobre fez uma ampla e detalhada apresentação sobre o difícil momento que a Amazônia atravessa, em função do processo de devastação por causa da mineração e da criação de gado predatórias e chamou a atenção para o perigo iminente de savanização da sua região sul – exposição que pode ser acompanhada, em detalhes, no vídeo que acompanha este texto.
Vale registrar que, em sua apresentação, Nobre anunciou a criação, no âmbito do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, de importantes instituições para debater e encaminhar propostas para o crescimento econômico sustentável da Amazônia, por caminhos diferentes das atuais práticas predatórias e destrutivas. Trata-se de juntar “os conhecimentos científicos mais os tradicionais da região” como bases para o crescimento sustentável da Amazônia.
“Uma forma da USP dialogar sobre as questões centrais brasileiras”
Nobre apresentou várias iniciativas que já estão em andamento no IEA da USP, como o Instituto de Tecnologia da Amazônia – AMIT, o Instituto Amazônia 4.0, um centro de pesquisas que vai se concentrar no estudo de aproveitamento e industrialização de vários produtos da natureza, a Amazon Rainforest Business School, com cursos de graduação e pós-graduação, além dos Laboratórios Criativos da Amazônia para pesquisar novas forma de aproveitamento sustentável da riqueza amazônica.
Trata-se de uma série de iniciativas que, se viabilizadas, fornecerão conhecimento, meios e ferramentas para mudar de patamar as perspectivas de desenvolvimento da região amazônica. A destruição sairia do cenário futuro, dando lugar ao tão almejado crescimento sustentável e a favor da população local.
Envolvimento, não desenvolvimento
“Do jeito que está não pode ficar”, conclamou, por sua vez, a líder indígena Sônia Guajajara, “é preciso entender o papel dos povos e dos territórios indígenas”. De acordo com ela, o governo federal está gerando legislações – e conseguindo aprovação – que tornam legais práticas que eram ilegais, abrindo as terras indígenas a explorações e ameaças que antes não existiam.
Guajajara abriu polêmica em torno do uso da palavra “desenvolvimento” como designação da evolução social e econômica das áreas indígenas. Para ela, a palavra conota um tipo de progresso de caráter urbano, capitalista. No seu entender, seria mais adequado o uso da palavra “envolvimento” para caracterizar a aproximação entre os habitantes das áreas urbanas e os indígenas. O envolvimento facilitaria, e até estimularia, o conhecimento e a compreensão da problemática indígena junto aos habitantes das cidades. Referindo-se ao agronegócio, um dos temas que surgiram nos debates, fez uma boutade: “O problema do agronegócio não é o agro, é o negócio”.
Por sua vez, o professor do Instituto de História, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, José Augusto Pádua, fez uma arguta observação quanto ao atual desmantelamento da Amazônia: “Essa é uma questão interna, que nós mesmos temos que resolver. Não há que esperar decisões vindas de fora”.
Para a professora Tereza Campello, professora visitante da Faculdade de Saúde Pública da USP e ex-ministra de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, tão preocupante quanto a questão da Amazônia é a da alimentação da população brasileira. De um lado, são 125 milhões de brasileiros que convivem com algum grau de insegurança alimentar, sendo que 33 milhões sofrem de fome. A qualidade da alimentação no País, na sua visão, deixa a desejar. “O Brasil aumenta a produção de soja, voltada para a exportação, mas cada vez menos a de arroz, feijão”, constata ela.
Assista à íntegra da conferência a partir do momento 10:08:14.
Originalmente publicado pelo: JORNAL DA USP
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