Acordo de cooperação entre Instituto de Geociências da USP e Polícia Federal busca combater o narcotráfico, identificando área de produção e trajeto aos portos do Brasil
O Instituto de Geociências da USP assinou um acordo de cooperação com a Polícia Federal para auxiliar a instituição a identificar a origem e as rotas do tráfico de drogas desde a produção em países andinos até o Porto de Santos. Por meio de análises geoquímicas e técnicas de palinologia, pesquisadores da USP e da Unesp e peritos da Superintendência da Polícia Técnico-Científica de São Paulo e da Polícia Federal de três estados trabalham na determinação dos sinais de vegetação local impregnados na droga e suas embalagens, para fins da geolocalização.
A parceria foi oficializada no dia 07 de dezembro de 2021 e deverá dar início, também, a pesquisas envolvendo contrabando de metais preciosos. Mas, o objetivo central é o combate ao narcotráfico nos países sul-americanos.
O trabalho de pesquisa se fundamenta no doutoramento de Cyntia Ramos, aluna do IGc que já investiga, desde o mestrado, o potencial forense de grãos de pólen e esporos para auxiliar a perícia brasileira. Ela é uma das autoras do acordo de cooperação, que tem como objetivo de longo prazo “elaborar protocolos para que a polícia passe a utilizar a palinologia como ferramenta de auxílio na determinação da origem dessas drogas”.
A mestre em palinologia forense acredita que a aproximação com a polícia e o trabalho minucioso de identificação do pólen de plantas possibilitará um resultado preciso e confiável para a pesquisa.
“Considero o principal desafio a metodologia em si, por ser bem recente a aplicação forense da palinologia em drogas e um projeto pioneiro no Brasil. Por isso é importante que o nosso trabalho no Instituto esteja alinhado com as expectativas da PF, assim como o próprio trabalho em si de liberação dessas amostras para fins acadêmicos”, diz.
É importante salientar que nenhuma droga é encaminhada à Universidade. Os pesquisadores se dirigem até as dependências da polícia para extrair o pólen e realizam as análises microscópicas em laboratório.
Sinal invisível
O Porto de Santos, localizado no litoral do estado de São Paulo, é o maior e mais importante porto da América Latina. Sua localização e atividade intensa o torna um ponto estratégico para o narcotráfico internacional, com origem nos principais países produtores de droga na América do Sul, como Colômbia, Bolívia, Peru e Paraguai, em direção à Europa, África e América do Norte.
Após a produção, a droga passa, entre outros trajetos, pela denominada “Rota Caipira”, em localidades frequentemente ermas de estados como Acre, Rondônia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins e Goiás. De lá, segue normalmente para as cidades do interior de São Paulo e de Minas Gerais, antes de ser embarcada no porto. A Polícia Federal, que é responsável pela apreensão e combate ao tráfico internacional, já tem dedicado esforços para conhecer e descrever o perfil químico da droga. No entanto, para sua investigação é necessário determinar as áreas produtoras dessa droga e as novas rotas de tráfico dentro do território brasileiro.
“A droga é feita em condições precárias, em florestas, porque é tudo muito escondido; tem rastreamento, muitas vezes, feito por satélite. Mas essas condições naturais de produção nos ajudam, porque as informações da vegetação local acabam indo para a droga”, conta Paulo Eduardo De Oliveira, professor do IGc e pesquisador associado do The Field Museum of Natural History, de Chicago, nos Estados Unidos. Ele explica que por meio de um sinal polínico – a assinatura deixada pelo pólen de fontes locais e regionais – é possível identificar tanto o local de cultivo das plantas, quanto a área de processamento da droga.
“Nossos testes mostraram que o pólen está tão bem preservado que não afetou o sinal. Tem pólen que vem da redondeza, de encostas, de plantas que estão crescendo perto e até junto das folhas que são colhidas. Aparece um sinal de plantas das áreas de cultivo e essas fabriquetas acabam recebendo grãos de pólen até da chuva, que contaminam e eles não sabem, porque é tudo microscópico”.
No entanto, a evidência do pólen se desdobrou em um conjunto de desafios a superar para chegar ao endereço correto do tráfico na América do Sul que utiliza o Brasil como principal rota de exportação para a Europa. Para isso, a ideia é buscar respostas não só no conteúdo de tabletes apreendidos, mas também das embalagens.
“Muitas vezes eles vêm com areia, argila e na geologia nós temos técnicas de proveniência para saber se é típica de Rondônia, Mato Grosso… Então nós vamos juntar várias técnicas, examinar o solo, sedimento, areias e atacar o problema em várias frentes para responder qual a origem e qual a rota”, diz Oliveira.
Fonte: Jornal da USP
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