A estrutura da economia ilegal – que inclui o tráfico de drogas – da região fortalece os crimes ambientais como desmatamento e garimpo, segundo Fórum Brasileiro de Segurança Pública
A violência crescente e as progressivas altas nos números de desmatamento e queimadas na Amazônia têm mostrado aos brasileiros e ao mundo que a ilegalidade é uma constante na floresta tropical. Números apresentados na última quarta-feira (26) pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) durante o evento “Amazônia é Solução”, realizado pelas redes Uma Concertação pela Amazônia e Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS), deixou mais clara essa realidade de terra sem lei no bioma.
Segundo Renato Sérgio de Lima, diretor-executivo do FBSP, em 2021, foram produzidas no mundo 2 mil toneladas de cocaína. As estimativas da Polícia Federal brasileira e do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) é que metade desse total passe pelo Brasil, sendo 40% pela Amazônia.
“Se descontarmos o que foi apreendido em 2021, passa pelo Brasil, sem ser apreendido, cerca de 710 toneladas de cocaína. Usando valores de referência da Europa, que é a principal rota [da droga], estamos falando de um valor equivalente a 4% do PIB brasileiro. Não estaríamos errando muito em dizer que isso significa um setor da economia do tamanho do pré-sal brasileiro”, disse, durante evento realizado na capital paulista.
A relação desta “economia” citada por Lima com crimes ambientais é direta. Criminosos ambientais se beneficiam do dinheiro de drogas que circula no bioma e as rotas da droga se beneficiam dos crimes cometidos contra o bioma.
“A economia gerada pela ilegalidade, e que muitas vezes é potencializada pelo crime ambiental, pelo desmatamento, pelo garimpo ilegal, hoje tem um peso na economia do Brasil e da região que é muito significativa”, diz ele.
Para Lima, se as questões de segurança pública não forem resolvidas no bioma, avançar os esforços para implementação da economia baseada em produtos florestais e outras alternativas de preservação será infrutífero.
Policiais no Bioma
No Brasil como um todo existe um perito criminal das polícias civil e militar para cada 720 pessoas. Na Amazônia Legal, esse número é quatro vezes menor: um perito para cada 2.960 pessoas.
O perito é o profissional que vai poder provar que um crime aconteceu, nas condições técnicas que possam garantir que o Judiciário decida e eventualmente puna o infrator.
Nas outras carreiras policiais a situação também não é diferente: em toda Amazônia Legal, existem 59 mil policiais militares e apenas 1.200 delegados de polícia. Isto é, um policial para cada 474 pessoas e um delegado para cada 23 mil pessoas.
“Em Rondônia são 158 delegados da polícia civil para o estado todo. Esse número é insuficiente para eu garantir, por exemplo, plantão 24 horas. E esse profissional é necessário para atender desde o crime ambiental à violência doméstica, todos os crimes possíveis”, diz o diretor do Fórum de Segurança Pública.
No Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2022, a Amazônia é tratada como “síntese da violência extrema”. Segundo a publicação, o bioma é um exemplo nítido de como o modelo de segurança pública do Brasil é obsoleto e distante de oferecer respostas adequadas à realidade do cotidiano da população – e de sua flora e fauna.
“O desmatamento, o garimpo ilegal, a corrupção, a criminalidade e a intensa presença de milícias e facções do crime organizado, com mais de duas dezenas de organizações regionais e duas grandes organizações nacionais (PCC e Comando Vermelho) que disputam as principais rotas nacionais e transnacionais de narcotráfico, transformaram a Amazônia brasileira em palco de guerras que impactam fortemente os índices de violência letal em toda a região e do país”, diz trecho da publicação.
Essa situação de falta de segurança se potencializou com as ações do atual governo Federal, diz Lima, que estimula a posse de armas, o garimpo e o desmatamento. Para exemplificar, ele citou o número de armas apreendidas do bioma: em 2018, o Comando Militar da Amazônia apreendeu 150 armas; em 2021 foram apenas 5 apreensões.
“A questão de segurança pública não é um problema de polícia exclusivamente, é um problema de garantir Estado de Direito. No momento que você tem uma política como a do atual governo, todas as instituições que garantem o mínimo de enforcement na região vão partir cada uma para um lado, e daí você não tem Estado de Direito”, diz ele.
Dadas as grandes extensões do território amazônico e falta de efetivo, ele propõe como uma das soluções a gestão compartilhada e interestadual entre as polícias dos estados amazônicos. Isso resolveria problemas de deslocamento e tempo: para crimes ocorridos no sul do Amazonas, por exemplo, onde as estruturas deste estado têm dificuldade de acessar, a polícia de Rondônia poderia garantir a segurança em uma uma eventual situação conflagrada.
Esta e outras questões de segurança são tratadas no documento “100 primeiros dias de governo – proposta de uma agenda integrada das Amazônias”.
Fonte: O Eco
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