René Descartes pode facilmente ser considerado uma das figuras de maior influência na filosofia do Ocidente, e sua obra é bastante destacada devido à nova linha de pensamento e metodologia científicas que proporcionou — incluindo a “dúvida cartesiana”, que seria uma forma de alcançar a verdade sem a influência dos sentidos ou dos pensamentos.
René Descartes nasceu na França, em 1596. Ele foi educado seguindo os princípios jesuítas vigentes na época, e aprendeu latim, grego, a matemática e filosofia clássica. Inicialmente, ele pensou em se tornar advogado para seguir os passos de seu pai, mas aos 20 anos, deixou o curso de Direito para viajar. Depois, durante uma breve atuação no exército, ele decidiu que iria se dedicar a desconstruir as verdades que aprendeu para recriar este conhecimento em uma base mais sólida.
Ele trouxe essas ideias para a primeira parte do livro “Discurso sobre o Método”, publicado em 1637: “desisti completamente do estudo das humanidades e decidi não procurar mais nenhuma outra ciência além daquela que poderia ser encontrada em mim mesmo, no grande livro do mundo”, escreveu. Na obra, criada a partir de alguns sonhos que teve, o autor apresenta um modelo para conduzir o pensamento humano conforme a certeza, uma característica intrínseca da matemática. Assim, ele descreve quatro regras principais que, se seguidas, iriam levá-lo sempre a conclusões verdadeiras.
A dúvida cartesiana e busca pela verdade
Se você já questionou de que forma as opiniões e até as ambiguidades podem afetar as pesquisas científicas realizadas hoje, saiba que foi exatamente isso que Descartes buscou enfrentar. Em linhas gerais, ele rejeitava a noção de que tudo poderia ser determinado simplesmente pela análise lógica, sem juntá-la às observações ou experimentos. Assim, ele buscou formas de eliminar a ambiguidade, incerteza e dependência da autoridade na metodologia que criou.
As regras apresentadas no livro começavam com a dúvida cartesiana, que é um dos principais pontos de sua obra: aqui, a ideia principal era adotar a dúvida de tudo, ou seja, jamais aceitar nada como verdade a não ser que fosse possível ter certeza e clareza de que realmente se tratava de algo verdadeiro — e, aqui, “tudo” inclui até mesmo o que os sentidos físicos e pensamentos indicavam. Ao aplicar a dúvida de tudo, Descartes chegou a uma verdade fundamental: ele existia, e isso era algo que não se podia duvidar. Portanto, só podia ser verdade.
O filósofo expressou este pensamento no preceito “penso, logo existo”, um dos mais famosos de sua obra. Ele percebeu que, de fato, os sentidos podem enganar e os pensamentos também; afinal, não é raro que o que pensamos nos sonhos pareça tão real quanto aquilo que vem em mente enquanto estamos acordados. Assim, considerar que qualquer crença que desse abertura para alguma dúvida, por menor que fosse, ele buscou abrir caminho para uma busca pela verdade que fosse livre de qualquer tipo de ideia concebida previamente.
Descartes planejava publicar “O Discurso do Método”, mas soube da condenação de Galileu pela Inquisição pela heresia de defender e divulgar as ideias copernicanas, que colocavam a Terra e os demais planetas na órbita do Sol. Ele percebeu que sua obra poderia causar atritos semelhantes e, no fim, o livro foi publicado mais de dez anos depois de sua morte — e inclusive foi um dos itens de uma lista de obras proibidas pelo Papa, em 1663. Hoje, o “Discurso sobre o Método” é um dos trabalhos mais influentes na história da ciência, além de alguns autores o considerarem um marco do início da Revolução Científica.
A influência cartesiana na ciência
As contribuições de Descartes não se restringem somente à filosofia, mas se estendem à física também, já que ele apresentou as leis da óptica geométrica da reflexão e refração em uma publicação. O autor demonstrou como as lentes do olho humano, conforme a lei da refração propõe, focam a luz refletida pelo objeto observado, para depois formar a imagem na retina. Além disso, ele estudou o comportamento dos raios de luz e como a forma das lentes podem afetar as imagens formadas, e publicou suas ideias sobre como o conhecimento dos padrões e regularidades do mundo sensível poderiam ser usados para criar telescópios e lentes que corrigem defeitos da visão.
Estes conhecimentos sobre os padrões poderiam ser usados não só para explicar a observação de objetos, mas também para a exploração científica, como acontece com os estudos feitos com telescópios, e para melhorar a vida das pessoas, como é o caso das lentes corretivas. Descartes também tinha conceitos próprios para a mecânica, mas o problema é que eles interferiam no entendimento que ele buscava ter da óptica.
No fim, tanto os “problemas” com conceitos da óptica e da mecânica precisaram esperar pelas soluções trazidas por Isaac Newton, outro grande nome da ciência. Hoje, a ciência não é mais vista como algo definitivo e incorrigível. Descartes considerava a área como uma grande empreitada humana, em que a busca pela verdade dependia da observação e dos experimentos — e essa é uma visão que segue conosco até hoje, assim como a concepção de que o caminho até a verdade precisa ser percorrido através dos testes de hipóteses e da eliminação do que não for verdadeiro por meio de experimentos. Estas ideias foram compartilhadas com o filósofo e cientista Francis Bacon.
Por fim, vale destacar também o legado cartesiano que continua conosco na matemática não somente como um direcionamento, mas também como uma das ferramentas necessárias para o trabalho dos matemáticos — um exemplo disso é o sistema de coordenadas cartesiano, muito utilizado na geometria analítica. Muito disso vem da obra filosófica que tem, que definiram o trabalho cartesiano na álgebra e na geometria.
Fonte: CanalTech
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