O fungo brusone se multiplica em países de clima tropical e subtropical devido à altas temperaturas e umidade. O estudo foi realizado pelo Centro Internacional de Melhoramento de Milho e Trigo, que contou com a participação de pesquisadores do Brasil, Estados Unidos, México, Alemanha e Bangladesh
As mudanças climáticas estão acelerando a proteção do fungo Pyricularia oryzae Triticum, causador da brusone, uma doença destrutiva que ameaça plantações de trigo e outros cereais, como o arroz. A conclusão veio de um estudo publicado pela revista Nature , programado por pesquisadores de cinco países, incluindo Brasil e Estados Unidos. Com o aquecimento global, áreas até então protegidas, como regiões frias e com baixa umidade, estão se tornando propícias ao ataque deste fungo, colocando em risco milhões de hectares de plantações.
A Pyricularia oryzae ataca tanto as folhas quanto as espigas do trigo, resultando em perdas que podem chegar a 100% em plantações afetadas. Mais preocupante é a previsão para 2050: estima-se que cerca de 13,5 milhões de hectares estejam sob risco, levando a uma queda global de 13% na produção de trigo, o que representa uma perda de 69 milhões de toneladas anuais.
Expansão global e ameaça ao comércio
O fungo já é conhecido por se espalhar de forma eficaz através do vento e pelo comércio internacional, onde sementes e microrganismos infectados podem contaminar novas áreas. No Brasil, o fungo foi detectado pela primeira vez em 1985, no Paraná, e rapidamente se considerou por outros estados produtores. Atualmente, regiões como o Rio Grande do Sul enfrentam surtos regulares, especialmente em anos com temperaturas de inverno mais altas, como o ocorrido em 2023, quando as temperaturas não baixaram de 15ºC.
Estudos projetam que o fungo pode expandir seu alcance para quase todos os continentes, com exceção da Antártida, onde não há plantações de cereais. Países que nunca enfrentaram a brusone, como Japão, Itália, Espanha e Nova Zelândia, poderão registrar seus primeiros casos em breve. Até a América do Sul, uma área vulnerável ao fungo cresceu exponencialmente, passando de 5% para 30% até 2050.
Em contrapartida, o agronegócio, que historicamente é um dos principais motores da economia brasileira e global, se torna uma das vítimas das mudanças climáticas que ele próprio ajuda a intensificar. Dados revelam que aproximadamente 70% das emissões de gases de efeito estufa (GEE) no Brasil provêm do setor agropecuário, especialmente por causa do desmatamento e da pecuária. No cenário mundial, o agronegócio responde por cerca de 12% das emissões globais, o que destaca a responsabilidade do setor no avanço do aquecimento global.
Essa mesma atividade agrícola, que busca atender à crescente demanda por alimentos, é paradoxalmente um dos setores que menos avança na descarbonização de suas operações. A adoção de práticas sustentáveis, como o uso de tecnologias de baixo carbono, ainda é incipiente em muitas partes do mundo, inclusive no Brasil, onde o agronegócio é altamente dependente de métodos tradicionais que trazem para o desmatamento e a emissão de gases do efeito estufa (GEE).
O futuro da produção de alimentos
Com a brusone afetando cada vez mais áreas agrícolas e as mudanças climáticas abrindo caminho para a propagação do fungo, a segurança alimentar global está em risco. O impacto da doença não se limita ao trigo, já que ela também pode atingir outros cereais, como arroz e cevada. Num cenário em que o agronegócio global se vê pressionado a aumentar a produção para alimentar uma população mundial crescente, o controle de doenças como a brusone se torna vital.
A contradição é clara: o agronegócio é ao mesmo tempo uma força poderosa para garantir o fornecimento de alimentos e um dos maiores responsáveis pela influência do ambiente que permite esse cultivo. Sem uma resposta coordenada para mitigar as emissões de GEE e adaptar práticas agrícolas às novas condições climáticas, surtos de doenças como a brusone serão apenas uma de várias ameaças futuras.
Comentários