A restauração da Caatinga pode trazer benefícios econômicos e ambientais, revitalizando áreas degradadas e proporcionando empregos e sustentabilidade para as populações locais.
A Caatinga, o único bioma exclusivamente brasileiro, é uma região que abrange aproximadamente 850 mil quilômetros quadrados. Este vasto território, localizado predominantemente no semiárido, é densamente povoado, abrigando cerca de 27 milhões de pessoas. Embora historicamente tenha sido marginalizado e considerado menos valioso em comparação com outros biomas brasileiros como a Amazônia e a Mata Atlântica, a Caatinga está ganhando reconhecimento por sua importância ecológica e potencial para a restauração.
Um estudo recente conduzido pela fundação holandesa IDH, com o apoio do instituto de pesquisa WRI Brasil, revelou que há pelo menos meio milhão de hectares de Caatinga com potencial para restauração. Essas áreas estão localizadas no Cariri Ocidental, na Paraíba; no Sertão do Pajeú, em Pernambuco; e no Sertão do Apodi, no Rio Grande do Norte. Restaurar essas áreas pode trazer inúmeros benefícios econômicos e ambientais, como a criação de empregos, geração de renda, regulação hídrica, estabilização do solo e controle da erosão.
“A conservação e a restauração da paisagem na Caatinga são cruciais para a resiliência climática, a segurança hídrica e a sobrevivência de suas comunidades”, afirma Luciana Alves, coordenadora de projetos do WRI Brasil e uma das autoras do estudo.
Acesso ao estudo na íntegra clicando aqui
Estratégias para a potencial restauração da Caatinga
Em termos de restauração ecológica, os arranjos sugeridos foram:
- Regeneração Natural Assistida (RNA) – conjunto de técnicas para auxiliar o processo de regeneração natural e recomposição da vegetação nativa;
- Restauração Ativa – recomposição da vegetação nativa por meio do plantio, em área total, de mudas e/ou sementes;
- Restauração Hidroambiental – conjunto de intervenções que visam reverter o alto nível de degradação e restaurar a saúde do solo e da vegetação. Indicada para áreas com limitações ambientais mais severas, com perda significativa de solo fértil e da capacidade de recarga hídrica.
Já em termos de restauração com fins econômicos, as recomendações são:
- Sistema Agroflorestal (SAF) Forrageiro – a palma forrageira é a principal alternativa para alimentação e manutenção da produção animal durante o período de estiagem, além de representar um importante produto da comercialização para suplementação animal;
- SAF para produção de mel – integra as colmeias a uma diversidade de espécies vegetais melíferas atrativas para a criação de abelhas;
- SAF para produção de frutas – combina o plantio de diferentes espécies arbóreas de potencial madeireiro, alimentar e/ou energético, com o cultivo de espécies frutíferas, forrageiras, agrícolas e de cobertura e adubação do solo;
- Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) – permite uma profunda integração entre atividades agrícolas, pecuárias (em especial a caprinocultura) e florestais ao criar condições que aumentam a proteção do solo e consequentemente a eficiência do uso da água.
Benefícios econômicos e ambientais
A restauração da Caatinga pode atrair recursos internacionais e privados, especialmente devido à sua forte conexão com a agenda climática global. “Pela forte intersecção com a agenda climática, a restauração da Caatinga poderá se beneficiar significativamente de recursos internacionais e privados destinados ao fortalecimento dessa agenda”, destaca Luciana Alves. Em junho deste ano, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) anunciou a seleção de 12 projetos prioritários para a criação de unidades de conservação federais no bioma, que resultará no aumento de mais de um milhão de hectares de áreas protegidas até 2026.
Desafios e oportunidades
Historicamente, a Caatinga foi vista como o “patinho feio” da conservação ambiental no Brasil. Sua vegetação caducifólia, que perde as folhas e adquire um aspecto esbranquiçado em certas épocas do ano, levou a uma percepção de menor valor em comparação com as exuberantes florestas da Amazônia e da Mata Atlântica. No entanto, essa visão está mudando graças ao trabalho de pesquisadores, ONGs e instituições socioambientais que destacam a rica biodiversidade e o potencial de resiliência do bioma.
A Caatinga enfrenta desafios significativos, incluindo a perda de mais da metade de sua cobertura vegetal original devido ao desmatamento, expansão agrícola e pecuária. Essas ameaças colocam em risco mais de 3 mil espécies de plantas e animais, além da segurança alimentar e hídrica das comunidades locais. Estudos de modelagem matemática indicam que o aquecimento global pode agravar essas condições, tornando partes do bioma ainda mais suscetíveis à desertificação.
A recuperação da vegetação nativa é vital para garantir a segurança hídrica e alimentar, especialmente para os agricultores familiares que dependem da Caatinga para sua subsistência. A restauração ecológica também favorece a biodiversidade, essencial para a resiliência climática. “Biodiversidade é fundamental para a resiliência ecológica e climática”, afirma Ana Claudia Costa Destefani, secretária-executiva da Recaa.
Uma nova perspectiva para a Caatinga
A restauração da Caatinga representa uma oportunidade única para alavancar a economia local, promover a sustentabilidade e proteger um bioma exclusivamente brasileiro. A criação de novas unidades de conservação, combinada com práticas sustentáveis de uso da terra, pode transformar a Caatinga em um exemplo de resiliência e adaptação climática.
Em entrevista ao Um Só Planeta, Ana Destefani destaca que a rede Recaa atuará como um ambiente de articulação colaborativa, conectando governos, empresas, ONGs, produtores rurais e comunidades tradicionais. O objetivo é garantir um fluxo constante de recursos financeiros para projetos de restauração e conservação, reconhecendo que a natureza precisa de tempo para se recuperar.
A Caatinga, com sua rica biodiversidade e potencial de resiliência, está pronta para deixar de ser vista como um “patinho feio” e se tornar um modelo de conservação e desenvolvimento sustentável para o Brasil e o mundo.
Com informações da WRI Brasil e do Um Só Planeta
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