ONGs brasileiras propõem na COP28 um plano para eliminar gradualmente os combustíveis fósseis e taxar lucros inesperados das petroleiras. O Brasil, destacado como um produtor chave de petróleo, enfrenta críticas internas sobre suas políticas energéticas e ambientais.
Um grupo de 61 organizações não governamentais brasileiras assinou um manifesto solicitando à COP28, a conferência do clima da ONU, que formule um plano concreto para a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis.
Essas instituições também estão pressionando pela implementação de um imposto sobre os lucros inesperados das companhias petrolíferas, especialmente aqueles obtidos durante crises como a Guerra da Ucrânia. O objetivo é que o recurso arrecadado seja investido em ações contra as mudanças climáticas em países pobres e emergentes.
O Observatório do Clima, composto por ONGs e grupos de pesquisa ambientais, foi o responsável pela elaboração do documento. Este foi lançado na quinta-feira (16), antecedendo a cúpula que ocorrerá a partir de 30 de novembro em Dubai.
Entrega do texto a órgãos governamentais
Os organizadores planejam entregar o texto à Secretaria da Presidência da República, ao Itamaraty e ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, representando uma demanda da sociedade civil para a COP.
O manifesto ressalta estudos recentes sobre emissões fósseis globais, indicando que sem uma redução significativa na produção e demanda, o Acordo de Paris não poderá ser cumprido. Ele destaca que a queima de petróleo e gás dos campos atualmente em produção geraria 140% mais poluição do que o limite estabelecido para manter o aquecimento global em 1,5°C.
Propostas para o “Phase-Out” de fósseis
As ONGs propõem definir prazos claros para a redução de carvão, gás e petróleo até 2050, respeitando as diferentes realidades socioeconômicas dos países. O documento enfatiza que o phase-out dos combustíveis fósseis não deve levar à ruína econômica dos países em desenvolvimento e sugere cronogramas de descarbonização específicos por região ou país.
Recomenda-se proibir novas explorações e definir zonas prioritárias para a proteção da biodiversidade, onde a extração seria banida. A Amazônia é mencionada como um local crítico, tanto para exploração offshore quanto onshore. Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima, reforça essa posição.
Também é sugerido que se estabeleçam mecanismos para trocar a dívida externa dos países pobres por ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
Papel dos países ricos e petroestados
As entidades argumentam que os países ricos e os petroestados devem ser os primeiros a cessar a exploração de petróleo, gás e carvão. Defendem também que esses países paguem um imposto global sobre lucros inesperados dos combustíveis fósseis, como proposto pelo secretário-geral da ONU, António Guterres. Araújo explica que tais lucros muitas vezes são gerados em momentos de crise, resultando em ganhos substanciais para as empresas petrolíferas. A receita desse imposto ajudaria financeiramente os países pobres em seus esforços de mitigação e adaptação climática.
O Brasil no mercado global de petróleo
Suely Araújo, destacando a relevância do Brasil no mercado de petróleo, enfatiza que o país não é um participante menor. Atualmente, o Brasil ocupa a oitava posição mundial na produção da commodity. Entretanto, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, anunciou planos para aumentar a produção nacional, almejando posicionar o Brasil como o quarto maior produtor global.
A especialista critica a estratégia brasileira, observando que a demanda interna já está atendida pelos poços existentes. Ela argumenta que o planejamento ambicioso de exportação ignora o impacto global das emissões, pois o petróleo queimado em outro país ainda contribui para o desequilíbrio climático mundial.
Nicole de Oliveira, diretora-executiva do Instituto Arayara, questiona o discurso de que a exploração dessa commodity gera riqueza, principalmente no contexto do Brasil e da América Latina. Ela usa a cidade de Macaé, no Rio de Janeiro, como exemplo. Conhecida como a capital da exploração do pré-sal no Brasil desde a descoberta do recurso na Bacia de Campos na década de 1970, Macaé deveria ser uma cidade próspera, semelhante à Noruega, dada a sua longa história de exploração petrolífera.
No entanto, ao analisar a realidade de Macaé, Nicole de Oliveira aponta discrepâncias significativas. Ela menciona que existem 40 mil pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza na cidade, e que a população ainda enfrenta a falta de acesso a água potável. Este cenário contrasta fortemente com a expectativa de uma cidade enriquecida pela indústria do petróleo, indicando falhas no modelo de desenvolvimento baseado na exploração de recursos fósseis.
Com informações da Folha de São Paulo
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