Uma série fatores na política ambientais sofreram alterações significativas em 2023, impactando os infratores, os órgãos de controle, a imagem do Brasil no exterior e sua arrecadação.
O ano se destacou pela redução no desmatamento e pelo aumento na fiscalização em relação aos danos na floresta amazônica. Durante o primeiro ano do governo Lula, de janeiro a novembro, houve um registro de 6.286 infrações contra a flora na Amazônia, um aumento de 40,7% em comparação com o mesmo período do ano anterior. Essas ações resultaram em multas que totalizaram R$ 3 bilhões, superando os R$ 2,6 bilhões do ano passado.
O Ibama, até novembro, emitiu 4.862 autos contra a flora amazônica, com multas de R$ 2,6 bilhões. No ICMBio, focado em unidades de conservação federais, foram registradas 1.424 infrações e R$ 375,6 milhões em multas.
Comparação com a gestão anterior
Comparando com o governo Bolsonaro, observa-se um progresso na implementação de políticas ambientais. O Ibama teve um aumento de quase 2 mil autos e cerca de R$ 700 milhões em multas adicionais. No ICMBio, houve uma diminuição de mais de 100 autos e uma redução de R$ 360 milhões no total de multas. Em contrapartida, o ICMBio registrou um aumento significativo em embargos, com 928 em 2023 contra 591 em 2022, enquanto o Ibama teve 3.357, superando os 3.009 do ano anterior.
Paralelamente, houve uma queda de 22,37% no desmatamento da Amazônia Legal. O pico de desmatamento nos anos recentes foi entre 2020 e 2021, com 13 mil km². Enquanto isso, o Brasil desempenhou um papel de liderança em compromissos internacionais para um futuro sustentável, como demonstrado na COP28.
Reivindicações dos servidores do Ibama e ICMBio
Recentemente, mais de 1.500 funcionários do Ibama e do ICMBio solicitaram melhores salários e condições de trabalho. A Ascema, em um manifesto, expressou a falta de avanços nas discussões sobre a reestruturação de suas carreiras, estagnadas há dez anos. Apesar do governo atual ter iniciado negociações com várias carreiras do executivo federal, as discussões com a carreira ambiental não avançaram desde a primeira reunião em outubro.
A Associação Nacional dos Servidores Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema) expressou que a situação atual tem afetado negativamente o ânimo e a moral dos servidores, que se sentem desapontados e negligenciados pelo novo governo. Apesar da falta de investimentos adicionais em recursos materiais ou humanos e um orçamento limitado, os resultados alcançados se devem ao grande esforço e dedicação dos servidores, comprometidos com a preservação ambiental.
Rodrigo Agostinho, presidente do Ibama nomeado por Lula, reconheceu a justiça das reivindicações dos trabalhadores, mas destacou que o trabalho vem sendo realizado sob diversas limitações. Ele mencionou que o Ibama está em um processo de reestruturação após ter sido desmontado anteriormente.
Plano de Ação no combate ao crime ambiental
Conforme o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDam), o número de fiscais no Ibama diminuiu de mais de 1300 em 2010 para apenas 723 em 2023. O plano prevê a contratação de 1600 analistas ambientais até 2027 para fortalecer o combate ao desmatamento.
As multas ambientais, apesar de serem uma fonte significativa de recursos, não são diretamente reinvestidas nos órgãos ambientais como o Ibama e o ICMBio. Alessandra Cardoso, especialista em Economia e assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), explica que a principal função dessas multas é desencorajar atividades ilegais na área ambiental. Idealmente, os recursos arrecadados deveriam ser reinvestidos na fiscalização ambiental, mas na prática, eles são destinados principalmente ao Fundo Nacional de Meio Ambiente (FNMA) e outros fundos, sendo parte significativa usada para cobrir o déficit do governo.
Lei de distribuição das multas ambientais
A Lei nº 14.691 estabelece que 50% das multas por infrações ambientais sejam destinadas ao FNMA. O restante é distribuído entre vários fundos, incluindo o Fundo Naval e fundos estaduais ou municipais de meio ambiente. No entanto, grande parte do orçamento do FNMA proveniente das multas é reservada para contingências, o que limita a utilização desses recursos em políticas ambientais efetivas.
Desempenho Financeiro de 2021 a 2023
- 2021:
- Total Aplicado: R$ 29.083.170, com R$ 28.622.865 de multas ambientais.
- Utilizado: Apenas R$ 21.710 das multas foram efetivamente usadas, a maioria bloqueada como reserva de contingência.
- 2022:
- Total Aplicado: R$ 38.811.950, inteiramente de multas ambientais.
- Utilizado: Somente R$ 8.379 das multas foram utilizados, com a maior parte reservada para contingência.
- 2023:
- Total Aplicado: R$ 36.529.580, todos de multas ambientais.
- Utilizado: R$ 36.029 das multas foram usados, novamente com grande parte bloqueada para contingência.
Previsões para 2024
Com base nos recursos arrecadados de multas por infrações ambientais, o Projeto de Lei prevê:
- R$ 4.893.393 para fomento da Política Nacional do Meio Ambiente.
- R$ 59.520.254 para reserva de contingência.
- R$ 150.000 para administração da unidade.
- R$ 14.633 também para reserva de contingência, mas de ‘recursos próprios livres da UO’.
O orçamento do fundo para 2024 está estimado em R$ 64 milhões, um aumento em relação aos R$ 34 milhões do ano anterior. No entanto, Alessandra Cardoso reforça que a maior parte dessa quantia será destinada à reserva de contingência. O fundo acumula um saldo superavitário de aproximadamente R$ 200 milhões, que permanece inutilizado no Tesouro Nacional.
O uso efetivo das multas ambientais no fortalecimento da política ambiental é limitado, com a maior parte dos recursos destinada a reservas de contingência ou bloqueada, o que representa um desafio significativo para a implementação eficiente de medidas de proteção ambiental no Brasil.
Desafios na execução de multas ambientais
Dificuldades na coleta de dados
- A reportagem não conseguiu obter informações específicas sobre o pagamento de multas ambientais aplicadas pelo Ibama e ICMBio no bioma Amazônia entre 2019 e 2023. O Ministério do Meio Ambiente (MMA) indicou que a compilação de dados é feita por estado, não por bioma.
Processo administrativo de multas ambientais
- Fábio Takeshi Ishisaki, especialista em Ciência Ambiental, destaca a complexidade do processo administrativo em torno das multas ambientais. Alterações recentes no trâmite dificultaram ainda mais a conclusão dos processos, levando a um descompasso entre o valor das multas aplicadas e o valor efetivamente recebido.
Legislação e responsabilidades
- As infrações ambientais são regidas pelo Decreto nº 6.514/2008, pela Lei nº 9.605/1998, e por partes do Código Florestal (Lei nº 12.651/2012). Os agentes fiscalizadores, como os do Ibama e ICMBio, são responsáveis por identificar e classificar infrações ambientais, considerando fatores agravantes ou atenuantes.
Processo de aplicação de multas
- O processo inclui notificações para correção de conduta, embargos, apreensões e, potencialmente, multas. Multas podem evoluir de sanções menores por descumprimento de medidas ou serem aplicadas diretamente, seguidas de um processo de defesa e julgamento, com possibilidade de recurso e, em alguns casos, encaminhamento à Justiça.
Prescrição e tramitação das multas
- Multas podem prescrever, especialmente em casos onde autos de infração permanecem paralisados por mais de três anos. Durante a gestão Bolsonaro, a inclusão dos ‘núcleos de conciliação ambiental’ prolongou o período de tramitação do processo, mas essa medida foi revogada na gestão Lula.
Tentativas de anulação de penalidades
- O ex-presidente do Ibama, Eduardo Bim, tentou suspender penalidades aplicadas entre 2008 e 2019 notificadas por edital, o que afetaria 183 mil processos e multas de R$ 29,1 bilhões. Em novembro deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) revalidou essas multas.
O processo de aplicação e execução de multas ambientais no Brasil enfrenta desafios significativos, incluindo complexidades burocráticas e alterações legislativas que impactam a efetividade do sistema de penalidades ambientais. A recente decisão do STF de revalidar multas anteriormente contestadas representa um marco importante na aplicação da lei ambiental no país.
Com informações do Terra
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